Opinião: Ou como escrever um livro com um título absurdamente comprido. Era para nos dificultarem a vida a pronunciá-lo? Ehehe.
Bem. Digamos que estou dividida da forma mais peculiar acerca deste livro. (Brace yourselves, as piadas e o uso abusivo da palavra peculiar are coming.) Por um lado tem um conceito fantástico, e tem uma série de elementos muito bem usados e introduzidos na história; por outro, senti-a muito como um primeiro livro, com uma boa falta de edição, um enredo desarticulado, uma certa falta de boa caracterização dos personagens; em suma, não foi um livro que me tenha apaixonado, apesar de lhe reconhecer alguns méritos.
Para já a sinopse e tudo o que se possa ter ouvido falar acerca dele não dão uma boa ideia da coisa. Dão a ideia de algo mais assustador e atmosférico do que realmente é. E dão a ideia que o peso da história está na casa da Senhora Peregrine e nas crianças peculiares, quando isso não é exactamente verdade; a primeira parte do livro prende-se mais com o Jacob debater-se com as histórias fantásticas que o avô lhe contava, e com uma situação traumática que o faz duvidar da sua sanidade.
Oh, e eu não me queixo nada desta situação de "duvidar da sanidade". Aliás, achei-a a parte mais interessante do livro, e a mais assustadora, porque essencialmente o Jacob quer acreditar que não está doido, mas as coisas estranhas peculiares que viu, bem, não podem ser explicadas. E se não podem ser explicadas, a racionalização é que estava a ver coisas por causa do stress duma situação traumática. E portanto esta dualidade é fascinante de explorar. A frustração, o luto, a tristeza e a raiva que o Jacob sente por se encontrar nesta situação.
O meu problema com esta parte do livro tem mais a ver com a personalidade do Jacob para além do seu questionar de sanidade. Não me parece que a caracterização dele seja muito boa; a sua narração alterna a espaços entre soar demasiado adulto para a idade que tem, demasiado infantil para a idade que tem, e soar exactamente como a idade que tem. E não é que não se possa soar mais ou menos velho do que o que somos; é que as transições são abruptas; e no caso em que o Jacob se está a portar de forma infantil, é-o duma forma em que tem consciência que se está a portar como um fedelho, mas não parece importar-se com os problemas que causa aos outros com o seu comportamento.
E depois, chega a segunda parte do livro, e a transição também me parece demasiado abrupta. Passamos de uma narrativa meio assustadora e atmosférica para uma aventura que... perde tracção? Não chega a ganhá-la? O Jacob encontra a casa das crianças peculiares... e caramba, o conceito em si é fantástico. Miúdos com poderes estranhos peculiares, uma forma bizarra de viajar no tempo que é fascinante se considerarmos a sua extensão e consequências - e esta parte até me soou bem desenvolvida pelo autor. Adorei a ideia dos vórtexes, de parar no tempo para criar um refúgio, destes miúdos que ficam congeladas nos seus corpos, meio adultas, meio crianças.
E ainda assim, esta parte pareceu-me bastante subdesenvolvida. Quase como que se o peculiar fosse usado e introduzido só por ser estranho, e não como base para desenvolver uma história a partir disso. O uso das fotos antigas é muito bom, muito interessante, e acho fantástico como há por aí tantas fotos verdadeiras antigas com algum tipo de manipulação (Photoshop quando ainda não havia Photoshop).
E estas fotos servem como base à história, e como base para criar todo o tipo de miúdos com poderes e capacidades estranhas. O problema é... não são nada para além disso. Não têm personalidade, não são desenvolvidos. Acho que o livro teria sido infinitamente mais interessante se o elemento arrepiante das suas capacidades tivesse sido explorado, se tivéssemos podido ver o que é viver com elas, se os miúdos fossem humanizados, e se se pudesse ver que bênção e maldição é viver com o que são, e nas condições em que vivem (nos vórtexes).
E depois para os capítulos finais do livro, temos finalmente acção, mas acaba por não parecer propriamente bem coordenada com o tom do resto do livro. As ameaças que permaneceram um borrão durante o resto do livro tomam forma, e bem, não me pareceram propriamente ameaçadoras. Apesar de tudo, as suas acções deixam os personagens num lugar interessante, que me deixa curiosa por saber mais. A parte menos boa deste final é que parece que a história foi cortada com uma tesoura, simplesmente acaba ali e pronto, o resto é o segundo livro. É um final aberto, mas não daqueles finais que tenha chegado a fechar alguma coisa sequer, e por isso não parece sequer um final.
Ah... chegando ao final dou-me conta que apontei mais defeitos do que virtudes. E não é que tenha desgostado do livro; manteve-me entretida durante a leitura, e encontro-lhe bastantes pontos de interesse para ter vontade de pegar no segundo livro no futuro. Mas para um livro que tem tanto destaque e tanta gente a gostar dele, esperava bem melhor.
Título original: Miss Peregrine’s Home for Peculiar Children (2011)
Páginas: 344
Editora: Contraponto (a defunta Contraponto, que pelos vistos agora foi reavivada pela editora-mãe Bertrand, mas não tem aparentemente muito a ver com a Contraponto original)
Tradução: isso sim, é um mistério, os editores deste livro meteram-lhe a ficha técnica toda, editor, revisão, design e afins, mas tradutor nem vê-lo, é para nós adivinharmos? Ou há alguma foto peculiar do tradutor no meio daquilo e nós temos de descobrir qual é?
Yep, este é mais um daqueles casos, boa ideia mas sem a melhor das execuções. A narração para mim é muito *yawn*. Realmente o mais interessante ainda vão sendo as fotos.
ResponderEliminarA ideia é genial, se pensarmos bem. Os efeitos nas fotos antigas são muito impressionantes, por ser numa época sem Photoshop... :P E gosto da ideia de pegar nelas e explicar os efeitos estranhos com super-poderes. ^_^
EliminarNo entanto, o autor aqui não me pareceu particularmente... bom? Há gente que no primeiro livro é capaz de cativar o leitor, por isso ser o primeiro livro não é desculpa. Tem ali ideias interessantes, e por isso até tenho vontade de ler o segundo, mas não vou a correr fazê-lo. :P