sábado, 12 de setembro de 2015

Eu Dou-te o Sol, Jandy Nelson


Opinião: Este é um livro sobre a vida. Sobre o luto e como destrói e reconstrói as pessoas. Sobre a arte como representação da vida e alimento para a alma. Sobre coincidências e sobre como a vida conspira para cruzar aqueles que estavam destinados a cruzar-se. Sobre amar e chegar aos píncaros, amar e sofrer, amar e sofrer.

Eu Dou-te o Sol conta a história de dois gémeos, Noah e Jude. Algo aconteceu há três anos que quase destruiu a sua família e os separou. E a narrativa divide-se então nos pontos de vista dos dois, o Noah há três anos, e a Jude no presente, levando o leitor a descobrir aos poucos o que os separou, as mentiras que construíram um muro entre os dois, e como isso os levou a fecharem-se em si mesmos, perdendo aquilo que adoravam fazer.

É definitivamente um livro singular. Devo dizer, para me livrar já disso, que a escrita é metafórica e lírica, quase como uma pintura, mas de vez em quando me pareceu ir longe demais nas comparações, de modo a fazer-me revirar os olhinhos. Deve ser preferência pessoal, porque por exemplo a E. Lockhart fazia o mesmo tipo de coisa no Quando Éramos Mentirosos, e eu adorei, e nunca tive dificuldade com a sua escrita.

Fora isso, foi uma leitura tão fascinante. Há este acontecimento, e a Jude e o Noah não tiveram oportunidade de terminar essa relação num ponto alto, e sendo jovens, isso marcou-os. O arrependimento e a culpa e aquilo que ficou por dizer, para com essa pessoa, e entre ambos, sufoca-os no presente e impede-os de voltarem a ser os irmãos próximos que eram.

Gosto tanto da relação que este livro tem com o luto e as coincidências da vida. Nesse aspecto, lembra-me um pouco de Extremamamente Alto e Incrivelmente Perto - por também retratar alguém a tentar fazer sentido do luto, e por haver uma história por trás da história sobre o que realmente aconteceu - e de O Fabuloso Destino de Amélie - pelo seu sentido de serendipidade e pela atmosfera que quase é de realismo mágico.

Parte da piada da história foi ir construindo aos poucos o que havia acontecido no passado. No fim encaixa tudo duma maneira brutalmente perfeita, e foi tão engraçado de acompanhar. (Também quando toda a gente menos a Jude já sabia, e toda a gente ficou a olhar para ela com medo de que a bomba explodisse.)

Outro ponto de interesse é o modo como a arte é descrita, como algo vital e essencial para os personagens se exprimirem, uma forma de compreenderem o que os rodeia e fazerem as pazes com a vida, algo primitivo e que tem vida própria. É tão cativante.

Definitivamente gostei das pequenas idiossincrasias dos personagens e do enredo, pois isso é que lhes dá vida, e a caracterização é muito boa, nenhum personagem parece menos que uma pessoa viva em três dimensões, a respirar. Gostei de ver que tipo de pessoas eram os gémeos no passado e como os acontecimentos os mudaram, quase numa imagem espelhada de si próprios, do passado para o presente.

Por fim, gostaria de destacar as relações. As de amizade, as de família, que são tão importantes (achei muito interessante e importante ver como ambos os gémeos se relacionavam com o pai no antes e no depois), e as amorosas. O amor é mostrado como esta emoção viva, maravilhosa e destruidora, que informa a arte dos personagens, e é o amor (aqui quero dizer não só romântico) que os reúne no final.

O Noah e o Brian foram tão adoráveis de acompanhar, num retrato bastante credível e encantador de amor e desencontro quando um dos elementos não está propriamente preparado para sair do armário. E a Jude e o seu inglês, bem, foi tão divertido vê-la resistir a sair da casca, e o Oscar também tem o seu interesse, por ser um bad boy (quase) reformado.

No fim do dia, sei que não será uma história para toda a gente, ou pelo menos vejo como a escrita possa ser um obstáculo à leitura (a mim inicialmente foi, mas depois embalei e nem quis saber, estava demasiado enredada), mas penso que vale muito a pena dar-lhe uma oportunidade. Não há muitos livros que se sintam tão reais e tão próximos, ainda que mantendo os pés firmemente na ficção. Estou pelo menos curiosa para ver que mais a autora tem preparado.

P.S.: A capa é linda. Muito melhor que o original. Bravo, Presença. Raramente fico tão orgulhosa do trabalho gráfico por cá. É claro que tenho de questionar a tradução do título. O tempo verbal no presente soa tão artificial. Que há de errado com usar o futuro, como no original, "Dar-te-ei o Sol"? Há poucas ocasiões em que esta conjugação soaria bem, mas aqui gosto bastante dela.

Título original: I'll Give You the Sun (2014)

Páginas: 336

Editora: Presença

Tradução: Jorge Freire

10 comentários:

  1. Respostas
    1. You must. ;) É um pouco estranho ao início, mas tem tantas coisas giras, que se entranha. ^_^

      Eliminar
    2. Eu gosto de estranho :D

      E por falar nisso, look at this: https://www.goodreads.com/book/show/23310751-first-then
      ???

      Eliminar
    3. Good. Então pode ser que seja a tua praia. :D

      Acho que já tinha visto, a Presença deve ter comprado uma imagem do mesmo designer, não? :S São bastante parecidas.

      Eliminar
    4. Só pode, é o mesmo desenho arranjado de maneira ligeiramente diferente. De qualquer maneira é ene vezes melhor que a capa do I'll Give You the Sun dos pauzinhos/riscos às cores, parece publicidade à NOS xD

      Eliminar
    5. Loool, foi isso que pensei! "Que raios, o que é que a NOS anda aquii a fazer?"

      Eliminar
  2. Respostas
    1. É bem merecida, a curiosidade que suscita. ;) É um pouco singular, mas bastante recompensador. :D

      Eliminar
  3. Quero muitooo ler esse livro. Acho a nossa capa a mais bonita de todas.
    Beijo
    www.fofocas-literarias.blogspot.pt

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É linda, não é? Muito melhor que a original. Fiquei orgulhosa da nossa edição. :D

      Eliminar