sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Scarlet, A.C. Gaughen


Opinião: Estou muito zangada comigo neste momento. Sabem desde quando é que tenho este livro adicionado na wishlist que tenho no Goodreads? Setembro de 2011. Dois longos anos e quatro longos meses. Tempo perdido em que eu não li esta pérola. Porquê? Porquê? Não sei. A única coisa boa disto tudo é que a sequela está prestes a ser publicada, e por isso não terei de desesperar por ela.

Scarlet pega na lenda do Robin dos Bosques e reconta-a do ponto de vista de Scarlet, ou Will Scarlet, como é conhecida entre as gentes de Nottingham. Sim, porque aquele que aparentemente é mais um rapaz do bando, é na verdade uma rapariga vestida de rapaz. A nossa titular Scarlet.

E como eu adorei esta protagonista. Teimosa, muito corajosa, terrivelmente leal, mais optimista do que aparenta, com uma fé inabalável no trabalho que o bando faz em Notthinghamshire, resmungona, feroz e com um feitiozinho terrível, mas com umas observações certeiras e por vezes hilariantes sobre os rapazes que a rodeiam. Foi muito claro desde o início para mim que a Scarlet carregava o peso de uma tragédia e que isso a assombrava indelevelmente. E pesou-me o coração de compaixão pelo que ela carregava, pois levava-a a fazer coisas tão tolas como resmungar com toda a gente num raio de dois quilómetros para tentar manter todos afastados. O que não resultava, felizmente. Todos os rapazes do bando adoram-na e respeitam-na, e são tão protectores com ela quando se magoa, ao mesmo tempo que a aceitam e tratam como uma igual.

Uma das partes mais divertidas do livro é mesmo a relação da Scarlet com os rapazes do bando. Com o Much é uma amizade mais discreta e que inverte a dinâmica que a Scarlet tem com os outros rapazes, pois é a Scarlet que se sente protectora em relação a ele. É muito giro quando ela finalmente encontra a arma que se adequa ao Much, porque é uma questão importante para ele, sentir-se útil para o bando e capaz de se defender. Com o John... é um bocadinho complicado. O rapaz gosta de namoriscar com todas as moças que lhe passam à frente, incluindo a Scarlet, só que a coisa não resulta muito bem. A Scarlet, é bastante claro, não está interessada (passa a vida a pensar noutra pessoa), e diz-lhe isso com todas as letras, mas o John acha que pode vir a convencê-la a mudar de ideias. Até teria pena dele, se não fosse uma sua atitude mais egoísta lá para o fim do livro. Tenho de reconhecer, a autora é óptima a caracterizar personagens e apresentar as suas motivações, e eu compreendo porque é que o John reagiu assim nessa cena, mas continuo zangada com ele. Bem, ao menos foi honesto acerca dos seus motivos. E gosto que o John seja o personagem que diz as coisas difíceis... mas ainda me apetece bater-lhe.

Com o Robin... bem, que tortura. É outro a quem me apetece bater-lhe um bocadinho. Alguém no livro comenta que ele e a Scarlet são demasiado parecidos (por isso é que são perfeitos um para o outro), e não podia ser mais verdadeiro. Sempre preocupados em ajudar o próximo, e generosos ao ponto da auto-negação. No caso do Robin, ele está sempre preocupado em proteger a Scarlet, mas não lhe passa pela cabecinha abrir a boca e, sei lá, declarar-se. Ou dizer qualquer coisa. É preciso uma situação de vida ou morte para lhe dar para ser honesto. (E a Scarlet lembra-o do péssimo timing que tem, abençoada rapariga, porque é um momento hilariante numa cena altamente emocional.) É muito divertido perceber ao longo da história esta tensão que existe entre ambos, mas também algo frustrante. Enfim... o Robin também tem os seus demónios, e sinto que apenas começámos a escavar a superfície do icebergue, porque ele se mantém algo impenetrável ao longo da narrativa. Estou curiosa para ver a sua evolução no segundo livro.

Adorei a escrita. A narrativa é na primeira pessoa, e a autora usa alguns termos mais arcaicos e alguns assassinatos gramaticais na fala da Scarlet, mas é muito adequado à personagem, e não tive problemas nenhuns em perceber o que ela estava a dizer. Além disso, a perspectiva da Scarlet é muito pragmática e em certos pontos hilariante, especialmente nas observações que faz acerca dos rapazes e do que é viver entre rapazes, sendo uma rapariga. Aliás, a história tem um certo pendor feminista, surpreendentemente. O cenário é medieval, mas ninguém no bando questiona, muito acertadamente, a capacidade da Scarlet de cuidar de si própria e de se defender. A autora examina os vários papéis que uma mulher podia tomar neste tipo de sociedade, e as escolhas que podia fazer, mas ao mesmo tempo subverte-as com o papel da Scarlet. É engraçado, porque a lenda do Robin dos Bosques é em si algo desafiadora das convenções e do status quo, por isso gosto que a autora tenha aplicado isso à Scarlet.

Acerca da lenda original em que o livro se baseia, devo dizer que não estou assim tão familiarizada com ela... tudo o que sei vem de ver um ou outro filme e a série da BBC (que saudades). Mas o livro parece-me relativamente próximo do que sei, nalguns pontos até me surpreendeu com o quão próximo. Os vilões são, claro, o xerife de Notthingham e Guy de Gisborne - este sim, mau como as cobras. A história que ele tem com a Scarlet... bem, tenho a dizer que é um tipinho arrepiante, e estávamos melhor sem ele. Bem, pelo menos a Scarlet e o Robin estavam, porque ele é um enorme obstáculo ao par.

Todo o livro tem o seu quê de emoção e acção, e faz um bom trabalho a equilibrá-los, mas AQUELE FIM. Quase me matou de ansiedade. E estou um nadinha zangada com a autora por ter criado mais um obstáculo para a Scarlet e o Robin. (Eles já são teimosos o suficiente para serem obstáculos a si mesmos, não precisam de mais.) Mas, ei, vai criar uma dinâmica interessante na sequela. E muito drama, provavelmente. O que quer dizer que eu vou sofrer ainda mais no segundo livro... ainda bem que eu gosto de sofrer com personagens ficcionais.

Dito isto, recomendaria? Sem reservas, se ainda não se tornou óbvio. É um recontar de uma lenda famosa muito interessante, com uma protagonista fabulosa, e cheio de reviravoltas, humor e emoção. E estou toda feliz da vida por só ter que esperar qualquer coisa como um mês para ler a sequela.

Páginas: 304

Editora: Walker (Bloomsbury)

5 comentários:

  1. E agora que FINALMENTE o leste, eu também preciso de o fazer ;_; Oh desgraça!!! Eu bem te disse para o mandares vir!

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    1. Bem, ao menos dar-te ouvidos resultou. ;D

      E sim, precisas de ler. ^_^

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    2. Resulta sempre, tá?lool

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  2. Bem, estão a deixar-me curiosas... tenho que mandar vir este. Também o tenho na minha lista do GR há séculos

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    1. Eu apoio veementemente esse plano de o mandar vir. ;)

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