sábado, 26 de novembro de 2016

Gemina, Amie Kaufman, Jay Kristoff


Opinião: Ah, estava tão preocupada. Sem razão nenhuma, mas pronto. That's how I roll. Tinha uma secreta ou não tão secreta esperança que me divertisse tanto como com o primeiro livro, mas pronto, também estava nervosa acerca de a fórmula perder o seu encanto, ou de não gostar tanto de acompanhar personagens diferentes. Bah, que tonta, não é?

Neste segundo livro, os seus acontecimentos seguem mais ou menos a partir do fim do Illuminae, fazendo dele tanto uma sequela como um companion - este último é porque não segue os mesmo personagens ou até directamente o mesmo enredo, o primeiro porque continua um arco de história maior que acredito que vai seguir para o terceiro livro.

A acção decorre na estação espacial Heimdall, um local mencionado várias vezes no primeiro livro e que era visto como um potencial porto de abrigo. É que a Heimdall gere um wormhole, modo de viagem para naves chegarem rapidamente a outros pontos daquela zona do universo, ou até ao local central de administração da sociedade que vemos nos livros. E é por essas razões que a Heimdall se vê então envolvida na guerra intercorporações que ditou os acontecimentos do Illuminae.

No centro disto tudo estão dois jovens que residem na estação. A Hanna Donnelly, filha do comandante da estação, aparentemente mimada, rica e protegida. No entanto, a Hanna foi treinada por um pai militar. É excelente em autodefesa, e passavam os serões em jogos de estratégia. O melhor de tudo neste livro foi mesmo a Hanna. Uma caixinha de surpresas, uma miúda capaz de muito mais do que aparenta.

E adoro a sua apresentação no início: rapidamente afasta a potencial etiqueta de "certinha e menina do papá" - a Hanna está a tentar comprar uma substância alteradora de sobriedade. Uma droga, basicamente, com a diferença que esta não parece ter adição como desvantagem, e por isso também não terá estigma associado. E também acho bastante interessante a Hanna ter um namorado, e eles serem fofos juntos, mas não parecerem particularmente amorosos ou carinhosos juntos. Talvez seja porque rapidamente a acção principal entra em cena, mas achei a relação deles mais física que outra coisa. E bem, depois ela tem um fim bastante justificado, por isso eu tinha razão em não torcer por eles.

Já o Nik Malikov nem sequer é um residente registado da estação. Cresceu e faz parte da máfia - que não podemos dizer que é russa, porque neste mundo as nacionalidades já não são como as conhecemos, mas é uma evolução da mesma. Está na estação para ajudar o tio a conduzir negócios mais ou menos ilegais (e para fugir ao passado, mas isso é parte da história). O Nik conhece a Hanna porque é a pessoa que lhe vai vender a "substância" (eles flirtam um bocado, mas são apenas conhecidos), e é isso que os salva na parte inicial da acção. Além disso, gostei do Nik porque ele parece mais do que é. Quase que se vê que ele está a tentar demasiado ser o membro da máfia que é suposto ser, e gosto que também seja uma caixa de surpresas.

O acontecimento motor que garante que tudo vai mudar é a chegada de uma equipa de elite especializada em exterminação e recuperação e obtenção de... coisas. Foi enviada pela corporação que provocou os acontecimentos no Illuminae, para prevenir que os sobreviventes do primeiro livro consigam ajuda. E têm carta branca para destruir a Heimdall e todos nela para obter os seus objectivos. É claro que vai tudo para o inferno. E como a lei de Murphy é a lei de Murphy, tudo o que pode correr mal neste cenário, vai correr mal.

Diria que a evolução do enredo neste livro tem algumas semelhanças com o anterior, como se ambos tivessem um "esquema" geral: há um elemento antagonista principal e deliberado, e um antagonista secundário, que se manifesta duma maneira quase incontrolável e mais insidiosa que o principal. Além disso, os personagens têm de navegar uma série de "missões" ao longo da história (faz-me pensar num jogo de consola). Para além disso, diria que cada uma é a sua própria história, distinta e única à sua maneira.

Gosto das pequenas ligações que este livro tem com o Illuminae, como personagens relacionados presentes nos dois; e o facto de quem sobreviver ao primeiro livro, vai seguramente aparecer neste. Nem sequer é um spoiler; as coisas não seriam interessantes se as duas narrativas não se interceptassem, portanto é claro que ia acontecer.

Outras coisas de que gostei: personagens secundários como a Ella, uma miúda com uma deficiência física que é essencial na narrativa da Hanna e do Nik. A Ella é tão fofa e tão durona, uma verdadeira aranha a criar a sua teia para apanhar as moscas. Absolutamente odiei e adorei o antagonista secundário, porque me lembrou das aulas de Parasitologia, e tendo eu tirado um curso na área de saúde, é dessas que me lembro como arrepiantes, com a ideia de parasitas a inflitrar-se na nossa pele e bichos microscópicos mas com coisas que pareciam dentes feiosos. Ugh.

Gostei da parte final. Sabendo nós que um wormhole faz parte da equação é claro que se espera que os autores façam alguma coisa gira com ele. Aquilo que eles fizeram? Para já, foi surpreendente, mesmo estando eu à espera que acontecesse algo, não pensei que fosse isso. Depois, foi tão fixe, tão estranho mas bem esgalhado, toda a noção de coisas paralelas e como resolveu o final para os personagens. Muito bom.

E pronto, estou muito curiosa para o que vem a seguir. Cada livro é, na sua essência, sobre a força e engenho da humanidade, a sua vontade e capacidade de sobrevivência, mas a trilogia no seu todo é sobre vencer os maus, na forma de uma corporação intergalática que destruiu as vidas dos nossos protagonistas como as conheciam.

Quero muito ver como termina porque agora que já conheço o formato, quero ver a evolução natural dos primeiros dois livros para o terceiro. E quero ver o futuro, quero saber o que acontece no seguimento dos relatórios que vemos no início e fim deste livro. Estou tão curiosa que podia morrer de curiosidade.

Por fim, dois destaques: a maneira como os autores nos imergem na cultura vigente, apresentando coisas que nos são familiares e estranhas ao mesmo tempo. Como a subvocalização, que cria chats entre as pessoas na Heimdall, mas em que o emissor não tem de escrever. Ou a noção dum vírus que obriga a passar uma música dum certo artista sempre que a estação tem algo sonoro a passar. É claro que neste futuro as corporações musicais usam vírus para promover as suas músicas. É genial. (Além disso, a música em questão cria momentos hilariantes no livro.)

O segundo destaque é para o design do livro. Brilhante, fantástico, até me dá uma coisa só de contemplar o trabalho necessário para isto. Os chats, as pretensas entradas na Unipedia, as formas imaginativas usadas para descrever certos momentos na acção (os autores ainda se divertem com a coisa; em momentos em que morrem figurantes ficcionais, eles usam o nome de autores amigos no diagrama).

Adorei neste livro a lista de pessoas na equipa táctica que invade a Heimdall; deu uma cara às pessoas e deu mais impacto quando lhes vemos acontecer coisas. E adorei que quando alguns morressem, a lista aparecesse actualizada, com cruzes a riscá-los da equipa. Só me queixo de a lista não aparecer actualizada no fim, com os verdadeiros e pretensos sobreviventes. E por fim, diverti-me tanto com o diário da Hanna, que desenha para contar a sua vida, e tem observações fascinantes. E bónus, é desenhado pela Marie Lu, outra autora que aprecio. Uma bela e simpática surpresa.

Páginas: 672

Editora: Alfred A. Knopf Books (Penguin Random House)

Sem comentários:

Enviar um comentário