quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Este mês em leituras: Setembro 2015

Mas que mês!... Não li muito, porque para aí um terço do mesmo foi ocupado com essa beleza muito antecipada que era o livro da Sarah J. Maas, que é um colosso, e merece ser apreciado extensiva e pormenorizadamente.

Além disso, a animação com que estava para o ler traduziu-se paradoxalmente num avanço lento. Acho que a excitação por estar a lê-lo e o receio de o acabar num instante contribuíram para isso. (Também houveram uns 2-3 dias em que não o li e andei entretida com outras coisas.)

De qualquer modo, apesar de ser uma leitura muito bem-vinda, distraiu-me de outras leituras que gostava de ter feito. A ver se me dedico a elas brevemente.

Livros lidos


Opiniões no blogue


Os livros que marcaram o mês

  • Harry Potter e a Pedra Filosofal, J.K. Rowling - esta releitura improvisada inspirou-me e estou com vontade de fazer uma releitura de toda a série, a ver se entra no esquema das minhas leituras;
  • Eu Dou-te o Sol, Jandy Nelson - este livro é tão adorável e giro, de tão cheio de imagens visuais metafóricas estranhas e de coincidências que está... mas às vezes chegavam ao limite do "é um pouco demais", portanto pode não ser uma leitura para todos - para mim quase não foi, se tivesse enjoado da escrita;
  • The Young Elites, Marie Lu - oh, bolas, este livro é tão bom, nunca sonharia que a autora tivesse evoluído desta maneira... adorei a protagonista com um feitio difícil e uma moralidade dúbia, o conceito deste mundo, a evolução do enredo, as surpresas na manga guardadas só para nós - fez de mim uma fã;
  • Queen of Shadows, Sarah J. Maas - preciso mesmo de explicar? Sou seriamente fã da Sarah, ela escreve duma maneira que ressoa comigo, e mesmo que escreva em direcções inesperadas ou que não sejam necessariamente da minha preferência, bem, ainda assim tem a minha confiança, porque sei que está a escrever o que a história pede e na direcção que os personagens a levam para evoluírem; este livro foi fantabulástico, entre conclusões há muito esperadas, inícios surpreendentes, reviravoltas aqui e ali, uma bela evolução da construção do mundo, e a promessa de uma corte féerica digna das cortes dos Sangue da Anne Bishop, o que só por mim já vale infinitos pontos bónus.

Outras coisas no blogue


Aquisições

Aquisições de prosa e ficção do mês. Os três livros ao alto são em português, comprados com descontos em cartão, entre várias coisas que andava a cobiçar. Ultimamente os lançamentos em português têm sido abundantes e de encontro às minhas preferências, o que me deixa contente, mas também um nada ansiosa, porque sei que não vou conseguir pôr as mãos e os olhos em todos. Oh well, é o drama de todo o leitor inveterado.

Em inglês, temos uma novela da Jennifer L. Armentrout que já tinha lido, mas aproveitei as edições britânicas para poder ter o livro físico na minha estante. Depois, os livros da Meg Cabot que li para o desafio este mês. A Leah Raeder, parece-me, escreve de forma única, com temas que poucos abordam. Arrisca-se, e isso agrada-me e deixa-me curiosa, especialmente combinado com a honestidade emocional da sua escrita.

All the Rage deixa-me extremamente curiosa pelo tema, porque tenho a sensação que vou gostar de ler, mas ficar extremamente furiosa com o conteúdo. E como sou masoquista nas minhas leituras, não lhe podia resistir. O Magonia também me interessava, e aproveitei que estava com um desconto brutal no Book Depository.

O Queen of Shadows, já percebemos, era um livro muito esperado, e claro que não lhe podia resistir. Para último deixei outro muito desejado. Adorei a maneira como a Ellie Marney desenvolveu a história do primeiro livro, adorei a maneira como escreve, e acho que passei o último ano meio obcecada com o livro anterior e com a perspectiva de ler este. Só não o li já porque o Queen chegou primeiro, e bem, acho que não posso misturá-los em leituras e opiniões (primeiro faço de um, só depois lerei o outro), ou explodia de tanta awesomeness.

Banda desenhada do mês. Em cima, revistas Disney. Em baixo, os livros da colecção Poderosos Heróis Marvel. Pelo meio, a BD encomendada de dois meses, Agosto e Setembro. A encomenda de Agosto foi feita um pouco tarde, e a de Setembro veio mais cedo que pensava, por isso juntaram-se as duas. (Again, não li nada por culpa do Queen. Leitora sofre!)

De qualquer modo, estão ali coisas que me suscitam alguma expectativa. Os próximos volumes de Batwoman e Batgirl, o último de Hawkeye, o primeiro de The Unbeatable Squirrel Girl... vai ser um bom mês.

A ler brevemente

Eu simplesmente tenho de ler o Every Word, nem há discussão. E quero avançar um bocadinho na pilha da BD, portanto estas são algumas (muitas) opções. Gostava de ler o Volta para Mim, já sou fã da autora (Mila Gray é um pseudónimo da Sarah Alderson), e quero lê-la noutro género, mas dispensava a comparação ao Nicholas Sparks na capa. Ugh.

Fora isso, temos ali alguns (heh, muitos) lançamentos de Setembro/Outubro que estão a caminho, e são opção de leitura para o próximo mês. (Muito excitada para Menagerie, Six of Crows e The Rose Society.) Para o desafio Meg Cabot, tenciono ler um livrinho de contos que ela tem disponível gratuitamente no seu site, e começar uma nova série com O Tamanho 42 Não é Para Gordas.

sábado, 26 de setembro de 2015

Uma imagem vale mil palavras: Maze Runner - The Scorch Trials (2015)

Isto vai ser um pouco (aliás, muito) estranho de escrever e possivelmente de ler, mas deve ser a primeira vez que fico orgulhosa de uma adaptação hollywoodesca de um livro YA, ao ponto de achar que é muito melhor que o livro. É claro que neste caso não era muito difícil, porque tenho uma relação de ódio-mas-tenho-de-ler-para-ver-onde-isto-vai-parar com os livros, mas mesmo assim, fiquei impressionada. Conseguiram cortar as partes estúpidas do livro e tornar a narrativa muito mais fluída, o que não é nada mau, tendo em conta o material base.

Como o final do primeiro filme era um pouco diferente do livro, o resultado é que o início deste também assim o é, para ir de encontro ao que tinha sido apresentado, e ainda bem. Acho que o James Dashner se encosta muito ao desconhecido e ao WTF? e ao nojento para descrever as cenas, o que é um bocado preguiçoso porque evita dar-nos de facto detalhes; as cenas iniciais do livro são assim.

E portanto, apreciei muito mais o início do filme, porque mesmo sendo massivamente diferente, e mudando bastante as motivações para o resto da história, ainda assim consegue ser mais interessante e cativante. E mesmo mudando assim tanto o filme, consegue no entanto levar-nos pelos momentos-chave da narrativa e por uma viagem interna e externa semelhante à do livro. Apenas mais coerente.

Bolas, o filme consegue ainda dar muito mais respostas, que o chato do autor se recusa a dar nos livros. Acho que temos uma ideia muito melhor do que é que "os maus" andam a tramar, os seus motivos, e o que aconteceu no passado que levou ao momento presente.

Coisas que gostei de ver no filme: o cenário geral, as Terras Queimadas estavam impressionantes. A Brenda e o Jorge, dos quais tive uma muito melhor ideia. O conceito de Crankos como zombies rábidos e rápidos. O centro comercial cheio de Crankos. Mesmo arrepiante. O grupo de protagonistas. O grupo de rebeldes.

Mais: apreciei bastante a parte final. Gostei que não tivesse aqueles bicharocos esquisitos do fim do livro, porque já bastaram os do labirinto. É outra coisa que não aprecio no autor: cria uma amálgama de coisas bizarras na esperança de que seja arrepiante, mas nem por isso. Mal conseguia imaginar estas criaturas, quanto mais ter medo delas.

Gostei do grupo rebelde, e dos esforços da CRUEL para recuperar aqueles que fugiram, e da batalha campal no fim, que foi impressionante. A traição da Teresa tem contornos diferentes, mas faz tanto sentido dentro do contexto, e conseguem dar-lhe uma boa cena emocional que explique os motivos dela. Muito bem feita. (Ah, e é muito menos complicada e convoluta que no livro. Meu Deus, só me consigo lembrar de quão estúpido o Thomas foi, ao não querer fazer o joguinho da CRUEL foi cair na armadilha deles e fazer exactamente o que não queria: o joguinho deles.)

O fim é um pouco redundante, porque tanto tempo a fugir para voltar ao mesmo, mas tendo em conta que os personagens voltam ao mesmo sítio no fim do livro, e que isso se torna um tema, bem, ao menos faz sentido.

Gosto muito do elenco, apreciei as escolhas para o Jorge e a Brenda, para alguns dos rebeldes e das raparigas que fugiram e se juntaram a eles. O Dylan O'Brien, abençoado, faz-me não odiar o Thomas, o que já é muito bom. A Teresa tem umas cenas fixes, apesar de passar discretamente pela narrativa, e tem mais presença que no livro, o que é fantástico. Adoro o pequeno grupo de rapazes que escapou do labirinto. O Newt é adorável e o Minho é do melhor, um BAMF autêntico, sempre a meter-se em sarilhos e a escapar brilhantemente. Não façam mal ao meu pobre Minho. He's the best.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Curtas: Poderosos Heróis Marvel, volumes 5 a 8

Homem-Aranha: Tormento, Todd McFarlane
Ok, a ideia é intrigante, confesso. Colocar o Homem-Aranha numa situação desconcertante, fora da área de conforto dele. Dificultar-lhe a vida, obrigá-lo a encarar a morte de frente, trazer um inimigo de volta, desorientá-lo.

A execução? Mehhh. O enredo não está focado, anda ali às voltas, sem sabe onde quer chegar, e a verdade é que não tem um clímax satisfatório, algo que termine as coisas. Afinal o vilão estava a fazer aquilo porquê? Só porque sim? Compreendo o terror de não saber, mas não faz uma boa história. Além disso, o argumento não era muito forte; soou-me a potencial para estar melhor escrito, mas não estava.

Quanto à arte, compreendo porque ganhou tanto destaque na altura. É bastante detalhada, as duplas páginas, o detalhe nas teias... e as poses doidas do Homem-Aranha. São interessantes, mas talvez um pouco exagerados. Pelo menos, fiquei a pensar na exequibilidade de algumas. E as proporções parecem-me, bem, desproporcionais. E as caras são diferentes, se bem que aqui é no bom sentido, maioritariamente.

Justiceiro: A Ressurreição de Ma Gnucci, Garth Ennis, Steve Dillon
Portanto, li há uns anos O Regresso do Justiceiro, e apesar de o Justiceiro não ser propriamente coisa que eu costume ler, foi uma leitura divertida, se é que se pode pôr as coisas nesses termos. Os eventos meio doidos, a violência sem limites, a intriga no seio da Máfia.

Portanto, foi bastante agradável e até surpreendente saber que existia uma espécie de sequela. Esperava que trouxesse os elementos que encontrei na história anterior, bem como o sentido de humor da mesma, e foi isso que obtive.

Adorei a maneira como "trouxeram de volta" a Ma Gnucci, como isso traz de volta elementos da história original e como brinca com eles. O enredo continua a ser completamente doido, mas faz bastante sentido.

A arte é até bastante interessante, com umas cores vivas, muito giras, e um traço detalhado que primeiro se estranha, depois se entranha. Parece-me focar-se mais nas reacções e expressões dos personagens, o que me agrada.

X-Men: Caixa Fantasma, Warren Ellis, Simone Bianchi
Gostei mesmo deste volume. Ao longo dos anos tenho lido bastantes coisas dos X-Men, e por isso estou bastante ao corrente das coisas com eles, mas é bom ir preenchendo as lacunas. Li um ou dois dos livros escritos pelo Joss Whedon que antecedem este, e fiquei muito agradada com esta abordagem.

Primeiro porque é suficientemente diferente da anterior. Faz a sua própria coisa. Mundos paralelos, e as caixas fantasmas como forma de viagem entre eles. Seres monstruosos criados artificialmente. Uma invasão a partir de um desses mundos. Os X-Men são em si um conceito de ficção científica, e é bem fixe vê-los a lidar com outros conceitos do género. Adorei ler a história e acompanhar este aspecto.

Depois porque é uma história isolada, auto-contida, que funciona muito bem sozinha. Gosto disso. E gosto de como os personagens são escritos. Há um certo sentido de humor na escrita, e gosto mesmo disso. Adoro ver os personagens às turras e a trocar piadinhas.

A arte é bem detalhada e bonitinha. Gosto do estilo pintado, e apreciei mais este trabalho que que o anterior do mesmo artista. Deu-me gozo acompanhar.

Homem-Formiga: Um Mundo Pequeno, Jack Kirby, Stan Lee, David Michelinie, John Byrne, Tim Seeley
Um conjunto de histórias sobre os vários personagens que assumiram o manto de Homem-Formiga. A primeira parte é sobre o Hank Pym, sobre como descobriu os seus poderes e como os usou pela primeira vez. A segunda parte é sobre o Scott Lang, como descobriu o fato e o usou da primeira vez para ajudar um ente querido. (Elementos da história vislumbram-se no filme recente.)

A terceira parte, a mais longe, conta com o Hank Pym noutro uniforme, em lembrança da sua esposa, a Vespa, e Eric O'Grady a usar as vestes de Homem-Formiga. As duas primeiras partes são relativamente aceitáveis, funcionam bem como história de origem...

... mas preferi esta última parte. É uma história mais longa e elaborada, e super divertida de ler por causa dos dois protagonistas. Também ajuda ser uma história mais recente, em que a arte vai mais de encontro ao que já conheço.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

The Young Elites, Marie Lu


Opinião: Encontro-me numa posição singular e curiosa com este livro. Ao início não tencionava propriamente lê-lo. Li a primeira trilogia da autora, e ela faz muitas coisas bem, como as cenas de acção, e a construção do seu mundo, e até o modo como leva o enredo por caminhos nada óbvios. Mas faltava-lhe algo na caracterização dos personagens, algo que era necessário para me apaixonar pela leitura, e por isso The Young Elites, o primeiro de uma nova série, não era prioridade para mim.

Só que depois o ano passado comecei a tropeçar em opiniões do livro, quando saiu, e bolas, começou a dar-me uma vontade brutal de o ler. Tudo o que lia me dava a sensação de ser exactamente o meu tipo de coisa. Só que ainda estava relutante, e como tencionava tentar não começar muitas séries novas, esperei. Acho que finalmente a Patrícia e a Elphaba se fartaram de me ouvir lamuriar e decidiram que era uma boa prenda quando fiz anos. (Pista: estavam certas.)

É que a fragilidade da autora em criar personagens que me apaixonassem? Foi janela fora. A protagonista Adelina está soberbamente caracterizada, duma forma apurada e certeira, cheia de nuances, que cria verdadeiramente a ilusão que ela é uma pessoa real (adequado, tendo em conta os poderes dela). Aliás, toda a gente está caracterizada do mesmo jeito, mas a Adelina, sendo a protagonista, está mais aprofundada.

The Young Elites é sobre um mundo em que uma peste devorou o país, Kenettra (assim como que uma Itália Renascentista), deixando na sua esteira crianças e jovens, os malfettos, marcadas fisicamente (ou não), e em alguns casos com poderes (os The Young Elites). Os malfettos são vistos em Kenettra como proscritos, que trazem azar e mancham uma família socialmente, e durante este livro vemos um escalar de situação que leva a perseguições, prisão e morte.

E aqui se insere a protagonista Adelina. Sobreviveu à peste, mas não sem mácula. O cabelo ficou-lhe branco/cinzento/prateado (a peste afectou o cabelo de toda a gente, parece, porque toda a gente tem um cabelo lindo e exótico... eh), e perdeu um olho. Mas o mais importante que a peste lhe deixou foram cicatrizes de outro foro: as psicológicas. Desde então maltratada e manipulada pelo pai, não conheceu senão maldade e desprezo da parte dele, deixando marcas indeléveis na sua personalidade.

Oh, e que personagem fascinante a Adelina é. Ela comete tantos erros, faz maldades, caminha no limite entre anti-heroína e vilã, mas não consigo ficar zangada ou desapontada com ela. A Adelina foi uma miúda extremamente mal-tratada toda a sua vida, criando uma combinação poderosa de falta de auto-estima e de confiança e falta de carinho.

E por isso, essa carência desesperada por afecto fá-la oscilar entre várias situações que lhe permitam obter a atenção de outros; só que a sua falta de confiança em si própria e nos outros a faz também tomar decisões precipitadas e impensadas, procurando aqueles que lhe pareçam mais seguros, mas mudando de ideias a cada momento. Na procura de uma emoção, falta-lhe a razão, o que faz sentido para alguém tão jovem e com uma vida tão difícil.

O caminho da Adelina cruza-se com a Dagger Society, um grupo de jovens com poderes que tem (aparentemente) como objectivo ajudar e proteger outros como eles. Mas a Adelina tem muita dificuldade em confiar neles, e à medida que vai fazendo amizades no grupo, a tensão mantém-se: será que vai pôr-se inteiramente nas mãos deles? Será que eles têm os seus melhores interesses em vista? Será que vai traí-los?

Adorei seguir esta parte do enredo, estas dificuldades da Adelina, porque a autora faz um óptimo trabalho em manter as coisas dúbias: há sinais de amizade por parte dos membros da Dagger Society, mas ao mesmo tempo certas acções deles fazem pensar que a Adelina não pode confiar neles. Querer parecer ser mais capazes do que realmente são, e pode-se argumentar que são terroristas para o seu país, pelas acções que tomam no enredo. Dizem querer ajudar outros como eles, mas as suas acções não passam exactamente por aí, já que o seu objectivo final é restaurar no trono aquele de direito, que foi afastado por ser um malfetto.

Os poderes da Adelina são algo de fascinante. É como se ela fosse um Darkling em potência, como poderes ligados à escuridão, e com a tendência para ser empurrada para a vilania, com o impulso certo. Ela tem o gosto pelo poder e ambição suficientes para isso, e a sua capacidade para cair num estado de espírito sombrio que leva à destruição só é rivalizado pela Celaena dos livros da série Throne of Glass da Sarah J. Maas.

O elenco de outros personagens é descrito com precisão. O Enzo pela sua ambição e determinação, destaca-se pela ambiguidade em relação à Adelina, que guia a posição ambígua dela aos outros personagens. Além disso, não é propriamente um interesse amoroso típico, não um pelo qual eu pudesse torcer, porque tem demasiado de primeira paixoneta, da parte dela, além de não estar certa do interesse dele, para me ser credível que sejam um bom par. O percurso dele leva a momentos inesperados (bravo, Marie), o que foi delicioso, mas a Marie já deu as cartas para poder vir dar a volta à coisa, por isso é óbvio que não vai resistir a fazê-lo.

O Raffaele foi dos personagens meus favoritos, pelas suas capacidades de Young Elite, pela sua personalidade calma e segura, pela sua posição na vida, algo agridoce de seguir, pela sua estabilidade emocional acima de tudo, sendo um óptimo contraponto à Adelina e estendendo-lhe uma amizade que deu gosto seguir. Tenho pena que as coisas tenham azedado entre eles, acho que o Raffaele seria uma boa influência nela, e capaz de a ajudar, apesar de tudo. Até consigo ver-me a torcer por eles, no futuro, como par. Seria uma parceria deveras interessante, precisamente pelo contraste que fazem.

Uma outra personagem que achei mesmo interessante foi a Gemma. Serve de contraponto à Adelina de outro modo: aqueles com poderes são avaliados de acordo com o tipo de emoções e conceitos que os guiam e fazem parte fundamental da sua personalidade. Ora se a Adelina se guia por paixão, ambição, medo e fúria, a Gemma trabalha melhor quando está feliz e satisfeita.

É feito subtilmente um argumento interessante sobre o modo como ambas cresceram: a Gemma numa família feliz e que a aceita, e por isso ela funciona melhor quando está bem; a Adelina conheceu maioritariamente o desprezo, o medo e a fúria ao crescer, e é isso que guia os seus poderes e como se manifestam. (Ainda relevante para a questão: a Violetta, a mana da Adelina. A sua postura é interessantíssima e crucial.) É uma relação explícita entre poderes, motivação e personalidade que a autora estabelece, e é uma ideia inusitada o suficiente para me atrair e agradar.

Outro personagem manifestamente interessante é o Teren. Claramente o antagonista, não é isso que uma pessoa pensaria ao ler a sinopse. (Honestamente, pensei que ia ser mais um triângulo amoroso. How wrong I was. Nada a ver com isso, e ainda bem.) Detestei-o pelas suas acções, mas ainda assim é bastante nuanceado, com motivos e personalidade bem claros. Quase parece um pouco patético, pelo seu fanatismo e obsessão com uma outra personagem.

Aliás, é isso que torna a história tão interessante. A Marie escreveu uma história em que ninguém é bom ou mau, vilão ou herói. Só há pessoas e as acções que praticam e que caem num espectro tão variado. Uma ideia fundamental, mas ainda assim pouco explorada e refrescante de ver.

O final foi definitivamente chocante, pelos acontecimentos em si e pelo extremo em que as acções da Adelina (e dos outros também) caíram. Senti a sua dor e confusão, e custou-me horrores ver a quebra de relações que se dá, porque quase dava para ver a alma dela a destruir-se mais um bocadinho, a ver esta bóia salva-vidas que tinha uma medida de afecto a ser-lhe retirada, e como isso a deixou afundar ainda mais.

Estou mesmo intrigada para ver como as coisas se processarão daqui para a frente, porque há um milhão de oportunidades, e estou contente por ter esperado para ler até agora. O segundo livro está quase a sair, e poderei lê-lo brevemente. Sei que gosto da ideia de ter a Adelina a bater no fundo, sempre com o potencial para se tornar numa vilã, e da ideia de ver traçado um caminho de redenção que lhe permita ser e mostrar-se melhor que as suas circunstâncias.

Páginas: 368

Editora: Putnam (Penguin Random House)

sábado, 12 de setembro de 2015

Eu Dou-te o Sol, Jandy Nelson


Opinião: Este é um livro sobre a vida. Sobre o luto e como destrói e reconstrói as pessoas. Sobre a arte como representação da vida e alimento para a alma. Sobre coincidências e sobre como a vida conspira para cruzar aqueles que estavam destinados a cruzar-se. Sobre amar e chegar aos píncaros, amar e sofrer, amar e sofrer.

Eu Dou-te o Sol conta a história de dois gémeos, Noah e Jude. Algo aconteceu há três anos que quase destruiu a sua família e os separou. E a narrativa divide-se então nos pontos de vista dos dois, o Noah há três anos, e a Jude no presente, levando o leitor a descobrir aos poucos o que os separou, as mentiras que construíram um muro entre os dois, e como isso os levou a fecharem-se em si mesmos, perdendo aquilo que adoravam fazer.

É definitivamente um livro singular. Devo dizer, para me livrar já disso, que a escrita é metafórica e lírica, quase como uma pintura, mas de vez em quando me pareceu ir longe demais nas comparações, de modo a fazer-me revirar os olhinhos. Deve ser preferência pessoal, porque por exemplo a E. Lockhart fazia o mesmo tipo de coisa no Quando Éramos Mentirosos, e eu adorei, e nunca tive dificuldade com a sua escrita.

Fora isso, foi uma leitura tão fascinante. Há este acontecimento, e a Jude e o Noah não tiveram oportunidade de terminar essa relação num ponto alto, e sendo jovens, isso marcou-os. O arrependimento e a culpa e aquilo que ficou por dizer, para com essa pessoa, e entre ambos, sufoca-os no presente e impede-os de voltarem a ser os irmãos próximos que eram.

Gosto tanto da relação que este livro tem com o luto e as coincidências da vida. Nesse aspecto, lembra-me um pouco de Extremamamente Alto e Incrivelmente Perto - por também retratar alguém a tentar fazer sentido do luto, e por haver uma história por trás da história sobre o que realmente aconteceu - e de O Fabuloso Destino de Amélie - pelo seu sentido de serendipidade e pela atmosfera que quase é de realismo mágico.

Parte da piada da história foi ir construindo aos poucos o que havia acontecido no passado. No fim encaixa tudo duma maneira brutalmente perfeita, e foi tão engraçado de acompanhar. (Também quando toda a gente menos a Jude já sabia, e toda a gente ficou a olhar para ela com medo de que a bomba explodisse.)

Outro ponto de interesse é o modo como a arte é descrita, como algo vital e essencial para os personagens se exprimirem, uma forma de compreenderem o que os rodeia e fazerem as pazes com a vida, algo primitivo e que tem vida própria. É tão cativante.

Definitivamente gostei das pequenas idiossincrasias dos personagens e do enredo, pois isso é que lhes dá vida, e a caracterização é muito boa, nenhum personagem parece menos que uma pessoa viva em três dimensões, a respirar. Gostei de ver que tipo de pessoas eram os gémeos no passado e como os acontecimentos os mudaram, quase numa imagem espelhada de si próprios, do passado para o presente.

Por fim, gostaria de destacar as relações. As de amizade, as de família, que são tão importantes (achei muito interessante e importante ver como ambos os gémeos se relacionavam com o pai no antes e no depois), e as amorosas. O amor é mostrado como esta emoção viva, maravilhosa e destruidora, que informa a arte dos personagens, e é o amor (aqui quero dizer não só romântico) que os reúne no final.

O Noah e o Brian foram tão adoráveis de acompanhar, num retrato bastante credível e encantador de amor e desencontro quando um dos elementos não está propriamente preparado para sair do armário. E a Jude e o seu inglês, bem, foi tão divertido vê-la resistir a sair da casca, e o Oscar também tem o seu interesse, por ser um bad boy (quase) reformado.

No fim do dia, sei que não será uma história para toda a gente, ou pelo menos vejo como a escrita possa ser um obstáculo à leitura (a mim inicialmente foi, mas depois embalei e nem quis saber, estava demasiado enredada), mas penso que vale muito a pena dar-lhe uma oportunidade. Não há muitos livros que se sintam tão reais e tão próximos, ainda que mantendo os pés firmemente na ficção. Estou pelo menos curiosa para ver que mais a autora tem preparado.

P.S.: A capa é linda. Muito melhor que o original. Bravo, Presença. Raramente fico tão orgulhosa do trabalho gráfico por cá. É claro que tenho de questionar a tradução do título. O tempo verbal no presente soa tão artificial. Que há de errado com usar o futuro, como no original, "Dar-te-ei o Sol"? Há poucas ocasiões em que esta conjugação soaria bem, mas aqui gosto bastante dela.

Título original: I'll Give You the Sun (2014)

Páginas: 336

Editora: Presença

Tradução: Jorge Freire

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Harry Potter e a Pedra Filosofal, J.K. Rowling


Opinião: Isto vai ser só um comentário curto, porque a este ponto do campeonato, que mais posso dizer que já não tenha sido dito um milhão de vezes? E se nunca leram isto, shame on you. E parabéns, ao mesmo tempo, suponho. É um bocado difícil conseguir esse feito nos dias de hoje.

Bem, há uns tempos dei por mim super nostálgica, a morrer de saudades deste mundo, e como a minha irmã adquiriu a colecção completa na Feira do Livro, e a mesma ainda está aqui, nesta casa, aproveitei. Começar a ler no dia 1 de Setembro (o início do ano lectivo em Hogwarts) foi mesmo de propósito, em jeito simbólico, já que a bendita carta para Hogwarts nunca chegou (eu bem digo que os correios são uma desgraça).

Impressões principais: bem, que delicioso é ler sabendo o fim, porque muitas das noções e ideias pré-concebidas dos personagens estão longe de estarem correctas, talvez com uma ligeira fracção de verdade ali a substanciá-las pelo meio; o que é tão bom de acompanhar. O que se passou realmente em Godric's Hollow, e o que as pessoas pensam que se passou. O que realmente é Voldemort e como ficou assim, e que poderes e capacidades tem.

Outra coisa muito boa é o manancial de pormenores que a autora introduz neste mundo. Alguns até podem nem servir para mais nada a não ser criar o cenário; mas depois outros, vai-se a ver, são tremendamente importantes, ou preconizam uma revelação mais tarde. (Comecei a guinchar de excitação, por exemplo, quando o Ollivander diz da varinha do pai do Harry "boa para transfiguração"... e mais à frente sabemos que ele se tornou num Animagus.)

O extraordinário nisto tudo é que a autora plantou imensas pistas que vai usar muito mais à frente: das duas uma, ou ela é brilhante a prever do que vai precisar revelar e coloca-as já, ou é brilhante a usar detalhes que não tinha previsto usar para encaixar no que vai revelar mais à frente. Either way, ela é brilhante, já percebemos isso.

Último ponto a destacar: o tipo de narrativa. Ainda muito longe das histórias mais sérias e pesadas do fim da saga, este é um livro com estrutura típica de mistério, delicioso de explorar e desvendar, e ainda com uma pitada de escola-internato, com miúdos à descoberta e à aventura, a meterem-se em sarilhos e a crescerem com isso.

(Ainda outro ponto: a química entre o trio-maravilha. Tão fofos! Quase que me esquecia quão adoráveis eram juntos, e alguns pontos da sua personalidade que são tão giros.)

Título original: Harry Potter and the Philospher's Stone (1997)

Páginas: 260

Editora: Presença

Tradução: Isabel Fraga

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

O Mar Infinito, Rick Yancey


Opinião: Eu gostei tanto do primeiro livro desta trilogia, A 5ª Vaga, que foi tão devorável e cativante, que nem sabia muito bem o que esperar da sequela. Primeiro porque o autor usa uma premissa suficientemente original, e dá-lhe um desenvolvimento de formas inesperadas. Depois, porque a seguir a um livro tão intrigante e cheio de reviravoltas, é difícil saber o que esperar.

E realmente O Mar Infinito é um animal diferente do seu antecessor. A estrutura da narrativa e o modo como evolui são um pouco diferentes; este é um típico "segundo livro", um livro de ligação entre os extremos da trilogia, e aparenta por isso ter menos acção - pode parecer que "não acontece nada", mas isso é porque os personagens numa boa parte da história estão fixos num local, e é o que lhes acontece aí que permite explorar melhor o plano mestre dos extraterrestres, os seus métodos e motivos.

A primeira parte da narrativa foca-se então nesse local fixo, um hotel abandonado em que o grupo de protagonistas se reúne para considerar o seu próximo passo na direcção da sobrevivência. Um dos personagens, a Ringer, separa-se do grupo para, em jeito de batedora, investigar um local onde se possam abrigar melhor. Outros personagens surgem, não propriamente de forma inesperada (até parece que o final do outro livro não ia levar a isto), trazendo convidados indesejáveis.

Portanto, é uma parte do enredo bastante polar. Dá a sensação de ser mais calma, mas depois estão sempre a acontecer coisas, e o surgimento dos dois "convidados" acaba por gerar duas situações bastante excitantes. A primeira parece saída dum filme de terror, a segunda por meter um confronto directo.

Também tem as suas revelações (ainda que não sejam as maiores do enredo), nomeadamente no que toca ao papel e importância dos Silenciadores. E o melhor desta parte, as interacções entre os personagens são tão divertidas e fascinantes de acompanhar. A rivalidade da Cassie e da Ringer, que é narrada de forma tão diferente pelas duas, uma mais detalhada, o que é tão curioso, porque o que contam ou não mostra algo sobre a sua personalidade.

O modo como toda a gente está completamente rebentada e ainda assim continua a andar por ali armada em Rambo. Noto que isto é totalmente vindo dos rapazes, e essa rivalidade também é gira. As cenas da Cassie com o Evan são lamentavelmente poucas, porque quando eles estão juntos têm uma química gira, quando estão separados e a suspirar um pelo outro é que parecem uns totós.

Contudo, o grande destaque que vou fazer para esta parte é o Poundcake. Este miúdo nunca fala, e num par de capítulos percebemos porquê, a sua história trágica, e o modo como heroicamente salva os outros. Há um mar de profundidade neste miúdo, aliás, em todos eles, e a tragédia torna-se ainda maior quando percebemos que são apenas miúdos, e que não merecem o que lhes está a acontecer: são demasiado novos, obrigados a crescer demasiado cedo.

A segunda parte do livro foca-se maioritariamente na Ringer e no que lhe acontece depois de ser capturada. É uma parte muito interessante por ser tão psicológica, um jogo de vontades; e também por conter as grandes revelações da narrativa no que toca ao que os extraterrestres andam a tramar. Achei tão fascinantes as interacções dela com o Razor, e as acções dele, particularmente no fim, porque apesar de ser muito aberto, nunca é possível perceber realmente o que lhe vai na cabeça.

A propósito, esta parte da Ringer lembra-me uma coisa que o Rick Yancey faz soberbamente: a instilação da paranóia. Caramba, eu achava que já tinha percebido esta coisa toda, mas as descobertas finais da Ringer fizeram-me questionar tudo e todos, incluindo a narrativa vigente. Se uma parte só é mentira, não pode tudo sê-lo? É arrepiante considerá-lo.

Uma coisa que mencionei de passagem ali em cima, e gostava de reforçar, é o retrato psicológico que o autor traça dos personagens. É muito bem pensado, gosto bastante de acompanhar o modo como ele apresenta as personalidades e experiências destes jovens, porque aquilo que eles são, mas também aquilo por que passaram nos primeiros dias da invasão condiciona os seus comportamentos, provavelmente condicionará para sempre, seja qual for o fim da trilogia. É algo trágico de constatar. São demasiado jovens para carregar certos pesos.

Outra coisa que quero destacar é a forma como o autor escreve e desenvolve a narrativa. Nunca vai pelo caminho mais óbvio, pensa frequentemente "fora da caixa", e isso é muito refrescante. Às vezes consigo perceber como o livro vai terminar só de ler 50 ou 100 páginas, e apesar de isso não ser necessariamente aborrecido, também não constitui um desafio. O Rick Yancey faz-me trabalhar para merecer a leitura, mantém-me alerta ao longo dela. Gosto disso.

Pronto, só posso terminar isto dizendo que estou morbidamente curiosa para ver como termina. As descobertas finais são suficientes para mudar o jogo, à medida que um confronto final se avizinha, e céus, começo a ter a funesta ideia que isto vai explodir, e eu vou sair de coração partido da coisa. Bem, pelo menos tenho para aí um ano para me preparar. Este é provavelmente o único momento em que dou graças por ter de esperar um ano por um livro.

P.S.: Finalmente, um tradutor competente! Não dei por uma única calinada, e ocasionalmente dei por mim a ler algo e a concordar com a tradução. Do que eu tenho lido dele, acho que nunca tive razões de queixa. É cada vez mais raro, praticamente nunca acontece, god bless him.

Título original: The Infinite Sea (2014)

Páginas: 272

Editora: Presença

Tradução: Miguel Romeira

domingo, 6 de setembro de 2015

Curtas: Poderosos Heróis Marvel, volumes 1 a 4

Vingadores: A Era de Ultron 1, Brian Michael Bendis, Bryan Hitch
Vingadores: A Era de Ultron 2, Brian Michael Bendis, Bryan Hitch, Brandon Peterson, Carlos Pacheco
Isto teria corrido melhor se não tivessem tentado vender este crossover event com o mesmo título do segundo filme dos Vingadores. Pelo que me é dado a entender pelas opiniões no Goodreads, toda a gente se pôs a ler isto pensando que os prepararia para o filme, e é claro que foi um tiro no pé. O livro pede que se conheça relativamente bem o universo Marvel e alguns dos seus personagens mais (e menos) proeminentes, e não é nada introdutório no que toca ao Ultron, por isso...

Portanto, o Ultron no início da história volta à Terra (os vilões voltam sempre, por mais que os eliminemos), tem um confronto com os Vingadores, e desaparece, para se vir a revelar que tinha um plano que envolvia destruir a humanidade e os super-heróis (what else?), e que foi bem sucedido, resultando num presente pós-apocalíptico.

Acho que preferia ter visto a evolução do ponto A para o ponto B, isto é, como o Ultron fez uma razia ao planeta, como o seu plano se desenrolou. Assim só vemos o resultado, e apesar de ser assustador, ver a destruição e quão poucos sobreviveram, seria mais impressionante ainda ver a coisa em acção.

Portanto, os super-heróis estão destruídos, desmotivados (até o Capitão América está para ali encostado a um canto, deprimido), em números muito reduzidos, mas tentam desenvolver um plano para descobrir o que se passa e como derrotar o Ultron, e uma coisa leva a outra, et voilá, temos direito a viagens no tempo.

Estou curiosa para saber o que teria acontecido com a Equipa Futuro (devem ter morrido todos), mas gostei de acompanhar o Wolverine e a Sue Storm ao viajarem para o passado e tentarem impedir a criação do Ultron, ainda que discordem no método. O Wolverine é a pessoa que gosta de ser criativo com as garras, como é habitual, e ooops, nova timeline/universo paralelo criados.

Achei esta timeline bastante interessante, e gostei de a explorar; contudo, ainda mais interessante e importante foi o Wolverine voltar ao momento crucial antes da criação do Ultron e essencialmente resolver as coisas falando, com o Hank Pym e com o seu outro eu, em vez de resolver à pancada. Uma vez na vida o homem aprende.

Além disso, a noção de dois Wolverines no mesmo espaço e a quantidade de pancada que isso dá no contínuo espaço-tempo, bem, é fantástica de considerar. O final é relativamente interessante, mas considerando que já percebi há que tempos que este pessoal anda a dar cabo do universo aos poucos, e que isto vai rebentar não tarda nada, bem, não há nada de novo. A não ser ali quando o Hank pensa numa solução melhor, e eu temer que isto vá descarrilar novamente.

Gostei mais da segunda parte da história, visualmente, porque o primeiro artista, Bryan Hitch, tem uma forma estranha de planear o layout das pranchas, e muitas são uma dupla página que não tem pistas visuais suficientes que avisam que é uma dupla página, e vá de a ler três ou quatro vezes até acertar com a coisa. A segunda parte, como mete viagens no tempo, usa dois artistas para separar o passado do presente, e torna-se muito mais interessante de observar, pelos estilos díspares.

Homem de Ferro: A Semente de Dragão, John Byrne, Paul Ryan, Mark Bright
Eu provavelmente apreciaria mais isto se fosse realmente fã do Homem de Ferro, o que não é exactamente o caso. Oh, os filmes foram divertidos, muito graças à interpretação do Robert Downey Jr., mas ainda não me consegui decidir sobre o personagem. Há alguns personagens da Marvel que eu gosto à partida, porque cresci com eles ou já os conheço há muito tempo, ou porque são apresentados de maneira cativante, mas o Homem de Ferro? Nunca li uma coisa que me fizesse realmente gostar dele, ou percebê-lo, sei lá, ter uma boa imagem dele.

De qualquer modo, aprecio esta história por explorar e esclarecer vários pontos da mitologia do personagem e dos seus inimigos. Descobrimos de onde vêm os dez anéis do Mandarim, e parece que a história é uma reinvenção do seu papel como vilão do Homem de Ferro, o que é interessante de ler. Também aparece um vilão, o Fin Fang Foom, que tinha visto algures, e descobri agora que é suposto ser um vilão do Homem de Ferro. A sua história de origem é fascinante, porque dragões. Dragões a sério, na China. Dragões alienígenas. Está tudo dito.

E pronto, o enredo pode fazer um bom trabalho a correr o conflito, a estabelecer os avanços e recuos nele, mas noutro ponto é péssimo: então o Tony Stark e a doutora Su Yin saem um par de vezes, convivem para resolver o problema dele, e de repente já estão apaixonados? Sendo ela casada, o que pressupõe que não está livre emocionalmente para este tipo de coisa, ainda mais porque parece que há qualquer coisa com o marido, que nem sabemos o que é, porque nunca é devidamente explorada. Ugh. Da próxima vez que alguém se vier queixar de YA e os seus tropes, incluindo insta-love, como se os outros livros não os tivessem, leva nas trombas com este volume. Que forma de escrever um aspecto emocional tão preguiçosa.

E agora que me lembro, a Viúva Negra aparece, anda à procura de ajuda para qualquer coisa. Só que é uma storyline meio abandonada a meio deste volume. Calculo que fosse o arco de história seguinte ao deste volume, mas não gosto que tenha sido desenvolvida tão cedo (devia ter aparecido na segunda metade do volume), e que seja assim abandonada, como se deixasse de ter interesse. Apenas diminui a sua importância para o que iria acontecer de seguida, que nem sabemos o que é, em vez de a aumentar, e de aumentar o interesse.

Viúva Negra: O Manto da Viúva, Greg Rucka, Igor Kordey, Devin Grayson, J.G. Jones
Este volume reúne duas histórias da Viúva Negra, e em ambas o foco é dividido com (ou até somente de) uma segunda Viúva Negra, activada quando a Natasha desertou e deixou de ser espia ao serviço da Rússia. Essa segunda personagem é Yelena Belova, que se debate com a herança deixada pela Natasha Romanov.

A primeira história, apesar de ter sido publicada depois, acontece antes, cronologicamente falando. Segue a Yelena nos seus tempos de preparação para ser a Viúva Negra, e os acontecimentos que precipitam o seu assumir do manto. Yelena investiga a morte do seu supervisor, um homem que se vem a revelar ter frequentado um clube S&M, tendo contratado uma sósia da Yelena como parte das suas fantasias.

O interessante aqui é a realidade construída para activar a Yelena, que me fez questionar tudo, toda a narrativa passada e presente que condiciona o evoluir do enredo; e ao mesmo tempo, como os sentimentos da Yelena a levam a tornar-se na Viúva, e como tem de os enterrar para assumir esse papel.

A segunda história apresenta uma espécie de competição entre as duas Viúvas. Um cientista criou um soro que torna soldados em berserkers, essencialmente, e os governos russo e americano mandam as Viúvas numa corrida contra o tempo para impedir um general de um país fictício do Médio Oriente de usar o soro, e recuperá-lo.

Aqui o interesse prende-se com a "competição" entre as duas, que nunca chega a sê-lo, propriamente. A Yelena tem o mesmo treino e capacidades que a Natasha, mas não tem a sua experiência; e por isso, a Natasha está sempre dois passos à frente dela. (Melhor, está dois passos à frente dos dois governos que têm interesse no soro, como a melhor das espias.) É uma relação curiosa de explorar, a das duas, especialmente com a posição de mentora a cair nos braços da Natasha.

É a minha história favorita das duas. (A outra exige que se conheça e goste da personagem para se preocupar com o que lhe acontece. Aqui no livro devia vir depois, tal como a ordem em que foram publicadas.)

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Manifesto de Como Ser Interessante, Holly Bourne


Opinião: Ok, este livro foi uma surpresa. Eu sei que digo isto com alguma frequência nos parágrafos iniciais das opiniões, mas é algo que me vai acontecendo bastante, felizmente. Desenvolvi um certo sexto sentido para apreciar livros quando primeiro ouço falar deles, para perceber se é coisa que me venha a agradar, e evitar coisas que não sejam a minha onda; no entanto, também tento arriscar-me um pouco, pegando em coisas que não sejam obviamente a minha cara, ou sobre as quais não consigo formar uma opinião sobre se devo ler ou não.

E tantas vezes tem-me saído a sorte grande e tenho ficado agradavelmente surpreendida; é o caso deste livro. Pela sinopse e aura que emana, achei que era mais ao estilo comédia romântica, com a protagonista a tentar inflitrar-se no grupo dos populares, a subir muito alto e a cair muito fundo, antes de aprender Uma Grande Lição e tirar Uma Grande Moral daquilo tudo.

Pois bem, nada a ver. Logo no início dá para ver que é um pouco mais sério e, bem, negro, que isso. A Bree é uma rapariga insegura, solitária, fechada em si, e tem uma auto-estima tão baixa que deixa vislumbrar outros problemas que mereciam acompanhamento.

É uma escritora aspirante, e depois do seu segundo romance ser recusado, começa a duvidar da vocação para a escrita. Alguém mais velho que ela (e numa posição de autoridade, mas mais sobre isso mais à frente) faz um comentário descuidado sobre como ela devia ser mais interessante, fazer coisas mais interessantes, que lhe permitam viver e crescer na escrita.

Ora isso desperta o bichinho na Bree, e ela lança-se numa investigação aturada de uma série de comédias românticas (aquelas que eu achava que eram o molde para este livro), e tira daí uma série de lições ou regras para se tornar mais popular e mais (na cabeça da Bree) interessante. E é tão dedicada a isso, é impressionante, a Bree esforça-se mesmo por sair da casca e fazer outras coisas, ainda que os seus objectivos e métodos sejam algo mal-orientados, e que, claro, as coisas descarrilem a certo ponto.

Gostei muito desta protagonista. A autora não se coíbe de mostrar aspectos menos agradáveis da sua personalidade e percurso, e eu gosto mais da Bree por isso. Há uma verdadeira curva de aprendizagem para ela, que compreende onde é que errou, o que fez mal, às vezes mesmo quando está a fazê-lo; gosto que a autora mostre o valor de errar e de aprender com isso, mesmo que a queda seja bem acentuada.

O percurso para se tornar interessante nem sempre é óbvio, e claro que apreciei as pequenas surpresas da história: como quando a Bree se abre a ter uma melhor relação com a mãe, ou entende que as meninas populares são pessoas como as outras, com inseguranças e dramas pessoais - apenas são melhores a escondê-los.

Tive pena que não se tivesse explorado mais a relação da Bree com o Holdo, o melhor amigo, pois eles afastam-se logo no início quando ela começa o seu projecto, e só se reaproximam no fim; tenho especialmente pena que o Holdo não tivesse sabido do que lhe aconteceu na parte final, e não tivesse podido estar lá para apoiá-la.

Há uma relação de carácter duvidoso com um professor, o tal na posição de autoridade, e achei bastante pertinente que a autora descrevesse a situação tão bem: a maneira como a Bree se lança de cabeça, sem pensar nisso, mas também deixando vislumbrar (e muito bem) as motivações por trás da figura do tal professor; a própria Bree chega lá, suspeita disso, mas descarta-o por estar embeiçada.

O comportamento desta personagem do professor nunca é de louvar, mas chega a um ponto extremamente baixo mesmo no fim: nunca imaginei alguém que se considere um adulto a portar-se de forma tão infantil, e tão cobarde. Deu-me mesmo vontade que fosse atropelado por um autocarro. Ugh.

Adorei, já disse, o modo como a autora descreveu o percurso da Bree, não fugindo a nada, e descrevendo sentimentos e modos de estar tão adolescentes e tão credíveis (o modo como a Bree se sentia em relação a uma peça de arte é tão interessante; dá vida à sua personagem duma forma tão verdadeira).

Mesmo na parte final, com os acontecimentos tão reais e actuais, apreciei ver a reacção da Bree à gravidade daquilo em que se meteu, e como ela não tencionava chegar tão longe; e gostei de a ver chegar aos poucos a um lugar de maior paz e aceitação com o estado de coisas e com quem é (e gostei do lado vingativo e tortuoso dela e do pai); aqui, a narrativa toma talvez um ligeiro tom moralista, mas nunca incómodo, e que faz perfeitamente sentido com a lógica da evolução do enredo.

Sim, portanto, como dizia, uma boa surpresa. Não seria um livro que leria se não tivesse sido publicado em português, e teria perdido uma boa leitura, algo diferente do que eu costumo ler (porque é que não publicam mais autores britânicos de YA?); por isso, fico muito contente de ter arriscado. De vez em quando gosto de o fazer, nem que seja para "votar" com o meu dinheiro e dizer àquela editora "sim, por favor, publiquem mais disto". Agora se me dessem ouvidos, era outra coisa.

Título original: The Manifesto on How to Be Interesting (2014)

Páginas: 424

Editora: Civilização

Tradução: Márcia Jesus Martins