Bem, isto foi certamente uma excelente oportunidade de aprendizagem.
E tenho positivamente montes de pensamentos acerca disto, mas está difícil escolher um e começar. Por onde é que começo? Bem, vamos pegar numa coisa simples, bonita e positiva:
A banda sonora é excelente. Não dou por mim a dizer muitas vezes isto acerca de filmes, porque ou não reparo (normalmente a parte sonora passa-me um pouco ao lado), ou o estilo musical não é a minha onda... mas neste caso, nada disso pesou.
Praticamente todas as músicas com letra usadas chamaram-me a atenção, destacaram-se de algum modo. (Estive tão perto de me abanar na cadeira quando o Without Me começou a passar. Eh.) Uma sensibilidade muito hip-hop, com algumas coisas mais "clássicas", mas funciona muito bem com o tom do filme. E sei lá, estou a ouvir agora as músicas duma ponta à outra e não há uma que eu deteste. Muito bem escolhidas. Apetece-me dar um abraço à pessoa responsável por elas e por ser o ponto alto do filme.
E pronto. Acho que diz alguma coisa quando a coisa a destacar dum filme é a banda sonora, não? Eu queria muito gostar disto. E há partes que gosto. O problema é que, yep, infelizmente toda a gente tinha razão. It's a bit of a mess. Gosto muito de ver estas coisas por mim própria, porque nem sempre concordo com a opinião geral... mas eu dei nas orelhas ao Batman v. Superman (BvS) por ser uma confusão pegada. Este também é uma confusão pegada, ainda que noutro calibre.
Aqui a diferença prende-se com o realizador, creio eu. Não consigo respeitar o Zack Snyder, apesar de ter gostado de filmes dele no passado, porque vi fazer as mesmas asneiras no Man of Steel e no BvS, e tenho a sensação que devia haver alguém por trás a controlar o storytelling dos filmes dele que não ele. Ou um devia ter um melhor editor. Qualquer coisa serve, desde que as suas histórias sejam melhor contadas.
Quanto ao David Ayer, eu vi o Fury. Eu gostei do Fury. Eu gostei do que ele fez com o filme e os personagens. O retrato de um grupo de pessoas completamente destruída pelas circunstâncias (guerra)? Muito bom. Acho que ele seria capaz de dar uma sensibilidade semelhante a este filme. Pegar num grupo de vilões, mostrar como as suas acções os separaram da sociedade dita "normal", mantendo o tom ligeiramente divertido e sarcástico? Suspeito que ele era capaz de o fazer. Matava por ver um director's cut em que ele tinha completo controlo criativo.
Porque suspeito que o problema aqui foi... demasiados cozinheiros a meter o bedelho, e com demasiada pressa para terminar o bolo. Li demasiadas notícias do meio a falar das restrições temporais para a produção do filme, e de como os executivos da DC andavam stressadinhos para que isto tivesse sucesso, para não achar que foi precisamente isso que deu cabo do filme.
Porque convenhamos, onde o filme falha, é precisamente na montagem da história. As transições entre cenas são más, saltam de forma abrupta... parece que ninguém se decidia quanto ao tom do filme, porque as "piadas" acabam por estar mal montadas e cair de pára-quedas nas cenas onde estão inseridas... a caracterização de personagens não é muito boa na maioria dos casos, porque a introdução deles é feita muito à pressa e saltamos logo para a acção...
É-me difícil não relacionar isto com os rumores de que a cadeira do editor foi ocupada por uma série de gente, e com a preocupação dos "executivos" em aumentar o tom divertido do filme porque as pessoas não tinham gostado do tom "escuro" do BvS. Gente, aprendam uma coisa. O problema não era o "tom escuro". Era mesmo a maneira como a história estava montada. E começo a achar que foram pegar numa coisa que estava perfeitamente boa (ou pelo menos melhor que o que vimos), e foram estragá-la. Credo. A incompetência de todo este processo deixa-me boquiaberta.
E o problema é mesmo esse, o pessoal da DC cinematográfica está demasiado desesperado para estabelecer um "universo cinemático" como o da Marvel para apreender e entender as lições que o percurso da Marvel oferece. E se fossem espertos, aprendiam com o que os outros foram descobrindo por tentativa e erro, e faziam melhor.
Lição número um: escolham realizadores adequados para o trabalho. Conheçam o seu perfil. O Thor teve o Kenneth Branagh, o Capitão America o Joe Johnston, os Guardiões da Galáxia o James Gunn, os Vingadores o Joss Whedon. Cada tipo de herói tem o seu perfil mais e menos destacado, cada filme pede um tom diferente. Obviamente que cada uma destas pessoas teria feito um trabalho muito diferente nos filmes uns dos outros.
Lição número dois: saibam o que querem da história. Planeiem a longo prazo. Andamos há tanto tempo a ouvir falar das várias "fases" do MCU, e até acredito que não esteja tudo planeado ao milímetro. Mas os executivos da Marvel sabem para onde vão, por mais vago que isso seja, e dirigem-se para lá, e constroem as sucessivas histórias para lá chegar. É como escrever um livro. Ou uma trilogia. Ou uma longa série de livros.
Lição número três: uma vez escolhido o realizador, dêem-lhe espaço e tempo para trabalhar. E POR AMOR DA SANTA NÃO METAM O BEDELHO. Credo. Parece que cada vez que um filme foi mais fraquinho ultimamente, acabo sempre a ouvir falar de executivos do estúdio a interferir demasiado com a história. E ninguém aprende esta, raios. Se acham que vocês fariam um melhor filme, porque diabos é que são dão ao trabalho de contratar um realizador, hã? Até poupavam dinheiro.
Ok, vamos sair da tangente "porque é que a Marvel está a fazer um melhor trabalho, IMO". Vamos tentar destacar coisas que eu gostei no filme.
Se eu franzir os olhos e fizer um ligeiro esforço de imaginação, eu até gosto do tom do filme e do que estava a tentar passar. Acho que se as circunstâncias fossem ideais teríamos aqui um novo Guardiães da Galáxia. Gosto da ideia dos vilões virarem heróis (era preciso desenvolver melhor as motivações deles para se envolverem), gosto da ideia de só eles serem capazes de o fazer.
Gosto da ideia de haver alguém implacável o suficiente para se lembrar de juntar uma equipa de vilões. Gosto do tom auto-depreciativo e sarcástico e da ideia de todos trabalharem mal uns com os outro até aprenderem a trabalhar bem uns com os outros.
O design tem francamente momentos muito bons no filme. Os símbolos estilizados que representam cada personagem (esta galeria is just lovely), as cenas de apresentação dos personagens (apesar de eu desejar um botão de pausa, porque não deu para ler aquilo tudo, nem de perto), a maior parte dos fatos de cada personagem (o unicórnio do Boomerang! o fato da Harley era divertido, e as tatuagens do Diablo bastante impressionantes), o design da Enchantress e do cúmplice dela, o design do Killer Croc.
Onde o design falha é no Joker. Oh, gente. O Joker tem uma aparência tão icónica e um estilo tão clássico. Era preciso mesmo "datar" o Joker desta versão fazendo-o parecer um gangsta? Ugh, aquelas correntes de ouro e as tatuagens. *facepalm* Onde é que aquilo grita Joker? Não grita. Podia viver com os dentes metálicos, que dão um ar assustador à boca dele sem ter de ir para o sempre presente sorriso desviado. Algumas das tatuagens podem ficar (o sorriso na mão sim; o "damaged" na testa não). O resto? Nop, nop, nop. O resto da roupa já faz um bom trabalho a apresentar e homenagear o Joker.
Em termos de elenco, não tenho queixas. Acho que tentaram fazer o melhor que podiam com o material que tinham. Muitos não têm espaço para respirar (o Slipknot é um desperdício de espaço, só aparece, sem ser apresentado, para lhe acontecer... aquilo). Alguns têm pequenos momentos engraçados ou giros que gostava de ver expandidos (o Killer Croc, o Boomerang, a Katana), e que provavelmente os actores mereciam mais cenas para evoluir o personagem.
Quem tem mais momentos para evoluir e apresentar o personagem, e bastante merecidamente (mas ainda assim partes da caracterização podiam estar melhores), são a Harley Quinn (gostei da personalidade dela, e gostava que a Margot tivesse mais tempo de antena com ela...), o Deadshot (o pessoal não leva o Will Smith a sério, mas o homem dedica-se de corpo e alma aos personagens dele, e não precisa de mandar coisas estranhas aos colegas para fazê-lo), o Diablo (história pessoal bastante interessante, e o que descobrimos dele no clímax da acção é superintrigante), e a Amanda Waller (vá, toda a gente em coro, a Viola Davis é a nossa rainha, seja o que for que ela faça).
Não tenho realmente comentários a fazer para a Enchantress e o Rick Flag, curiosamente. A história deles acaba por ser central à narrativa, mas não gostei de como foi apresentada nos flashbacks, não há peso emocional, e tendo em conta os seus contornos, eles (o pessoal que fez o filme) deviam ter feito a sua história mais detalhada, deviam ter-nos feito preocupar com o que lhes acontecia.
Tenho a certeza que tenho mais pensamentos acerca disto, mas agora não me ocorre mais nada (aposto que cinco minutos depois de clicar em "publicar" me vou arrepender de não ter falado de A, B, ou C), e isto já vai suficientemente longo, por isso vou ficar por aqui.
O que fica deste filme é isto: eu gosto, em teoria, do que podia ter sido, mas não consigo ignorar o que é, e tenho as minhas críticas ao que é. Diverti-me em partes, mas estive sempre ciente das suas falhas, o que não devia acontecer com um filme. E espero sinceramente que a DC aprenda com os erros e melhore, porque tem uma série de personagens fixes à espera do seu lugar no grande ecrã, e seria triste deitar tudo a perder. E por amor da santa, não me lixem a Mulher Maravilha. Nunca mais vão conseguir fazer nada se lixarem a WW.