Opinião: Oh, céus, não sei se consigo fazer isto. Passei tanto tempo a suspirar pelo livro, e depois ele chegou-me; e depois li-o, devagar, devagarinho, para o apreciar, e porque aquilo que trouxe à série merece reflexão; e agora estou aqui, com um milhão de pensamentos e coisas que quero formular, a atropelarem-se todos uns aos outros, e não sei o que há de sair primeiro. Credo, que é tão difícil pôr ordem nas ideias. Precisas mesmo de dar cabo de mim, Sarah? (Spoiler alert: sim, se não não era tão divertido.)
Ok, vamos lá tentar. Queen of Shadows é a evolução mais ou menos natural do livro anterior; só que sendo a Sarah, eu não sabia bem o que esperar especificamente; faltando ainda dois livros na saga, perguntava-me quanto é que ela tencionaria avançar quanto aos antagonistas principais e aos desafios que se colocavam aos personagens. Além disso, havia questões de outra natureza, mais emocional, digamos, a ser resolvidas, e era uma incógnita aquilo que a autora tinha planeado. Podia ir em tantas direcções.
Quanto ao enredo, acho que fiquei surpreendida ao ponto a que as coisas ficaram resolvidas. Digamos que o enredo tinha três pontos: um resgate muito necessário e dois antagonistas. O resgate era bem óbvio que ia acontecer. O primeiro antagonista, bem, podia ia para qualquer dos lados. Podia ser resolvido ou ser arrastado. Tenho pena de não poder ver mais dele, porque a sua relação com a Aelin é fascinante; mas adorei ver que recebeu o seu pagamento kármico.
O segundo antagonista, uau, nunca esperei ver a sua situação resolvida desta maneira, nem tão depressa. Fiquei surpreendida mas agradada com esta revelação, que alarga o âmbito das coisas e sobe a fasquia para os nossos personagens. As coisas vão ser muito diferentes a partir de agora. Encontram-se num lugar bom, no fim deste livro, e tenho tanta curiosidade em ver como vão levar avante aquilo a que se propõem.
O elenco de personagens é assim qualquer coisa de soberbo. Eu não consigo deixar de adorar toda a gente, independentemente da sua posição e atitudes. Há qualquer coisa na maneira como a autora escreve que os faz funcionar fantasticamente. Aprecio particularmente o elenco sólido de mulheres na história. Todas diferentes, umas fortes, outras frágeis, umas capazes de se defender, outras colocadas em posições periclitantes, mas todas com o seu tipo de força interior, de coragem sob circunstâncias esmagadoras. É tão refrescante e delicioso de ver.
Desde o livro anterior que ando a desenvolver uma teoria, baseada no saber que a Sarah é fã de Anne Bishop. É que não consigo deixar de estabelecer os paralelos entre os Fae da Sarah e os Sangue da Anne (aliás, desde então estou convencida que os Sangue são a maneira da Anne escrever sobre seres féericos), e bem, consigo ver tão bem as parecenças.
Tenho a sensação que a Aelin vai reunir em torno de si uma corte como a da Jaenelle, cheia de machos drama queens e armados em possessivos, com as mulheres a darem-lhes a volta sempre que podem. Eh, tenho a ser certeza que vai ser tão divertida de seguir como a corte da Jaenelle era. Só não posso tentar estabelecer paralelos entre personagens porque isso ia ser definitivamente spoiler.
Pequenos destaques a personagens... ora bem... Lysandra, das melhores personagens no livro toda. Adoro o volte-face na relação dela com a Aelin. No passado tinham sido inimigas, da maneira como só a vida em sociedade sabe colocar mulheres umas contra as outras, e por isso gosto de ver como conseguem ser mais adultas, ultrapassar as parvoíces e formar uma amizade sólida. Além disso, a posição da Lysandra é tratada duma forma sóbria, sem julgamentos, e gosto tanto do feitio tortuoso dela.
A Manon tem um desenvolvimento fantástico. Continua a ser uma bruxa sedenta de sangue como as melhores, mas aprendeu a não seguir cegamente, a questionar o que lhe põem à frente, e isso vai torná-la uma adversária mais feroz e mais impressionante de quem quer que se lhe coloque à frente. E mais, o encontro entre ela e a Aelin que eu queria dá-se, e é glorioso. Se estas duas alguma vez se virem do mesmo lado, vai ser lindo.
E numa nota lateral do enredo com a Manon, cruzam-se com ela a Kaltain e a Elide. A Kaltain, pobre Kaltain, que era apenas mesquinha e pequenina, torna-se numa força imparável. Dá a volta aos abusos que sofreu e consegue a sua vingança, o que é lindo e assustador de ver. A Elide, pobre Elide, mais uma filha de Terrasen que perdeu a sua infância na guerra. E no entanto o seu espírito nunca desiste. Vou adorar ver o que ela tem para nós no futuro.
O Dorian, meu querido e pobre Dorian. No primeiro livro não era fã da ideia deste personagem, porque não gosto de meninos bonitos com queda para playboys; mas revelou-se tão mais que isso. O Dorian é uma bolachinha, aquele personagem que gostava de proteger de tudo mau que lhe acontece, mas isso não é possível, e da tragédia forja-se alguém diferente. Espero que ele possa manter alguma da sua pureza no início, mas sei que ainda tem um longo caminho a percorrer para lidar com o que lhe aconteceu. Tenho pena que as suas circunstâncias lhe dêem tão pouco tempo de antena neste livro, mas é compreensível.
O Aedion, bem, estou fascinada pela posição dele. Aquilo que fez em nome de Terrasen, a sua herança, a relação dele com a Aelin. Gosto do feitio dele. Já a Nesryn, bem, em teoria gosto dela. Do seu estoicismo, a sua atitude descomplicada. O modo como a sua presença se impõe de mansinho. Não sou fã de como ela parece um, er, "prémio de consolação", em certo sentido. O timing da sua introdução é suspeito e não aprecio que ela tenha aparecido só com esse fim, porque merece mais.
O Chaol. Oh, caramba, Sarah, não me dês cabo do rapaz. A parte final dele foi de cortar o coração, raios. Em retrospectiva, o percurso dele tem sido curioso. O Chaol só pecou por ser demasiado leal a um ideal em que acreditava, porque desde então creio que tem tentado fazer o melhor que pode pelos seus, o que numa cidade país continente em guerra, é difícil de levar avante.
Não sei se estou convencida com a maneira como ele e a Aelin lidam um com o outro. Passaram a primeira metade do livro a atirar acusações um ao outro, e a outra metade a sair duma guerra fria para umas tréguas inseguras. Não sei, não compro tanto drama. Consigo ver a verdade nas acusações dele, apesar da enormíssima falta de tacto aos fazê-las.
Mas a Aelin? Ainda estamos presos ao que aconteceu ao que aconteceu no segundo livro? A sério? Sério sério? Aquilo foi tanto culpa do Chaol como minha. O que esperávamos? Que ele negasse as suas convicções dum dia para o outro? Que adivinhasse o mal nos outros, com as suas limitadas capacidades humanas? Ugh, a Sarah tem insistido muito nisto e eu não percebo propriamente, não faz sentido tentar construir a narrativa assim, desfazer o carácter dele neste ponto. Confio nela, mas preferia perceber o que se passa aqui, o que está a tentar fazer.
Quanto à Aelin, gosto cada vez mais de como está a crescer, a evoluir. Uma mulher segura de si, capaz de atrair lealdade dos que a rodeiam. Capaz de ultrapassar preconceitos mesquinhos e ingénuos, e ver alguém para além disso, fazer uma nova amizade. Decidida a obter justiça, ou vingança, fazer aqueles que o merecem pagar. Capaz ainda de se afastar, quando é preciso, de trocar as voltas a um antagonista e se mostrar uma estratega. Determinada a salvar um amigo dele próprio, mesmo que isso peça decisões impensáveis. (Já agora, ainda estou zangada com essa. Mas percebo. Mais ou menos.)
Há ainda um certo desenvolvimento. Não posso revelar a sua natureza, porque é um enormíssimo spoiler, e um que temo que não se compreenda se não se ler como é que se chegou lá. Se há coisa que posso dizer, e reiterar, é que confio na Sarah e na direcção para que ela leva as coisas, porque acho que tem sido relativamente realista na evolução da história, do que o enredo e os personagens pedem e precisam. Se ela me diz que é isto que é preciso, compro para pelo menos ver o que sai daqui.
Voltando ao início, e muito por alto: não estou completamente convencida. É realista, sim, as pessoas mudam, sentem de forma diferente, e às vezes voltar para trás é um retrocesso. Contudo, a maneira como a Sarah o desenvolve faz-me pensar que ainda não é este o objectivo final. Sinto que podia ter sido uma situação desenvolvida mais em lume brando, para nos cativar completamente como fãs. No livro anterior não havia propriamente inclinação para esse desenvolvimento, e assim aparece um pouco de repente, acho eu.
Quero dizer, a semente está lá, muito muito pequena, mas com ar de ir noutro sentido. Enfim, estava bastante enamorada da ideia que o terceiro livro tinha apresentado. Era poderosa, e agradava-me que não fosse noutra direcção, nesta direcção, porque apresenta mais facetas da questão em relação ao que normalmente é apresentado nos livros. Nunca se vê uma situação destas, poderosamente descrita, e gostava da ideia. Este novo desenvolvimento desautoriza essa ideia, que era tão forte, e precisa de ser bem justificado para eu fazer paz com a coisa.
Ainda mais um aspecto da situação, há um certo desequilíbrio entre as partes da mesma, parece-me, e está a acontecer tão depressa e tão cedo que acho que a Sarah ainda me vai dar uma reviravolta à coisa e fazer acontecer uma tragédia. Não me convenço que é uma direcção definitiva a tomar. Ela já deu tantas reviravoltas à narrativa da saga que fez de mim uma céptica. E por isso, preciso de ser convencida.
Coisas para o futuro: quero ver Terrasen restaurada à sua glória. Quero ver onde o enredo das Wyrdkeys vai dar. Que mais podemos esperar dos Fae de Wendlyn, não vimos nem de perto o suficiente deles. Quero ver como o mundo evolui depois dos momentos explosivos do final. Quero ver os personagens do The Assassin's Blade, o pirata, os assassinos do deserto, a curandeira, e a Ansel. Estou meio a torcer pelo Aedion e pela Lysandra, porque seriam fantásticos juntos. E talvez o Dorian e a Manon. É uma ideia tão louca que talvez funcione, pela junção de opostos.
Uma última nota. É uma história fantástica, toda a saga o é, e solidamente merece a nota máxima da minha parte. Já o disse e repito, a Sarah escreve de maneira de vai de encontro ao que gosto de encontrar num livro, e tenho gostado muito da sua evolução e da que deu aos personagens e ao enredo.
Adoro que tenha tantas personagens femininas fantásticas, especialmente sendo fantasia épica. É dos meus géneros favoritos, apesar de agora não lhe dar tanta atenção. (Talvez porque o fandom parece ser um clube de rapazes. Demasiada predominância de personagens masculinos, demasiados fãs a negar a validade de perspectivas femininas.) Anyway, foi por isso que me virei para o YA, o pessoal é tão mais hospitaleiro, não há dramas, e tenho tido a sorte de encontrar coisas fantásticas. Algumas como estas, que combinam as duas coisas boas numa. Só quero continuar a encontrar mais bons livros, e serei feliz assim.
Páginas: 656
Editora: Bloomsbury (MacMillan)
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