domingo, 31 de julho de 2016

Este mês em leituras: Julho 2016

E pronto, mais um fim de mês. Julho foi um mês mais calminho, a nível de compras, leituras e movimento por aqui... o calor dá-me preguiça, raios, e os meus horários loucos não ajudam. Confio que Agosto seja um pouco melhor, vão começar a sair livros de autores e séries que sigo, e vou de férias, o que também é bom para os meus passatempos.

Livros lidos


Opiniões no blogue


Os livros que marcaram o mês

  • A Torre de Espinhos, Juliet Marillier - estranho seria se um livro da Juliet não fosse de destacar... gosto do estilo dela, gosto de como escreve e sobre o que escreve, e este é um dos bons exemplos que mostra as capacidades dela;
  • Something Strange and Deadly, Susan Dennard - é um livro que é claramente o primeiro da autora, mas tem coisas muito fixes, gostei bastante dele em geral e deixou-me muitíssimo curiosa em relação ao que vem a seguir... estava pronta para encomendar o resto dos livros no Book Depository, porque ainda por cima tinham um bom desconto, mas quando estava preparada para encomendar já se tinha ido o desconto... terei de esperar mais um pouco;
  • Viagem à Procura de Mim, David Arnold - este é um destaque pela negativa, mas pronto, tenho de destacar um livro se ele me suscita uma opinião em que não consegui encontrar nada de bom para dizer, só consegui encontrar defeitos e mais defeitos até me cansar de listar tudo o que não me agradou nele;
  • A Rainha de Tearling, Erika Johansen - é tão estranho, e a autora pode aprimorar umas coisinhas, mas bolas, que eu o li duma ponta à outra completamente cativada e envolvida nas suas peripécias... a autora cria um mundo e umas circunstâncias tão curiosas que eu não posso deixar de querer saber e ler mais.

Outras coisas no blogue

  • Errr pois... parece que foram só opiniões este mês, mesmo.

Aquisições

Umas compras modestas. Limitei-me a continuar as colecções que acompanho, de BD: a Graphic Novels Marvel (os dois livros ali no meio com lombada a combinar) e a Novela Gráfica II da Levoir (os quatro livros de baixo).

Fora isso, os dois livros de cima foram comprados com desconto em cartão, creio que tive de completar o valor deles com uns poucos euros.

A ler brevemente

Pretendo voltar ao meu desafio Meg Cabot, com o início de uma nova trilogia sobre o mito de Persephone. (Não me estragues isto, Meg.) Já tencionava fazê-lo este mês, mas encomendei os livros demasiado tarde e acabei por deixar para Agosto.

A minha relutância com encomendar livros deveu-se a estar um bocadinho farta do Book Depository e do seu sistema de preços esquizofrénico. Nos últimos meses não tenho encomendado muita coisa, porque não tem saído nada de séries/autores que sigo, mas bolas, o BookDep não ajuda. Mesmo este mês, estava pronta a lançar-me em compras, mas depois os livros com desconto que queria deixaram de ter desconto.

E depois ainda por cima fiquei com dúvidas em encomendar duas pre-orders de Agosto com receio que tivessem mais desconto depois de sair. (Ou não.) E depois tinha tanta coisa na lista que queria encomendar de banda desenhada, que em vez de ter de decidir, acabei por mandar tudo às urtigas e fiz uma encomenda minimalista.

Esta questão lembra-me de mais uma coisa. Oh BookDep, vocês estão mesmo forretas. Então dantes mandavam por e-mail vales de desconto a torto e a direito, e agora que uma cliente tão boa como a je anda desaparecida, não são capazes de me mandar um descontozinho? Chatos.

sábado, 30 de julho de 2016

A Rainha de Tearling, Erika Johansen


Opinião: Este livro é deveras estranho. Imaginemos uma sociedade com pinta de semi-distópica. Mas que também tem o ar de fantasia épica medieval. Mas que na verdade é uma história pós-apocalíptica com elementos de história alternativa e intriga histórica. Confuso? Oh, nem queiram saber. E ainda assim, dei por mim cativada.

Portanto, a história passa-se em Tearling, que é uma terra fundada depois de algum tipo de apocalipse que acabou com o mundo como o conhecemos, por um conjunto de pessoas muito parecidas com os peregrinos e colonos da América. A ciência regrediu um bocado, mas ainda sobram restos de algum conhecimento avançado.

No meio disto tudo, Tearling é um país pequenito, entrincheirado no meio de países mais poderosos, cobiçado pelo grande poderio que é Mortmesne. A rainha morreu há década e meia, deixando um vácuo no poder ocupado pelo irmão, como regente. A sua única herdeira, desaparecida, resguardada, escondida até atingir a maioridade e poder ocupar o seu trono.

E é aqui que aterra a Kelsea, a protagonista do livro. Ela é a herdeira do trono, e passou todos estes anos a preparar-se para assumi-lo, mas cedo sai do casulo e percebe que a sua educação teve graves lacunas. Atirada para uma situação política interna e externa complicada, tem de lidar com os vários jogadores enquanto tenta manter-se fiel a si própria.

Diverti-me tanto com a Kelsea. Ela é tão cheia de dúvidas, sobre o que é capaz de fazer, sobre se é adequada para o lugar, sobre a sua aparência. É... refrescante ela não virar uma Mary Sue super boa e super capaz mal caia de traseiro no trono. Acho que passava bem era sem tanta insegurança sobre a aparência dela. Porque isso é realista para alguém da idade dela, e até certo ponto gosto de ler, mas a depois a a autora insiste demasiadas vezes até enjoar. Além disso, a insegurança da Kelsea dá-lhe para ser algo má para com a aparência de outras mulheres, e isso não era de todo necessário a autora introduzir na sua caracterização.

E mais, a Kelsea é tão inerentemente boa, crente na justiça. Vê algo que acha que está mal e acaba com isso, que se danem as consequências. Prova pela primeira vez o poder que tem e lá vai ela, a acabar com injustiças a torto e a direito. Gosto que ela veja que o lugar que ocupa lhe permite fazer muito bem, e que isso a faça aspirar a tentar melhorar o estado da sociedade Tearling.

É claro que ela comete erros, e não sabe algumas coisas, e mete-se em sarilhos. Mas caramba, a miúda tem fibra. A cena da coroação dela é trepidante. Ela ali a esvair-se em sangue, e a dizer a toda a gente para continuar, que não sai dali sem uma coroa na cabeça, nem que tenha de sacar uma a uma súbdita. (É coroada com a tiara duma nobre num momento hilariante.)

Mais dois ou três pontos fortes se destacam. O elenco, primeiro, porque adorei descobrir os vários tipos de personagens que rodeiam a Kelsea, e fiquei a gostar da caracterização de muitos. Achei tão engraçado vê-la sempre rodeada de uma série de guardas, que vão lentamente ganhando respeito por ela, para além de lealdade para com o trono. É difícil, porque ela é a monarca, mas a dinâmica de géneros leva sempre a que uma mulher tenha mais dificuldade em se fazer ouvir e impor, o que se vê na parte final do livro, quando ela os tenta convencer da missão de salvamento.

O enredo, sempre cheio de reviravoltas e trocas e baldrocas. Não há um momento de descanso para a pobre protagonista. E o mundo, porque o worldbuilding deixou-me muito intrigada. Não é revelado muito, mas toda eu comicho de perguntas sobre o que tenho à frente; a autora conseguia deixar-me assim tão envolvida.

É claro que se nota que isto é um primeiro livro. Há algumas coisas que a autora tem de trabalhar. Certos pontos do enredo e dos personagens podiam ser mais afinados; a Rainha Vermelha aparece por ali só para enfeitar, e não é uma ameaça consistente ao longo do livro, os momentos a ela dedicados não servem para avançar a personagem.

O Rapina é outra coisa que eu dispensava. Não faço ideia de qual é o objectivo dele na narrativa, porque raios a autora o criou. A Kelsea fica rapidamente obcecada com ele, mas eles passam tão pouco tempo juntos, e sem química, que não percebo donde aquilo vem. Além disso, ele tem alguns elementos um bocadinho... estranhos, e não me hão de convencer que é material para par romântico. (Muito mais fazia sentido a Kelsea com o Pen, acho eu...)

Há certas coisas nas motivações, no correr do enredo, que podia fluir melhor, que podia soar melhor. É coisa que acho que pode ser trabalhada pela autora. Porque por outro lado, ela escreve com alguma sensibilidade e intuição, o que me agrada.

E pronto, fico-me por aqui. Quero tanto saber mais sobre os mistérios da narrativa, o pai da Kelsea (às tantas é o Moca... não me admirava nada), a regência da mãe dela e como isso leva a que as pessoas não lhe falem dela como deviam (a Kelsea precisava de estar melhor preparada), como é que as coisas ficaram assim, neste mundo... estou tão curiosa.

Título original: The Queen of the Tearling (2014)

Páginas: 400

Editora: Presença

Tradução: Miguel Romeira

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Curtas: Graphic Novels da Marvel, vols. 15 a 17

O Espetacular Homem-Aranha: Revelações, J. Michael Straczynski, John Romita Jr.
Já li esta história também, no passado, pelo menos grande parte dela me é familiar; creio que quando a Devir publicava revistas mensais, e uma delas era do Homem-Aranha.

E este status quo do Aranha acaba por ser um dos meus favoritos. Uma das coisas que me aborrece quando escrevem o personagem é esta tendência para voltar a uma certa estagnação que faz dele um coitadinho e uma espécie de Peter Pan que não cresce.

E portanto as histórias que mais gosto metem algum tipo de evolução (ele a trabalhar nos laboratórios Horizonte, toda a coisa da troca com o Octopus), e as histórias que detesto metem coisas como apagarem o casamento do Peter e da Mary Jane numa alteração de realidade vergonhosa e que devia ter mais repercussões que teve.

Aqui, vemos desenrolar-se a história depois da Tia May descobrir que o Peter é o Homem-Aranha. E é fantástico! Dá espaço a esta grande senhora para mostrar como é uma pessoa de classe e absolutamente fabulosa. Sou uma fã da May, e foi a maior perda da coisa de desfazer o casamento: ela deixar de conhecer a identidade dele. O Peter passou tanto tempo a esconder-se desta pessoa que ama, que é libertador ver tudo revelado. E adoro a reacção da May: preocupada, mas curiosa e aliviada por saber a verdade.

A história mete pelo meio o Peter a ajudar uns miúdos da escola onde ensina (outro desenvolvimento que eu adorava), e a meter-se no meio de uma luta entre o Octavius e um imitador dele. Mas a melhor parte desse segmento é na verdade a Mary Jane. Ela e o Peter estão separados, e ela está a fazer a sua coisa, a aprender a sua própria pessoa, e gosto muito deste trajecto para ela, ser uma pessoa independente e não deixar que os dramas do Peter a arrastem. (Apesar de eu gostar muito de os ver juntos.)

Supremos: Segurança Nacional, Mark Millar, Bryan Hitch
Ler isto depois dos filmes dos Vingadores parece dèja vú. Acredito que o primeiro deva bastante a esta história; os pormenores são bastante diferentes, mas o tom, a maneira como as coisas são apresentadas e evoluem, lembra-me imenso do filme. Ambos estão a tentar apresentar os personagens e o mundo a leitores/espectadores que não estão familiarizados com os mesmos.

O mais fascinante desta história é o conjunto de vilões, de como estão relacionados com a história do Capitão América, e de como estiveram tanto tempo tão discretos, e de como os heróis estiveram tão perto de perder tudo. Não conhecia muito esta raça, mas achei bastante interessante descobri-los.

A interpretação/variação de alguns personagens é muito engraçada/interessante (no primeiro caso não é nada engraçada, atenção): o Hank Pym, que no universo 616 tinha batido uma vez na Janet, aqui evolui para violência doméstica a larga escala, completamente iludido que está a fazer... bem? Ugh. O Thor é um taradinho da ecologia que deixa toda a gente na dúvida se não será um doente mental que fugiu do manicómio e acha que é um deus.

O Mercúrio e a Feiticeira Escarlate aparecem só nos momentos cruciais, depois da vitória, e o Mercúrio diz que sempre esteve lá, se virem nas filmagens e abrandarem a coisa, lá andará ele a distribuir porrada, supostamente. (Este gag é hilariante, por alguma razão.) O Gavião Arqueiro e a Viúva Negra trabalham juntos, dão porrada como se não houvesse amanhã e fazem proezas extraordinárias, são muito giros. (Não consigo é ver o Gavião com o design de brincos nas orelhas. Não me parece nada ele, mas enfim, é outra interpretação do que aquela que li.)

Thunderbolts: Fé nos Monstros, Warren Ellis, Mike Deodato
É bastante desconcertante mas curioso ler e opinar isto a uns dias de o filme do Esquadrão Suicida sair. Porque basicamente esta é a versão Marvel de uma equipa de vilões forçados a trabalhar para o lado dos "bons", e uso aspas porque o posicionamento da equipa e do líder Norman Osborn no espectro de bom-mau é... incerto.

Primeiro, reconheçamos quão fixe é ter o Norman a liderar alguma coisa. Porque, um, ele é assustador a lidar com os outros elementos, impondo a sua autoridade vezes sem conta. Dois, porque ele é doido, doido, e doido. A obsessão dele com... aranhas neste livro? Hilariante.

Fora o Venom e o psicopata (caramba, nem me tinha dado conta de quão avariado este tipo é até ler isto) Mercenário, o restante da equipa é pouco proeminente, praticamente toda desconhecida da minha pessoa. Alguns deles têm um conjunto de poderes bem doidos. O Penitente só consegue activar os poderes dele se estiver num fato com espigões lá dentro que lhe provocam dor. Adorava saber quem é que se lembrou disto e de onde é que saiu a ideia, porque é... bizarro.

Normalmente acabo a gostar bastante de algo que o Warren Ellis escreva, porque ele explora um conceito inusitado, encontrando um ângulo fascinante, e sendo bom a apresentar o drama emocional, as tensões. Aqui temos uma equipa que não é uma equipa, sendo forçados a trabalhar juntos, e gostei de ver isso, combinado com o problema que é aquela coisa que saiu da Guerra Civil que é o Registo de Super-Heróis, e a detenção daqueles que não se registam - os Thunderbolts estão encarregados desta parte... com métodos violentos e pouco ortodoxos.

domingo, 24 de julho de 2016

Something Strange and Deadly, Susan Dennard


Opinião: Independentemente do que eu tenha achado ou do que eu venha a dizer mais para a frente deste livro, a Susan começa com um par de desvantagens. Uma, este é o primeiro livro dela, e isso é muito claro. Tem arestas por limar. Dois, ela é amiga/parceira de escrita da Sarah J. Maas, que eu adoro ler, portanto as comparações são difíceis de desligar.

Quanto ao segundo ponto, não é que as comparações a deixem mal, exactamente. Creio que a Sarah era capaz de ter mais talento natural e bruto no primeiro livro, porque o que me lembro do mesmo é que li aquilo duma ponta à outra vorazmente, enlevada, mesmo quando tinha as suas fraquezas. Neste, a escrita da Susan não é tão envolvente à primeira, o que me permite reparar mais facilmente nas suas próprias fraquezas.

O que me leva ao primeiro ponto. A Susan tem realmente algumas fraquezas aqui, mas imagino que nada que ela não possa melhorar ao longo do tempo. Às vezes o livro parecia avançar aos solavancos, creio que porque as transições entre cenas e capítulos não eram suaves, o que pode ser trabalhado. Acho que aqui posso apontar o dedo ao editor, que tinha obrigação de ajudar a aprimorar este tipo de coisa. E ela trabalha bem a maior parte das relações entre personagens, mas há uma que eu queria que ela tivesse explorado melhor. (Mais sobre isso virá mais à frente.)

Ok, passemos às coisas fixes. Este é um livro que se passa em Philadelphia, nos EUA, no fim do século XIX. O cenário é exactamente como uma cidade americana com sensibilidades vitorianas devia ser... excepto pelos zombies. Ou melhor, os mortos-vivos que se estão a levantar da campa para passear por aí.

Eleanor Fitt é a heroína e protagonista. Tudo o que ela quer é encontrar o irmão, que já deveria ter vindo para casa, mas na sua busca vê-se envolvida no plano tenebroso de alguém para trazer de volta à vida os mortos. Pelo meio, ela tenta manter a compostura de uma menina da classe média-alta que procura casamento para salvar a família em ruínas

Coisa fixe número um: o cenário e worldbuilding. Que sítio mais engraçado para os mortos saírem das campas que é o século XIX. Toda a gente parece vê-los como uma incoveniência, algo sem mérito para discutir. Que sensibilidade mais vitoriana. O sistema de "magia", como os mortos voltam, como alguém tem poderes e capacidades e interage com eles... fascinante. (Quero saber o papel da Eleanor no meio disto tudo.)

Contudo, gostava de saber mais. A falta de reacção (de pânico) das pessoas dá a sensação que a opinião pública está ciente que mortos a sair de campas é uma coisa que acontece. Mas não conhecem realmente o perigo. É quase como se fosse uma curiosidade científica bizarra.

Coisa fixe número dois: a Eleanor. Que saudável desrespeito pelas convenções. Ela bem tenta ser uma menina bem comportada, ajudar a mãe, mas quando isso se mete no meio da sua missão, lá vai a cautela às urtigas. Não hesita em fazer o que é necessário, como abordar os Spirit Hunters, para ajudar o irmão. E quando eles são pouco prestáveis, ela continua a insistir até lhes chamar a atenção. Um bando de mortos não a trava, e rapidamente está a ajudar os Spirit Hunters a distribuir porrada em zombies com sombrinhas. Muito bom.

Coisa fixe número três: os Spirit Hunters. O Joseph é adorável, um cavalheiro, muito crente nas suas capacidades e missão, por mais que não acreditem nele. A Jie é totalmente a guerreira do grupo, ela está sempre a dar porrada a mortos quando os outros estão a fazer outras coisas, é espantoso. E o Daniel é tão engraçado, resmungão, com aquelas sensibilidades de classe trabalhadora, sempre pronto a ficar ofendido com qualquer coisa que a Eleanor lhe diga.

Sobre os Spirit Hunters, tenho a dizer que há uns tempos, antes sequer de ter o livro, fui spoilada para o fim de um deles. É interessante ler sabendo essa coisa que eu sei. Torna tudo um pouco mais amargo, mas ao mesmo tempo é excitante saber como as coisas vão parar aí.

E ainda sobre o Daniel, adorei as implicações dele e da Eleanor. É mais divertido porque ele acha que ela é uma menina rica aborrecida, o que não tem nada a ver: nem ela tem dinheiro, e está mesmo a um passo de ir para a rua, quanto mais ser vápida e fútil. Eu até me ria cada vez que ele lhe chamava Empress.

No entanto, acho que a Susan podia ter espremido mais a coisa: a certo ponto, parecia que eles já estavam embeiçados um pelo outro e ainda só se tinham cruzado um par de vezes, nas quais o Daniel tinha-se portado como um urso sem maneiras. Não houve momentos mais significativos de ligação, e eu precisava disso. Precisas de me vender o peixe, Susan, para eu acreditar nestes dois como casal, e faltou ali qualquer coisinha mais no início do livro.

A parte final do livro é tremendamente excitante, graças ao enredo embalar bem na segunda parte do livro, e adorei seguir os dois pontos altos na Exibição e no cemitério. Foi das poucas vezes que vi dois clímaxes resultar numa história. Creio que já tinha adivinhado as duas maiores revelações, mas foi interessante ver a coisa desenrolar-se.

Gosto muito que esta parte final tinha consequências, a fasquia alta, que os nossos personagens não se safem assim tão facilmente. A vitória é conquistada duramente, e o final é algo agridoce e melancólico. É a promessa de mais coisas e melhores, possivelmente, mas também o reconhecimento que não há voltar atrás. Terminou com chave de ouro e deixou-me mesmo curiosa para continuar.

Páginas: 400

Editora: Harper Teen (HarperCollins)

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Viagem à Procura de Mim, David Arnold


Opinião: Não precisei de muitas páginas lidas para perceber duas coisas: uma, eu e a Mim, e eu e o David Arnold? Não íamos ser os melhores amigos. Duas, detesto aquelas comparações da caca coladas nas capas, contudo neste caso, a comparação com o John Green é certeira, e não o digo de forma lisonjeira para o autor deste livro.

Sobre a primeira conclusão: eu gosto muito de personagens ruins. Eu adoro quando os personagens são maus, e fazem coisas horríveis. Porque mesmo quando eles são assim, desde que o autor seja bom na caracterização e em manter-me envolvida, eu estou ali, com o personagem, a viver o que ele vive, mesmo que não fizesse o que ele/ela faz.

Eu preciso de respeitar esse personagem, e para isso acontecer, a caracterização tem de ser boa. Minimamente boa, para me fazer compreender porque age assim. A caracterização tem de fazer sentido. Não tenho de gostar, mas tem de fazer sentido.

A Mim, no entanto... não parece uma pessoa real. Parece apenas um boneco a quem as coisas acontecem. Não tem personalidade (e não, atribuir-lhe pequenas idiossincrasias estranhas e fantásticas e únicas não conta), não tem um pensamento próprio (não, David, usares a personagem para despejar os teus pensamentos sobre o assunto não conta, tens de me fazer acreditar que ela pensa assim), tudo o que ela faz parece mandatado pelo autor, como se ela fosse uma marioneta. Não como uma pessoa de verdade.

Além disso, a Mim é horrível. E o problema dela não é que tem uma doença mental, ou que tem a maior crise de adolescente da história. Com isso eu podia lidar bem. É por isso que leio tanta coisa no género YA, divirto-me a ler sobre esta época turbulenta das nossas vidas. Não, a Mim é simplesmente estúpida. E isto é um insulto para os estúpidos. Porque é muito, muito pior. Ela não é ignorante, porque esses podem aprender. Não, ela faz burrices só porque sim.

Temos aquela vez em que conta que olhou para um eclipse porque sim, porque os professores lhe disseram que não devia fazer. Ela tinha 14 anos. Eu esperaria este tipo de comportamento dum puto de, sei lá, 5, 10 anos? Dum adolescente não. Dou-lhes mais crédito que isso. Oh, os adolescentes adoram contrariar os que os rodeiam. Mas não iam fazer algo tão parvo que à partida deviam saber que lhes ia fazer mal.

Ou temos aquela em que ela joga cartas de papel para uma sanita de uma casa de banho de autocarro, e puxa o autoclismo. E aquilo explode em... merda. Até chorei com esta. Parece senso comum, não é, não fazê-lo? Aparentemente, é o tipo de coisa que o autor acha que um adolescente faria. (E não me ponham a falar da birra enorme que ela faz e que a coloca nesta viagem. Sou capaz de estar aqui toda a noite.)

E sim, é por este género de coisas que eu não respeito a Mim, ou o David Arnold. Os adolescentes podem fazer muitas asneiras, mas não são seres descontrolados e desmiolados e com falta de senso comum. Que o autor me tente convencer do contrário é que me choca. Ugh.

Dedicando-me agora à minha segunda conclusão sobre o livro? A sério, pá. O John Green aparece e escreve uns livros e vende uns livros, e de repente toda a gente acha que tem de escrever como ele e criar histórias como as dele.

Sim, as histórias do John Green são ligeiramente pretensiosas e têm personagens preciosos e únicos e que soam por vezes a alguém do dobro da idade deles. Mas isso é mais credível para mim (ei, adolescência não é antónimo de maturidade), e além disso, emocionalmente ele acerta nas notas certas (nunca me esquecerei da cena de luto do À Procura de Alaska, com um ginásio cheio de gente de 15-18 anos a enlouquecer... ou a maneira como ele me fez compreender a posição dos pais da Hazel no A Culpa é das Estrelas).

O problema é que depois aparecem-me estes John Green-wannabes. Não chega criar adolescentes com uma crise que parece de meia-idade, com problemas e visões únicas (se ainda não deu para perceber, eu uso a palavra "único" num sentido pejorativo nesta opinião) do mundo, e com opiniões mais completas sobre certas coisas que gente com o dobro da idade deles.

Lamento muito, mas para um livro ser credível, tem de ter emoção. Tem de conseguir cativar a leitora deste lado, fazer-me relacionar com as peripécias que estão a acontecer. Não pode ter uma protagonista que parece uma marioneta. Não pode ser bi-dimensional. Não pode ser uma plataforma para o autor despejar o que pensa e acha de certos assuntos.

Porque foi isso que eu senti com o livro. Que a história estava a ser contada não porque precisava de ser contada, mas porque era um veículo para o autor deitar cá para fora certas coisas, exorcizá-las. Pode fazer dele um livro, mas não um livro publicável.

Senti que o enredo estava a correr só porque sim. Porque o autor precisava que esta coisa A acontecesse à Mim, e depois esta coisa B, e depois mais a C... parecia tudo uma questão de conveniência, um desenho para colorir já com indicação das cores a meter em cada espaço, sem o autor se dar liberdade para pintar fora do traço, escolher as cores que queria.

Parecia que estava a escrever porque achava que era o que ia vender. Parecia que estava a seguir o "modelo Green", em vez de criar e escrever o seu próprio modelo. A certa altura a Mim conhece um miúdo com trissomia 21, e ele era tão adorável e doce... mas parecia tanto um plot device. Uma coisa ali metida para fazer avançar a narrativa, e mostrar quão fixe é a Mim. Parece-me errado usá-lo desta maneira.

E por isso, a narrativa (e os personagens) soou tão estéril e artificial. Sem vida. Não conseguiu envolver-me, não conseguiu fazer-me crer nos personagens, viver a sua vida por um instante. Não conseguiu fazer-me entrar nela própria, viver as suas emoções e reviravoltas. Um bom autor teria conseguido fazê-lo. Depois disto, não acredito que o David Arnold seja um bom autor.

Ou um bom autor para mim, suponho. Tanta gente gostou, e por isso acredito que vá encontrar mais leitores por aí, incluíndo cá em Portugal. Mas comigo não contem mais para me meter em buracos destes. (Oh, quem estou a tentar enganar? Eu acabarei por me voltar a meter nestes buracos, nem que seja porque fico contente ao ver as editoras a publicar este tipo de coisas. Mas podem crer que não fico contente com este exemplo em particular, ou com o tempo e dinheiro que gastei nele.)

P.S.: e eu que até gostava do título em português, porque tem um trocadilho com a alcunha da protagonista. E a capa também é muito gira. É claro que não ter achado grande coisa do conteúdo borra-me a pintura toda...

Título original: Mosquitoland (2015)

Páginas: 272

Editora: Topseller

Tradução: Susana Serrão

sábado, 16 de julho de 2016

A Torre de Espinhos, Juliet Marillier


Opinião: Não consigo deixar de suspirar profundamente de impaciência. Por um lado porque agora vai passar um bom bocado até eu conseguir ler o terceiro livro - e de qualquer modo a sinopse desse faz-me pensar que a Blackthorn e o Grim vão estar separados durante um bom bocado, o que não me deixa feliz -; e por outro, estes dois são! tão! lentos! e! obtusos! Grrr. (Já volto a este assunto.)

Voltando ao início, que era onde eu devia começar. A Blackthorn e o Grim estão a acomodar-se ao seu lugar entre as pessoas na casa do príncipe Oren, só que, claro, isso não dura muito tempo. Primeiro porque o príncipe vai assumir o lugar de liderança do reino durante uma ausência do pai, e como Lady Flidais está grávida, Blackthorn sente-se na obrigação de acompanhar (a resmungar a cada passo do caminho, mas isso é típico dela).

Entretanto, uma nobre, Lady Geiléis, vem pedir ajuda à corte, pois tem um dilema: as suas terras estão amaldiçoadas, e durante o Verão um monstro encerrado numa torre das suas terras grita sem descanso, endoidecendo os que vivem por ali. Com uns empurrõezinhos, a Blackthorn acaba a aceitar tentar ajudar, e o Grim, claro, vai atrás.

E pronto, esse é o mistério no centro da história, o mistério da Torre de Espinhos, da maldição que nela se centra, e como poderá ser quebrada. Não é muito difícil adivinhar os quês e porquês da maldição, mas a piada está mesmo em ver a história desenrolar-se.

Digo isto porque a Juliet consegue tecer uma história digna de um conto de fadas, no que toca à maldição e ao par que mais foi afectado por ela; há pedacinhos de A Bela Adormecida, e A Bela e o Monstro, e As Mil e Uma Noites, até, e provavelmente mais coisas que não me estou a lembrar agora, no cerne da maldição, e é fascinante de a acompanhar.

É também de partir o coração, digamos. Sem estragar a maneira como as coisas decorrem, perturba-me saber que os apaixonados foram amaldiçoados sem fazerem propriamente algum mal, sem provocarem um féerico, apesar de um féerico realmente se ter sentido provocado pela ligação deles. Mas parece tudo... maldade demais? E entristece-me saber da não-vida vivida por aqueles que os seguiam, e o fim que tiveram.

Há uma pequena parte de malícia e maldade na maneira como tentam quebrar a maldição, mas não lhes posso apontar o dedo. Suspeito que ao fim de tanto tempo, qualquer um estaria desesperado para acabar o sofrimento, à conta fosse do que (ou quem) fosse. Foi um dilema e um mistério bastante mais profundo e complexo que se apresentou ao par de protagonistas deste livro. (Comparando com o primeiro, quero dizer.)

Sobre os protagonistas. Hmmm. Primeiro a Blackthorn. Eu gosto muito de protagonistas rezingonas. Divirto-me imenso com elas. Gosto bastante de como a Juliet a retrata, porque o tipo de trauma que ela carrega é impossível de curar, e gosto de ver como ela vive com isso, e as estratégias que encontrou para lidar com o mundo. É inteligente, faz as perguntas certas, preocupa-se, apesar de fingir que não.

Contudo... já diz o ditado, o pior cego é o que não quer ver. Em muitos sentidos. A), minha amiga, não era óbvio o que se estava a passar ali, e porque é que continuas a deixar-te levar pela tua ânsia de justiça/vingança, quando é óbvio que isso não vai correr bem, quando não te deixas pensar no que estás a fazer? B), que raios é que te possui para deixar de fazer perguntas, quando devias estar a fazê-las, mesmo no fim? Cobarde. Grrr.

Já o Grim? Pobre coisinha. Já era expectável que a história dele fosse assim tão trágica, e bem... uau. A Juliet é mesmo má com os personagens dela. E ele tem esta personalidade que carrega o mundo às costas, e deprecia-se constantemente. E isso também é tão triste.

Toda a gente que o conhece descarta-o como um bronco burro, e isso está tão longe da realidade... ele tem uma intuição e uma pureza de espírito que é impressionante. É simples no trato, mas isso está longe de ser ignorância. E o sentido de lealdade dele ainda vai ser ou a sua salvação ou a sua perdição, no entanto é o que salva o esquema todo aqui, e por isso é, e vai ser, muito importante.

Parto para o terceiro livro muito curiosa. É suposto ser o último livro da trilogia, mas a Juliet tem planos para escrever mais, se os editores dela a contratarem para isso, e por isso o livro tem de ser aberto e fechado o suficiente para isso. Há uma série de coisas a merecer um avanço, e sinto que a entidade féerica responsável pela maldição pode aparecer outra vez, e gostava mesmo de ver isso concretizar-se. Espero mesmo que isto se venha a tornar mais que uma trilogia, porque há história para muito mais.

Título original: Tower of Thorns (2015)

Páginas: 408

Editora: Planeta

Tradução: Catarina F. Almeida

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Curtas: Graphic Novels da Marvel, vols. 11 a 14

Novos Vingadores: Evasão, Brian Michael Bendis, David Finch
Hmmm. Isto até é interessante. Depois de um evento que levou ao término dos Vingadores como equipa, uma série de indivíduos com poderes acaba a lutar em conjunto numa ilha-prisão em que há uma fuga; a formação de uma nova equipa de Vingadores perfila-se no horizonte com os eventos da história.

Achei a história muito interessante pelos seus elementos, a maneira como a equipa se junta (pobre Homem-Aranha, finalmente nos Vingadores, e não há remuneração para o azarado), mas também porque o ritmo de enredo é muito envolvente, tudo se desenrola como um misto de um filme de acção e mistério, e gostei bastante de seguir a evolução da narrativa.

Como disse, gostei bastante dos elementos introduzidos na história, de coisas do universo Marvel que foram trazidas para aqui; contudo, não sou fã do final do volume, fica muito em aberto. O que faz sentido se considerarmos a natureza episódica da história, mas para quem lê em livro é algo desconcertante.

Quarteto Fantástico: Além da Imaginação, Mark Waid, Mike Wieringo, Casey Jones
Outro volume bastante bem escolhido para esta colecção, creio eu. Gostei mesmo de como o Quarteto foi apresentado. Normalmente não costumo ler muito estes personagens, e não tem havido nada que me atraísse para eles; mas este volume consegue-o, creio eu.

O que me atraiu na história é esta mistura de drama e momentos de fasquia alta, de unidade familiar e resistência à adversidade, de exploração e aventura. Fez-me entender melhor o que os fãs vêm neste conjunto de personagens.

Os dois capítulos finais mostram o pós, o que acontece depois de uma aventura tão traumática para a família. E é de partir o coração. O personagem no centro é o Franklin, aquele que mais obviamente sofreu com os acontecimentos da narrativa, mas é possível ver como todos estão abalados. É um pedacinho da história mais calmo, mais focado no desenvolvimento dos personagens, e foi uma delícia de ler.

Ultimate Homem-Aranha: Poder e Responsabilidade, Brian Michael Bendis, Mark Bagley
Esta é uma história que já conhecia. Coleccionei os números isolados que foram saindo com um jornal há anos, até ao número 20 do Homem-Aranha versão Ultimate.

Há que reconhecer, a história é muito boa a pegar nos temas e fios narrativos do original, e adaptá-los a um mundo moderno. E os pequenos detalhes são bem giros de observar. Dá a sensação que estes são mesmo miúdos do século XXI (bem, talvez com alguns ligeiríssimos exageros, mas aceitáveis).

Narrativamente, a história corre muito bem, bastante interessante, e gosto de ver este Peter a lidar com os dilemas normais da adolescência, no meio do drama que deriva de lidar com os seus novos poderes. Há um humor e uma dinâmica que me agradam na narrativa.

A minha queixa prende-se com o facto de que tudo isto já está... batido? Seria mais interessante para mim dantes. Agora já lidei com um milhão de histórias de origem para o personagem, e começo a ficar aborrecida. Há uma série de coisas giras para fazer com o Peter para além disso.

Marvel Zombies, Robert Kirkman, Sean Phillips
Beeeem, seria de esperar que uma premissa tão fixe e intrigante resultasse numa história igualmente fascinante. A realidade? Eh, nem por isso. Zombies no mundo Marvel é brilhante, ver os nossos heróis a lidar com os problemas de serem zombies é perturbador, e não no bom sentido.

É que o livro deixou-me enjoada. E eu li um pedaço dele ao almoço, por isso não é enjoada de vomitar o almoço. É mais moralmente enjoada. Acho que nunca vou recuperar de ver estes personagens obcecados em comer os não-zombies que sobraram, incluíndo alguns dos seus antigos aliados, outros super-heróis.

Além disso, a noção de o mundo ter sido perdido para os zombies é algo traumatizante. Assim como a noção da refeição final que vemos no livro, e as suas consequências.

Tendo dito isto, a nível intelectual alguns elementos da história são positivamente intrigantes. A questão da fome constante, da necessidade de continuar a alimentar o monstro, e ainda assim manter o intelecto e as capacidades que se tinha. Um dilema interessante, e com momentos engraçados. (Again, o Homem-Aranha. Convenhamos, é sempre o Aranha a dar piada às coisas.)

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Fangirl, Rainbow Rowell


Opinião: Acho que nesta releitura vou remeter para a minha opinião original, porque essencialmente tudo o que disse ali, ainda se aplica. Continuo a gostar daquilo que gostei, o que o livro me disse na altura ainda é capaz de mo dizer agora.

Não é um sinal de estagnação, mas sim um sinal de um favorito, fixo no céu como uma estrela, sempre pronto a oferecer conforto quando dele precisamos. Gosto bastante do que a Rainbow faz nos seus livros e este é especial entre eles.

Quero só acrescentar algumas considerações acerca de traduções, que esta em particular me suscitou. Tenho pena que a maior parte dos tradutores em Portugal traduza (assim mo tem parecido até agora) o que tem à frente sem olhar ao contexto, sem consideração pelo conteúdo do texto que tem à frente. Tomando o contexto, as coisas não seriam traduzidas literalmente, e creio que muitos dos erros de tradução partem daqui.

Outra coisa que me desaponta é a tradução sem uma noção de conhecimento sobre a sociedade que é explorada no livro traduzido. Ninguém pensaria em traduzir o Anna Karenina do russo sem entender a sociedade russa do século XIX; mas pelos vistos qualquer um pode traduzir livros do inglês com o mínimo esforço. *suspiro*

Nem sequer é que as pessoas façam exactamente um mau trabalho, em si, mas... sei lá, tenho alergia a falta de empenho e/ou brio no trabalho que se faz. O exemplo deste livro nem sequer é dos melhores, porque na sua maioria, não tive razões de queixa, e faz um bom trabalho. Mas tem duas ou três ocasiões que me levaram a estas considerações acima, que nem sequer são bem sobre este livro em si, são sobre o panorama geral em Portugal - e no entanto, o livro faz indubitavelmente parte dele.

Uma, durante uma conversa entre a Reagan e a Cath, a primeira pergunta algo do género "sois gémeas verdadeiras?" Er, não, não e não. Ninguém desta idade e geração usa esta forma verbal. E realmente ela não é usada durante o resto do livro. Estou pronta a aceitar que seja um problema que não foi corrigido na revisão. (Que é um problema em si em Portugal, mas enfim...)

Dois, "repas"? Er, há algum problema com a palavra "franja"? Eu sei que é usado no contexto da aparência de um rapaz, mas parece-me que podemos dizer que um rapaz tem franja. Em alternativa, farripas de cabelo era mais adequado, mas enfim. Faz comichão quando se metem a usar termos semi-obscuros (ao menos nunca me vou esquecer da Parúsia por causa disso) só porque sim, e não sem uma boa razão para tal.

Três, há por ali uma expressão que diz algo como "um corpete seco". Oh, céus. Esta até me dá vontade de chorar. O original tem a palavra "corsage", que é um ramo de flores, especificamente um usado nos bailes de finalistas americanos pelas raparigas. Pois. Corsage, não corset. Um corpete seco não faz sentido algum, mas um ramo de flores seco já faz. Daí os meus comentários sobre entender algo da cultura que se está a traduzir.

E pronto, como eu disse no todo a tradução é bastante decente, mas basta eu apanhar duas ou três destas, para ficar frustrada. Fico especialmente frustrada porque o resto até é um bom trabalho. E portanto, leva por tabela, ainda mais quando a frustração se vai acumulando ao longo de vários livros anteriores.

Acaba por ser por estas coisinhas que eu acabo a ler mais em inglês. Não consigo desligar a leitora em inglês quando leio em português, e por isso na maior parte dos casos prefiro não ter alguém a intermediar a minha compreensão do texto, especialmente se é para me dificultarem a vida. Venha o próximo e que não me complique tanto a leitura.

Título original: Fangirl (2013)

Páginas: 448

Editora: Chá das Cinco (Saída de Emergência)

Tradução: João Seixas

segunda-feira, 4 de julho de 2016

The Winner's Kiss, Marie Rutkoski


Opinião: Fui reler as minhas opiniões dos livros anteriores. Ai mãezinha. Posso dizer que o início da opinião do segundo ainda se aplica. Esta autora, esta série, deixam-me profundamente ansiosa. Não sei como, mas ao longo de dois livros inteiros ela conseguiu torturar os dois protagonistas (e a mim) de tal maneira que toda eu sou um pudim tremelão só com a noção de ter de chegar com esta série ao fim e (potencialmente) sofrer (ainda) mais pelo caminho.

Bem... tinha razão e não tinha razão ao ficar preocupada. Não com a capacidade excelente da Marie para a intriga, e para me galvanizar a alma com uma prosa fabulosa. Tinha razão para ficar preocupada com o meu potencial sofrimento. Mas não tinha razão no sentido em que a Marie me levou por um caminho inusitado, e que me deu tudo o que eu não sabia que queria. Portanto, eu... sofri, mas fiquei feliz por isso, suponho que posso dizer.

Ok, no final do livro anterior a Kestrel tinha ficado num lugar mau, digamos assim. Essa situação tem seguimento, e oh raios, um pouco do que estava à espera, mas também muito que não estava. A minha querissíma Kestrel... o espírito dela é quebrado, o que é assustador, porque se há coisa que ela fez ao longo deste tempo todo, foi não desistir.

Depois a história dela evolui para um terreno... curioso, mas estranhamente, gostei. Deu-lhe uma tábua rasa com que trabalhar (a ela e ao Arin), e provavelmente era o que precisava. Aliás, o enredo todo evolui no sentido de lhe dar mais liberdade para trabalhar, e gostei muito de ver isso. De ver a Kestrel a fazer o que sabe fazer melhor, sem constrangimentos nesse sentido.

Quanto ao Arin... bem. Ao longo da série tenho tido uma certa dificuldade em gostar tanto do Arin como gosto da Kestrel. Ele é tão... sem noção às vezes. Enquanto que a Kestrel usa todas as ferramentas ao seu dispor para tomar decisões, seja a mente estratega que tem, as suas emoções, ou o seu sexto sentido, já o Arin... eh, ele até tem sexto sentido. E até tira boas conclusões com ele. Mas depois foge na direcção contrária, porque duvida de si próprio, e está muito decidido a detestar-se e à Kestrel pelo que aconteceu. E fica cego a certas coisas

É claro que eu tinha pedido que ele sofresse muito, e sofre, na verdade, com a culpa de ver o mal que fez à Kestrel a esmurrá-lo finalmente no nariz. É bem feito. Para ele. Para a Kestrel não é nada bem bem feito. Enfim, pondo isto de parte até acabei a gostar do percurso do Arin, porque a relação dele com a sua cultura e com os seus deuses, e com o que faz e tem de fazer para atingir os seus objectivos, é muito interessante.

No que toca a estes dois juntos, repito o que disse ali em cima acerca da Kestrel, porque se aplica. A situação inusitada em que se encontram faz com que haja uma curiosa combinação de familiaridade e novidade na relação deles, e achei fascinante explorar isso. Porque depois de tudo o que aconteceu, não basta gostar. Têm que se rehabituar um ao outro, reencontrar e reencaixar, digamos. Toda a situação foi tão inesperada que fiquei surpreendida por gostar, mas a Marie fez algo que nunca pensaria que eu quereria.

Não posso deixar de mencionar o Roshar, coisinha preciosa que ele é, com tudo o que lhe sai da boca a ser absolutamente delicioso e hilariante. (Ele e o Sturmhond da Leigh Bardugo podiam fazer um clube, e seriam um arraso.) Gosto tanto dele, e acho tão interessante que ele se desarme a si próprio, causando às pessoas uma sensação de que é mais inofensivo do que provavelmente é. São estas pessoas que passam despercebidas e acabam a surpreender tudo e todos com a profundidade do que lhes vai na cabeça.

A escrita da Marie, já disse, cai-me mesmo no goto, é tão bonita, e mesmo emocional, faz-me viver e vibrar com o que está a acontecer. E o enredo corre mesmo bem, houve tempo para (quase) tudo, o que precisava de ser resolvido, foi, sem fechar tudo de modo bonitinho. Lá porque se chegou a um ponto que se queria atingir, não quer dizer que seja tudo perfeitinho. Prefiro assim. A vida nunca é inteiramente resolvida.

Usei ali aquele "quase" entre parêntesis porque há coisas que eu gostava de ter visto mais exploradas. Vimos tão pouco do Verex, e teria apreciado conhecer e ver mais das irmãs do Roshar, porque aquela família é de estouro. Também achei que as coisas se resolveram tão depressa no fim. Não é que não fizesse sentido. Faz muito, e adorei a solução que foi dada. Só que depois de tanto nervosismo não estava preparada para que acabasse tudo. Oh, e a situação com o pai da Kestrel? Apreciei que ficasse no pé em que ficou. Nem sempre as coisas são como nós queremos, por vezes as pessoas mais próximas desiludem-nos e não há nada a fazer para o resolver.

E pronto, acabou. Mal consigo acreditar. O que é que eu vou fazer agora à minha vida? O que é que a Marie vai escrever a seguir? Estou positivamente saltitando de curiosidade. Ou de vontade de voltar a ser torturada emocionalmente. Er, as duas coisas, na verdade.

P.S.: A editora tencionava mudar as capas para este terceiro livro. Mesmo no hardcover, que é a edição que eu tenho, e quanto é que eu gosto que me mudem as capas a meio duma série? NADA. E ainda menos quando faltava só um livro. Mas no Twitter, depois de serem reveladas, houve uma indignação e chinfrim tal que acho que fizeram os editores recuar.

E ainda bem. Que as capas novas e altamente genéricas e não tão bonitas assim como eles acham que são fiquem para os paperbacks. Eu cá? Se há altura em que sou uma taradinha por vestidos bonitos, é esta.

Páginas: 496

Editora: Farrar Straus Giroux (MacMillan)