Opinião: Hmmm. Já tinha ouvido falar muito da Jessi Kirby, só coisas boas, na verdade, portanto estava muito curiosa. E queria gostar muito. Estava inteiramente preparada para gostar muito. Bem... isto não funcionou assim tão bem como isso.
Oh, a Jessi Kirby faz um óptimo trabalho a descrever o processo do luto. A protagonista, Quinn, perdeu o namorado há mais de um ano, num acidente; alguns dos órgãos dele foram doados. A Quinn deixou essencialmente de viver deste então, sendo pouco mais que uma concha vazia, e contacta por carta os receptores dos órgãos.
Chega a conhecer quatro dos cinco, mas o quinto, o receptor do coração, nunca lhe responde. A Quinn convence-se que gostaria ao menos de o ver para obter uma sensação de fecho, e procura-o. Só que de boas intenções está o inferno cheio, como se diz, e a verdade é que ela o conhece, e eles começam a interessar-se um pelo outro, e quando dá por ela a Quinn está presa numa mentira por, er, omissão.
Portanto, sim, o processo de luto é muito interessante de ler. A maneira como a Quinn simplesmente parou, deixou de existir, em face de ter perdido um futuro que tinha sonhado. Mas o que eu gostava, gostava mesmo, é que a autora tivesse sido capaz de me fazer sentir. Porque o resto da história? Não achei nada de especial.
Queria que ela me tivesse feito sentir a emoção de voltar a apaixonar-se que sente a Quinn, o interesse e a cumplicidade crescente entre ela e o Colton. Queria que tivesse feito com que eu acreditasse neles como casal. Porque da maneira como o livro é curto, não dá espaço para desenvolver a relação. Numa página conhecem-se, na outra já têm uma ligação especial, bla bla bla...
Não dá. Acredito que se a autora se tivesse permitido mais espaço, mais palavras, o caso seria diferente. Assim, sabe a pouco, a aproximação dos dois protagonistas. E eles mereciam. A premissa é delicada, e merecia ser mais explorada, mais aprofundada. É o mote para o conflito principal da narrativa, mas ao mesmo tempo, no fim é resolvido de forma tão simples e rápida que sabe mesmo a pouco.
E que mais podia ter feito deste livro um livro extraordinário? A exploração do lado da narrativa do Colton. O que é que sente alguém que recebeu um órgão transplantado, que recebeu literalmente uma segunda hipótese na vida porque alguém morreu para lha dar? Temos um vislumbre do estado psicológico do Colton, mas como a narrativa é do ponto de vista da Quinn, é só isso, um vislumbre. Adoraria poder ter lido da perspectiva dele e da família, do que eles passaram até ao transplante, e depois disso.
Ah, não sei, não é que seja uma história má. Não é. É bastante decente, é satisfatória. Mas para o que eu tinha lido acerca da autora, esperava que fosse mais completa, emotiva, que me arrancasse o coração e mo espezinhasse. É uma expectativa excessiva, esperar o melhor, quando nos dizem o melhor?
Gostava de qualquer modo de fazer um destaque para os personagens secundários. Adorei a família da Quinn, os pequenos vislumbres que temos de cada um, o que vamos conhecendo deles. Fazem um conjunto giríssimo, e mostram que a autora é capaz de caracterizar um personagem completo com tão pouco. (O que faz perguntar, porque não acontece isto com os protagonistas?)
Uma nota para a tradução, que fez a melhor finta de tradução por um tradutor português que eu já vi. Conseguiram traduzir o conceito de manic pixie dream girl sem meterem os pés pelas mãos, e explicando bem o conceito no diálogo em que aparece, o que a este ponto do campeonato acho milagroso. É claro que mais para a frente tinham de meter a pata na poça com um par de coisas, mas sinceramente nem me quero lembrar. Ainda estou a chorar de alegria com esta do manic pixie dream girl.
P.S.: Por amor da santa, paremos com as comparações ao John Green. O homem está a ficar o Nicholas Sparks das comparações em YA. E perdeu-se qualquer significado que isso pudesse ter.
Título original: Things We Know by Heart (2015)
Páginas: 224
Editora: Presença
Tradução: Maria das Mercês Peixoto
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