domingo, 30 de abril de 2017

Este mês em leituras: Abril 2017

Até estou a estranhar o mês, Abril costuma ser chuvoso conforme diz o ditado, mas só hoje é que pus a vista em cima a uns chuviscos... bem, desde que as nuvens não se estejam a guardar para a feira do livro... Em termos de blogue e leituras, digamos que estou satisfeita com o ritmo que levo. As coisas têm corrido bem.

Livros lidos


Opiniões no blogue


Os livros que marcaram o mês

  • Hunted, Meagan Spooner - um recontar de um conto favorito, A Bela e o Monstro, com um pouco de folclore russo, num tom indomado e inquieto, cativante e mágico e estranhamente realista e relacionável que ainda me assombra;
  • Strange the Dreamer, Laini Taylor - é a Laini, ela podia escrever-me a lista de compras que eu gostava, mas pronto, mais um livro maravilhoso, encantador, cheio de uma escrita bela e cativante, com uma história épica e apaixonante, e uma fantástica capacidade de observação da natureza humana;
  • A Bela e o Monstro (novelização), Elizabeth Rudnick - gostei do filme, gostei de rever a história lendo a sua novelização;
  • Allie Finkle #1, 2, 3, Meg Cabot - uma surpresa porque acabei imenso a gostar da voz narrativa destes livrinhos infanto-juvenis, a Allie é uma miúda amorosa.

Outras coisas no blogue

  • Eh. Mais um mês sem material extra-livros.

Aquisições

Banda desenhada do mês: apenas a colecção No Coração das Trevas DC que estou a fazer e que vem com o jornal Público. A Graphic Novels Marvel este mês foi opcional, aparentemente. (Estou a brincar. Mais ou menos. Mas irrita-me deveras que a quantia dos livros me seja debitada da conta no início do mês, e que depois esperem até ao último momento possível para entregá-la no meu local de trabalho - para onde eu me dei ao trabalho de pedir que entregassem de propósito, de modo a não haver problemas na entrega -, o que neste mês impediu que eu a recebesse, bem, este mês.)

Comprei o Peter Pan na banca onde compro a colecção DC, pois estava a um bom preço, e é uma bela edição. Magia de Papel e a novelização de A Bela e o Monstro comprei com dinheiro em cartão. Os restantes livros são em inglês, e como já é habitual são ou de autoras e/ou colecções que sigo, ou são os livros para o desafio Meg Cabot.

A ler brevemente

Pretendo ler o restante da colecção DC, que já falta pouco para acabar. E ler a Graphic Novels Marvel quando finalmente conseguir pôr-lhe as mãos em cima. Gostava de ler Magia de Papel, que parece uma história gira, e tenciono ler o restante da série Allie Finkle da Meg Cabot para o meu desafio da autora.

Fora isso, quero ler os lançamentos do mês em inglês: a trilogia da Sarah vai terminar, e eu até roo as unhas de antecipação; e a Wein escreveu uma prequela ao seu Code Name Verity - e tendo em conta que muitos anos depois, ainda tenho vontade de chorar só de pensar nele, até tenho medo de ver o que me espera. (Mas também estou muito curiosa.)

sábado, 29 de abril de 2017

Four Weddings and a Sixpence, Julia Quinn, Elizabeth Boyle, Laura Lee Guhrke, Stefanie Sloane


Opinião: Normalmente cansa-me ler antologias. Sabem sempre a pouco, e os autores nem sempre sabem trabalhar o formato em seu favor - levando a que as histórias pareçam por vezes apressadas e soem insatisfatórias. Pode-se dizer que é mais ou menos o caso de todas estas histórias: a diferença entre elas é a mestria com que as autoras me fizeram esquecer disso.

A premissa da história é apresentada em Something Old, uma espécie de prólogo pela nossa Julia Quinn, a cabeça de cartaz: quatro amigas numa escola de internato encontram um sixpence, que as lembra duma rima sobre casamento, e decidem ficar com a moeda e partilhá-la para lhes dar sorte. Adorei seguir a amizade das raparigas através dos contos, pessoas tão diferentes e ainda assim com algo em comum.

(Picuinhice do dia: são todas loiras ou descritas como próximo disso. Eu sei que estatisticamente os ingleses são mais loiros que, digamos, um povo latino, mas raios, nem uma morena? Ou uma ruiva, que estaria também bem adequada? A variedade de personalidades não se traduz fisicamente? Para compensar, quase todos os pares delas são morenos de olhos azuis. Yep, que grande variedade aí também.

E mais picuinhice: ugh, detesto este tamanho de livro dos mass market paperback. São minúsculos e um incómodo para manusear, ainda mais quando o papel é bem mais rígido do que devia ser. Se houvesse alternativa, podem crer que teria apostado nela.)

Something New, Stefanie Sloane: Anne Brabourne tem dois problemas. O tio quer muito que ela case antes dos 21 anos, ou leva-a para o campo; no entanto, ela não quer casar por amor (o casamento dos pais foi deveras tempestuoso), e quer encontrar um marido maleável. Entra em cena Rhys, duque de Dorset, que fica a saber do dilema dela e se oferece para opinar acerca dos homens em sociedade que encontrar e do seu potencial como maridos. Só que a coisa não lhes corre de feição, quando ele começa a encontrar defeitos em todos e ela começa a sentir emoções que não desejava.

Achei este muito apressado. Ao fim dum encontro, e já estão obcecados um com o outro. Era o género de coisa que seria melhor preenchida num livro completo. Eles têm química, no entanto, e gostei de ter os parentes respectivos a torcer por eles e tentar empurrá-los um para o outro. O final é engraçado, pela preocupação dela, mas a cena de sexo caiu um bocado do ar. Aquele capítulo podia ter sido usado para os desenvolver melhor.

Something Borrowed, Elizabeth Boyle: Já Cordelia Padley tem apenas um problema: disse às tias que tem um noivo, para elas pararem de lhe inventar pretendentes. Só que agora elas querem conhecê-lo. Entra em cena Kip Talcott, o noivo presumido, que se tornou conde e teve de assumir responsabilidades inesperadamente. Ambos partilharam em crianças o amor pela aventura e por explorar o mundo, mas isso parece coisa do passado.

Este soou-me a apressado mais pela rapidez com que o Kip entra na farsa do noivo. Estava pronto a pedir outra moça em casamento e tudo - por motivos mercenários, mas mesmo assim... porque de resto, é uma história bem divertida, em jeito de comédia. Os protagonistas reaproximam-se rapidamente, mas posso acreditar nisso, pela história partilhada. Adorei terem as tias dela a torcer por eles e cientes do que se passava. Adorava ter uma história para o Drew, o irmão menos sério dele, e para a Kate, a chaperone dela. (Talvez uma para a Pamela, a ex-futura noiva, que é tão mal tratada pela história.)

Something Blue, Laura Lee Guhrke: Lady Elinor Daventry tenciona ajudar o pai no que toca a uma acusação sobre o seu comportamento em tempos de guerra, e a maneira que encontra é casar com um homem influente que o ajude. Conta com a moeda mágica para lhe dar sorte, mas Lawrence Blackthorne tem objectivos contrários: é o advogado de acusação num processo contra o pai dela, e rouba-lhe a moeda como forma de a atrapalhar. Lawrence era, até há seis meses, noivo de Ellie, até lhe pedir algo extremo - apoiá-lo contra o pai no processo que investigava.

Achei o Lawrence um pouco parvalhão, pois esperava que a Ellie o apoiasse contra o próprio pai sem sequer confiar nela no que toca ao porquê; mas o conflito em si foi credível e o que me fez gostar tanto da história. O drama moral é interessante, especialmente opondo pessoas que foram comprometidas. É claro que a história ganharia se fosse um livro completo, mas funcionou assim para mim. (Achei amoroso que na vida passada deles, enquanto comprometidos, passassem o tempo a escapulir-se para curtir.)

... and a Sixpence in Her Shoe, Julia Quinn: e é por isso que a Julia é a nossa rainha, contando uma história, vá, apressada (tem o menor número de páginas disponível) - a corte dá-se numa semana e dois ou três encontros -, mas incrivelmente é cativante e interessante e curiosamente credível.

Beatrice Heywood vive com as tias idosas, cuidando delas e esforçando-se para manter a economia familiar. É sonhadora, leitora e uma estudiosa autodidacta de astronomia nas horas vagas. (Não acredita no poder da moeda, mas usa-a na mesma, para apaziguar as amigas.) Lord Frederick Grey-Osbourne é um académico, mas um acidente trágico deixou-o cego dum olho e descrente da sociedade. Até que tropeça quase literalmente na rapariga cabeça no ar que o faz confrontar com a sua situação...

Por mais curta que seja, gostei mesmo desta história; a Julia construiu-a duma forma inteligente. Primeiro porque gera uma discussão sobre a incapacidade do Frederick: é claro que há pessoas que vão pensar menos dele, ou que isso o diminui... mas também há pessoas que vão vê-lo pelo que é - um resmungão.

Caso da Bea, que quando lhe dá um encontrão por estar a olhar para as nuvens, recebe maus modos. E depois fica a olhar fascinada para ele, mas para o olho saudável dele, que é azul da cor do céu... e o Fred interpreta-a mal, pensando que ficou arrepiada com o olho cego. Achei este momento interessante porque o fez confrontar com o autopreconceito, e o obrigou a deixar de ter pena de si mesmo. (Além disso, a Bea tem uma curiosidade académica sobre o que é que o olho dele ainda pode fazer, que preconiza a existência do nervo óptico. É um momento intrigante, e tem o bónus de o desarmar.)

Depois, a história é inteligente porque mostra como estes dois são compatíveis, e como este é um encontro de iguais: ambos têm interesses académicos, e consegue-se ver como sendo parceiros, vão apoiar-se e ajudar-se um ao outro.

Bónus para um encontro rumo aos telescópios universitários, a que a Bea nunca teve e nunca poderia ter acesso, e que é amoroso pelos dois juntos; e pela tia dela que faz de chaperone e finge que está muito cansada para os deixar sozinhos. O final é no casamento dela, reunindo as quatro amigas, e é tão engraçado, entre decidirem o que fazer à moeda e meterem-se umas com as outras por ninguém ter esperado pelo casamento para pintar a manta... e especularem se a Bea também o fez. (E quando entra, metem-se com ela, mas passa-lhe ao lado, tipicamente alheada.)

Páginas: 416

Editora: Avon Books (HarperCollins)

sexta-feira, 28 de abril de 2017

Peter Pan, J.M. Barrie


Opinião: Curiosamente, a primeira observação que me ocorre fazer sobre este livro é também uma comparação. Porque em certa medida, me fez pensar nos livros da Alice de Lewis Carroll. Esses são escritos duma forma nonsense que é muito associada ao imaginário das crianças; Peter Pan usa esse imaginário das crianças, e tem algum nonsense na maneira como constrói o seu mundo e o enredo - mas mesmo assim, fez mais sentido para mim e identifiquei-me mais com este livro que com os da Alice.

É uma história charmosa, sem dúvida. Um pouco diferente da versão que conhecemos da Disney; mas eu, que estava ciente que haviam diferenças, acabei por ficar surpreendida com a proximidade de alguns detalhes. A narrativa pode não ser exactamente a mesma, mas o filme animado aproveita todo o tipo de pormenores engraçados. (Exemplo: os Meninos Perdidos no livro vestem peles de ursos que caçam... no filme vestem "peles" de vários tipos de animais.)

É também uma história contraditória, em termos emocionais. É cheia de aventuras excitantes e encontros próximos com o perigo, e tem um mundo maravilhoso a explorar pelos protagonistas; mas também é triste, no sentido em que faz uma reflexão discreta sobre o desaparecimento de uma criança e o efeito que isso tem nos pais. Tendo em conta a história trágica pessoal de um dos irmãos mais velhos de Barrie, é de partir o coração considerar as suas palavras no texto sobre o assunto, que ainda assim são amorosas e doces.

É também ainda uma história um pouco sinistra, no que toca ao seu protagonista titular. Peter Pan é a criança que não cresce; e como criança, é amoral, egoísta, desinteressada, cruel. Tem características que todas as crianças exibem; a diferença é que estas crescem, e Peter recusa-se, prefere ficar neste meio termo sem fim. Permite uma narrativa fascinante, mas também desconcertante.

Detalhes interessantes da narrativa: os pais Darling, como lidavam com os filhos antes e depois do desaparecimento (o depois é de partir o coração para a Sra. Darling); a questão da janela aberta e do beijinho no canto da boca da Sra. Darling e de arrumar os pensamentos das suas crianças (detalhes amorosos e fascinantes); o conjunto de piratas, particularmente Hook, cavalheiro inglês primeiro e só pirata depois (centro dos seus desentendimentos com Peter); e Tiger Lily, independente e guerreira de direito próprio.

Uma nota final para a minha edição. É uma edição especial que encontrei à venda por um preço jeitoso, e é irrepreensível. Pelo preço, é... sem preço. A encadernação é fantástica, o papel luxuoso, a impressão mesmo boa.

Tem a adição de três contribuições. Uma por Rita Redshoes, com anotações/comentários manuscritos nas margens. Não é o tipo que me tenha mantido interessada. Os comentários pareceram-me do tipo de coisas que nos passam pela cabeça numa leitura, mas que não têm necessariamente valor para ser partilhados com os outros. Pelo menos, a maior parte não adicionou nenhum valor à minha leitura. Só uma fracção é que tem algo realmente a acrescentar.

O posfácio é por Pedro Santos Guerreiro. Também não me disse nada. Malha muito no filme da Disney, e é um bocado cheio de lugares-comuns. O desgosto com o filme animado (e outras adaptações) é perfeitamente dispensável, parece-me. Há espaço para tudo e o desacordo do autor tem mais a ver com a interpretação geral da história que se faz. (Nunca foi a minha, por exemplo.) E ficar aborrecido com as opiniões dos outros porque não são as nossas é inútil, parece-me. (E um pouco curioso numa pessoa que é jornalista, mas enfim.)

O verdadeiro valor das contribuições encontra-se nas ilustrações por Cláudia Guerreiro. Muito, muito giras. Usa vários meios para as fazer e têm um certo ar de inacabadas que lhes dá um certo charme. A biografia incluída no livro deu-me a entender que não é habitual fazer ilustrações para livros, e é uma pena.

Título original: Peter Pan; ou Peter and Wendy (1911)

Páginas: 248

Editora: ed. exclusiva Expresso-Visão (baseada numa da Relógio d'Água, creio eu)

Tradução: Relógio d'Água (porque esta edição se recusa a dizer o nome do tradutor e só coloca a editora original nesse espaço, o que faz... totalmente sentido; ou nem por isso)

quinta-feira, 27 de abril de 2017

A Bela e o Monstro (novelização), Elizabeth Rudnick


Opinião: Não é muito habitual ler novelizações de filmes - que me recorde, na minha vida de leitora só lhes peguei aqui e ali, para filmes que tivesse apreciado bastante e quisesse revisitar no meio meio de entretenimento favorito.

Portanto, sim, este é um desses casos. O conto original é um favorito, a versão animada da Disney é uma favorita, o filme live-action recente é um favorito. Estava destinada a ler isto e a adorar e divertir-me durante a leitura, para matar saudades da história. (Ainda que me soubesse a pouco.)

O primeiro reparo que tenho a fazer é que me parece que isto deve ter sido escrito durante a produção do filme, baseado apenas no argumento. Digo isto porque o texto não coordena perfeitamente com o filme nos detalhes visuais - coisas que seriam determinadas na produção e pós-produção -, e que no texto são descritas de forma ligeiramente diferente.

Em adição, alguma caracterização de personagens é diferente. O exemplo óbvio são o Gaston e o Le Fou, que no filme têm uma "leitura" diferente da conhecida, largamente devido ao trabalho dos actores e das indicações da realização que tiveram; neste livro, a descrição deles aproxima-se mais do filme animado. (E não é a minha coisa favorita. Gosto mesmo do que fizeram com eles no filme.)

Em adição, reparei agora que a página de título menciona o nome desta autora como a adaptadora, e menciona o nome dos argumentistas. Portanto, sim, parece que tenho razão.

Outra coisa curiosa a apontar é o facto de ler partes do diálogo do livro e "ouvir" o correspondente em inglês, por estar familiarizada nessa língua (via banda sonora), o que foi bastante divertido. (E boas notícias para a tradução: não tive razões de queixa nesse aspecto.)

Quanto ao livro valer por si mesmo - bem, suponho que posso dizer que o faz. É detalhado o suficiente, e explora um pouco mais certos pormenores que se calhar o filme não teve oportunidade de abordar. (Particularmente na caracterização e nas circunstâncias passadas.) Não é que não estejam no filme, e que o espectador atento não seja capaz de os deduzir, mas aqui estão mais explícitos, e alguns aspectos são mesmo novos, o que é um bónus.

No entanto, é um livro que tem 200 páginas. Para quem está habituado a calhamaços, posso dizer que talvez este seja um bocadinho "básico". Como é suporte para outro meio de entretenimento, não tem a necessidade de ser tão completo como podia ser. (E por isso, se fosse um livro isolado, falharia um nada como narrativa complexa.) Podia ser mais preenchido, e eu adoraria isso. Adoraria mais detalhe, mais descrição. Nem que seja como pura indulgência de passar mais tempo neste mundo.

De qualquer modo, satisfaz o desejo de rever o filme. (Já que o raio do DVD não tem data de lançamento à vista e eu não posso justificar ir ao cinema pagar o raio dum bilhete outra vez.) Encantei-me com o mesmo, e cresci com a história, que me está próxima do coração, e por isso a leitura foi bastante boa. Apenas há que manter as expectativas no lugar certo quanto ao tipo de livro que se tem nas mãos.

Título original: Beauty and the Beast (2017)

Páginas: 208

Editora: Dom Quixote

Tradução: Luís Serrão

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Strange the Dreamer, Laini Taylor


Opinião: Arghhh eu aqui há tanto tempo à espera dum livro da Laini Taylor e ela faz-me isto! Sinto-me enganada! Indignada! Furiosa!

... ok, estou a ser dramática simplesmente pelo objectivo de o ser. Mas a verdade é que mal posso acreditar neste livro e na maneira como terminou. É a coisa mais insatisfatória e cliffhangeresca que já vi. (No bom sentido, claro.) Ai... há autoras que têm mesmo prazer em torturar-nos, diria eu. Ou como dizia em conversa há uns dias, essas autoras bebem lágrimas de leitores e alimentam-se das suas esperanças devastadas. (As trolls.)

O que posso eu dizer mais? É Laini Taylor. Quem não leu, devia ganhar juízo e ler. Quem leu e não gostou, não é agora que vai gostar, suponho. Quem leu gostou, está à espera do quê? Porque ela continua a fazer aquela coisa maravilhosa em que combina uma escrita fantasiosa e um storytelling encantador, numa combinação mágica digna de conto de fadas.

A diferença para os contos de fadas, que são primordiais e arquetípicos, é que a autora é uma brilhante observadora e descritora da natureza humana; entende perfeitamente aquilo que faz de nós o que somos, como portamos o bem e o mal em nós, e como as circunstâncias condicionam isso mesmo.

Isso relaciona-se com o conflito no centro da narrativa: a cidade mencionada na sinopse está no centro de um conflito entre, erm, tipos de pessoas, digamos assim. E é esse conflito que ditou os acontecimentos misteriosos aludidos na sinopse; como essas coisas se deram, no entanto... bem, a piada é ler e descobrir.

E pronto, a autora consegue facilmente envolver-nos na narrativa com a sua capacidade extraordinária em que usa uma linguagem onírica e mágica e extravagante, sem nunca ser exagerada ou melosa. Diria que ela é enganadoramente simples: se eu explicasse a alguém o enredo, pareceria óbvio... mas ao ler tem tantas facetas e pequenos detalhes fabulosos; quase que usa arquétipos e ideias-base, mas depois desconstrói-os e subverte-os, e assim consegue surpreender-nos.

O worldbuilding é fascinante: adoro o cuidado com que a biblioteca é descrita, o refúgio mágico que parece ser para o Lazlo; e depois adorei conhecer Weep, a cidade verdadeira, e Unseen City, a cidade dos sonhos. Existem duas versões de si, e cada uma merece ser conhecida. Além disso, está presente também no enredo algo sobre os sonhos e a sua textura, e essa exploração é outra coisa digna de nota.

Quanto a personagens: o par de protagonistas é adorável. O Lazlo é uma coisinha preciosa, sonhador, tímido, simples, talvez um pouco injustiçado. No entanto, um momento de coragem permite-lhe alcançar o seu sonho, e oh céus, que bela aventura o espera. A Sarai, bem, é melhor conhecê-la. Mas está circunscrita às expectativas e preconceitos dos outros, e isso é verdadeiramente trágico. A sua posição única tornou-a verdadeiramente empática, apesar de ter razões para o ódio.

Os dois juntos, bem... se fosse outra autora, eu teria arrancado os cabelos. A Laini safa-se. O que acontece encaixa bem com o tipo de história e escrita. Porque honestamente, estes dois tecnicamente ainda não se conheceram no mundo real e já estão todos lamechas um com o outro, e eu a revirar os olhinhos do alto da minha idade mais velha. É um pouco exasperante, mas amoroso, suponho. Como disse, encaixa com a Laini e o tipo de situação em que estão, que pressiona o decorrer dos acontecimentos. Além disso, eles são novos e inexperientes, o que leva a um imediatismo que acaba por ser cativante, apesar de tudo.

Outros personagens: gostei de conhecer as pessoas que rodeiam a Sarai. São miúdos bem queridos e gostava que tivessem tido outra vida. (A Minya não. Essa pode morrer. Ugh. Detesto personagens como a Minya. Fundamentalistas e imutáveis. Não são antagonistas interessantes. Até podem ser desafiantes para os protagonistas, mas não podem evoluir, e isso irrita-me. Mas adoro odiá-los.) Também gostei de conhecer a Calixte, miúda intrépida e desbocada, e os que rodeiam Eril-Fane, que são um símbolo do que a cidade conheceu por 200 anos. Conhecer a sua história trágica é de partir o coração.

A mensagem da história é curiosamente relevante nos dias que correm. Uma mensagem sobre opressão e desumanização do "inimigo", sobre os actos terríveis que se cometem depois de ultrapassado um certo ponto de pressão... sobre as diferenças que nos separam e aproximam, sobre preconceito aprendido e internalizado e como é difícil descartá-lo, e sobre como é fácil violência alimentar violência. Difícil é ultrapassar uma vida inteira a aprender a linguagem do ódio.

Há algumas pequenas reviravoltas na história... mas digamos que começo a conhecer como a autora "funciona". Ela faz um comentário de passagem à página 200 que fez clique para mim e adivinhei o que ela tinha preparado para nós umas 250 páginas depois. Não estragou o meu gosto pela leitura. Pelo contrário, diverti-me a ver como as coisas iam parar àquele ponto. Houve espaço para o inesperado, ainda assim.

O final... oh, o final. É de partir o coração. É torturoso, é quase incredível. Mal consigo imaginar como ela vai descalçar a bota. É frustrante. e enervante. Tudo isto no bom sentido, claro. Mas toda eu comicho só de pensar em esperar um ano ou mais para saber o que vai acontecer a seguir.

Páginas: 544

Editora: Little, Brown (Hachette)

domingo, 23 de abril de 2017

Curtas BD: No Coração das Trevas DC, volumes 4 a 6

Uma história que captou o meu interesse pela protagonista e pelo tom. Selina Kyle está morta para o mundo, mas um golpe que corre mal deixa-a desesperada e ambiciosa: o golpe que se propõe executar de seguida envolve roubar da máfia. Com um plano tão temerário, é provável que as coisas venham a correr mal...

Uma história que me cativou pelo tom noir, ao estilo daquelas narrativas de detectives de antigamente, com um golpe, uma femme fatale, violência estilizada a todos, um detective e montes de gente em sarilhos antes da história acabar... É um enredo clássico e rodado, mas é precisamente por isso que resulta.

A arte também me encheu o olho, o estilo é cartoonesco e simples, mas muito eficaz e cativante. Ajuda que as cores sejam de Matt Hollingsworth, creio que ele trabalhava em Hawkeye e o seu estilo adequa-se perfeitamente.

O volume contém ainda uma história curta com dois dos personagens da história principal, e um assalto que corre mal, colocando-os na mira do Batman, pois as suas acções ditam um momento muito familiar a Bruce Wayne. Uma coincidência interessante, e com economia de palavras é fácil perceber as acções dos envolvidos.

Esquadrão Suicida: Disciplina e Castigo, Ales Kot, Matt Kindt, Patrick Zircher
É um bocadinho óbvio que esta é uma história a meio do decorrer da revista que acompanha a equipa; ao que entendo houve uma mudança de escritor, e isto é um mini-reinício da narrativa, mas parecem ter acontecido coisas antes disto, e não sou fã da ideia de apanhar uma história a meio.

O enredo em si não é nada de especial, pelo menos não no que toca às missões: são genéricas, cheias de vilões genéricos, desconhecidos e com motivações desinteressantes, e por vezes são mesmo confusas. O interesse está na exploração dos personagens: a Harley Quinn é incrivelmente interessante, e morri ao descobrir que o querido irmãozinho psicopata da Barbara Gordon, a Batgirl, que apareceu nalguns dos volumes dela que li o ano passado, aparece aqui! A ideia de tê-lo como analista é fabulosa. (Bónus no volume: dois números sobre a origem da Harley e do Deadshot. Algumas ideias interessantes, mas não é a maior invenção desde a roda.)

Dentro dos vários artistas aqui presentes, acho que gostei mais do Patrick Zircher, responsável pelos três primeiros números. A arte é complexa e nada aborrecida e dinâmica - e bónus, não desenha a Harley como uma pin-up, coisa que estou rapidamente a aprender que é praticamente irresistível para todos os artistas que a desenham. A sério, é a ideia mais básica de sempre tendo em conta o uniforme dela. O artista da narrativa sobre ela também era minimamente interessante, num sentido mais cartoonesco.

Joker & Harley Quinn: Amor Louco, Paul Dini, Bruce Timm
Ok, acho que entendo porque é que a história titular foi tão popular na sua altura. Depois de um tom tão negro nos comics vindo dos anos 80, a série animada criada por estes dois artistas (e esta história) devem ter sido uma lufada de ar fresco. Contudo, sinto que se saísse nos dias de hoje, nunca teria a mesma relevância.

De qualquer modo, é uma história bem divertida. O humor é apalhaçado, exagerado, físico - adequado para dois vilões que se vestem como palhaços, curiosamente. Morri a rir com os comentários da Harley ("não queres acelerar na tua Harley?"), com os sonhos da Harley sobre a vida deles em conjunto, e com o Joker a imaginar os outros vilões a gozar com ele quando se soubesse que a Harley fez um melhor trabalho que ele a derrotar o Batman. (E gostei que ela o fizesse.)

No entanto, a luz a que mostra a relação deles, o tom divertido, só faz um melhor trabalho a destacar algo preocupante: o quão disfuncionais e errados eles são juntos. Em adição, a arte presta-se ao tipo de história, dinâmica, cartoonesca, fantasticamente colorida. Muito gira.

O volume contém também uma história pelos dois artistas principais, Demónios, que envolve Ra's Al-Ghul, e é gira, mas honestamente não é tão boa como Amor Louco. A terceira história no volume é uma com a Harley e a Poison Ivy, que raptam o Bruce Wayne para o usar como um cartão de crédito ambulante, e irem às compras de Natal para elas. Super-engraçado, especialmente pela frustração do Bruce em ter de fazer o que elas mandam.

sábado, 22 de abril de 2017

Hunted, Meagan Spooner


Opinião: Estou a chegar à conclusão que esta é uma opinião difícil de escrever. Mais uma. Tenho tido muita sorte, porque continuam a cair-me no colo bons livros, livros que se tornam favoritos. Sinto-me muito contente por isso. (E grata pela minha intuição ao escolhê-los.)

Ao meditar sobre esta leitura, dei por mim a pensar no Cruel Beauty. Uma amiga estava a lê-lo recentemente e sentiu-se acerca dele exactamente como eu na altura, e senti-me vindicada por não gostar dele ao contrário da opinião geral. E isto é relevante porquê? Porque Hunted é tudo o que eu esperava que Cruel Beauty fosse e acabou por não ser. Preencheu-me a alma de leitora, e abordou uma história querida duma forma nova e fascinante.

Hunted é um retelling de A Bela e o Monstro (e não só, contendo fragmentos de outros contos, incluindo um de origem eslávica que dita parte dos acontecimentos); e uma das suas melhores facetas é precisamente o tom e a linguagem, pois de algum modo Meagan Spooner consegue recapturar esta sensação de estarmos a ler um conto de fadas, com criaturas fantásticas, maldições mágicas e regras curiosas sobre como o mundo funciona.

A história começa duma forma que segue muitos dos recontares da lenda em foco: Yeva é a mais nova de três irmãs, e a família vive em sociedade (numa Rússia rural medievalista) até o pai tomar as decisões erradas nos negócios, precipitando uma queda de graça da família.

A diferença aqui prende-se com Yeva e a sua personalidade: ela até fica meio contente pela queda de graça. Eles têm de se mudar para uma antiga cabana de caça que o pai (ainda) possui. Sem paciência para o dia-a-dia em sociedade, Yeva prefere passar o dia na floresta, a caçar, habilidade que lhe foi ensinada pelo pai em pequena, e apenas abandonada por ter crescido e estar à beira de se tornar numa "senhorinha".

Há algo de fascinante na personalidade de Yeva, algo com o que podemos identificar: a sua insatisfação. Yeva não se quer contentar com a vida em sociedade, não se satisfaz com o que tem. Quer algo mais, ainda que não saiba exactamente o quê. Soa refrescante; ainda que o recontar da Disney já tivesse parte destes elementos, Hunted explora essa sensação de procurar algo mais de forma mais completa. (É um bom contraponto à mensagem original do conto, que poderá ter sido escrito para sugerir às donzelas para se satisfazerem com o marido que lhes calhasse na rifa, ainda que fosse um monstro - poderiam domá-lo e fazê-lo amá-las.)

Adorei ler sobre a relação familiar no centro da história: Yeva adora o pai e ama as irmãs. A relação fraternal é forte e amorosa e é também refrescante ler sobre isso. (Outras versões do conto não são tão caridosas para as irmãs da Beauty.) Até adorei ler sobre o Albe, que é uma espécie de irmão adoptado da família; mesmo na queda de graça, não os abandona. Foi bonito ler sobre a dedicação de Yeva à sua família, ao mesmo tempo que ama a floresta e a caçada; é provavelmente a razão pela qual ela não procurou confrontar a sua insatisfação mais cedo.

Ainda tenho de falar do Solmir. É uma figura Gaston-like, no sentido em que procura a mão da nossa Beauty; a diferença é que o Solmir é inteiramente uma boa pessoa. A posição dele na história é curiosa: a Yeva sente uma pressão societal para o aceitar - a família está a passar um mau bocado e ele podia ajudar com isso. Além disso, se espera manter um pé na sociedade ele é o mais próximo de liberdade que podia ter - compreende em parte o amor dela pela caça e seria um marido que não se oporia a que ela mantivesse esse interesse.

Mas "perfeito no papel" e "o melhor que se pode arranjar" não são propriamente recomendações brilhantes, e Yeva sabe desde o início o quão errado ele é para ela. Atrevo-me a dizer que o rapaz esteve sempre firmemente na friendzone; no início do livro quando lhe falam dele e do suposto interesse dele por ela a Yeva fica com uma atitude do género "porque é que me estão a falar deste tipo, só quero é ir para casa e meter-me na floresta".

E isto é só o início. Ainda não falei da parte principal da história, mas esta sabe melhor sendo descoberta. O que é preciso saber é que o pai da Yeva desaparece na floresta, e sem saber o que aconteceu, Yeva parte à aventura para encontrá-lo. Descobre uma besta na floresta, uma que a captura e a leva para o castelo.

O que acontece a partir daí é semelhante e ao mesmo tempo bastante diferente do que conhecemos. Digamos que a história lida bem com os temas do conto original que mencionei ali em cima. Aborda-os, e dá-lhes a volta; e desenvolve a relação da Bela e o Monstro duma forma bastante satisfatória evitando os seus aspectos problemáticos - ou melhor entendendo-os, e escrevendo duma forma em que podemos apoiar os personagens juntos sem duvidar do porquê de estarem juntos.

A história em si é pouco romântica, no sentido em que não temos muitos momentos para suspirar de quão amorosos são os intervenientes do par protagonista. Mas isso não quer dizer que a sua relação não é desenvolvida; pelo contrário. As partes da história no castelo são calmas e sossegadas por isso mesmo. Estas duas, erm, pessoas têm objectivos que chocam um com o outro, mas desenvolvem umas tréguas ao encontrarem um objectivo mais ou menos partilhado.

Acho que a melhor parte de os ver juntos é que a sua história começa opondo-os como inimigos, e a aproximação é tão gradual que é fácil de nos passar despercebida até estar mesmo à frente do nariz. E mesmo quando é óbvio, isso não resolve os problemas de ninguém. Gosto que seja um reconhecimento da vida real: nada é simples, as coisas vão continuar a vir e tentar destruir-nos. A nossa atitude é que faz a diferença.

Gosto que os dois juntos se tornem um encontro de iguais: pessoas com os mesmos anseios e desejos que reconhecem no outro uma visão semelhante da vida. Disse que a história era pouco romântica? Perdão, isto parece-me romântico o suficiente.

Um recontar de A Bela e o Monstro nada era sem uma maldição, certo? Aqui o objectivo da mesma não é bem aquele que conhecemos; tem a ver com o recontar duma lenda eslávica relacionada com o Firebird. O melhor mesmo é vê-la desenrolar-se aos nossos olhos. Aprecio a mensagem: não há algo que resolva tudo e nos traga felicidade eterna. Nada nos completará magicamente. Lutamos por cada pedaço de felicidade e por aquilo que queremos, e só podemos esperar nunca nos perdermos no caminho.

O fim é fofinho, adorável, suponho, mas deixou-me com o raio duma insatisfação. Queria mais. Vá lá, sabemos que estes dois vão ter mais aventuras. Bem podemos ficar a sonhar com elas.

Páginas: 384

Editora: HarperTeen (HarperCollins)

segunda-feira, 17 de abril de 2017

100 Hours, Rachel Vincent


Opinião: Esta é uma pequena mudança de género e de tom para a autora; nunca lhe vi um livro tão claramente a pender para o thriller. E que bem que me soube: devorei-o num instante a passei uns bons bocados com ele.

100 Hours conta com essa premissa mesmo, decorre em 100 horas, e descobrimos o que decorre nelas com duas primas e o seu grupo de amigos. Maddie é a "boazinha", e desaprova o comportamento VIP da prima. Genesis é a herdeira de um império de transportes, e age como se toda a gente estivesse à sua disposição.

No caso, é bem verdade. O que eram para ser umas férias nas Baamas para o grupo de amigos, acaba por ser uma escapadela à Colômbia, a reboque da Genesis, que quer ver o país de origem da sua família. A visita das praias mais recônditas expande-se para uma expedição no meio da selva - onde os jovens são interceptados e raptados por um grupo cujos motivos não são os mais óbvios...

Diverti-me bastante com a parte inicial, a descrição de um grupo de jovens maioritariamente rico, habituado a fazer o que quer. Pode ser um pouco exagerado; mas por outro lado, acho esta parte algo credível. Acredito que com dinheiro e liberdade, qualquer um podia portar-se de forma mais excêntrica.

Além disso, diverti-me a ler sobre gente não "boazinha": miúdos que se embebedam, fazem a festa, traem o namorado, dizem coisas ridículas sobre as amigas. De certo modo é realista também, na forma como adolescentes adoptam comportamentos extremos. E achei refrescante o tipo de comportamento deles.

Gostei mesmo da Genesis. Tem um feitio lixado, é cheia de si, tem a mania que sabe tudo e guia os amigos como se fosse dona da vida deles, age como uma herdeira mimada, comete pecados difíceis de aceitar. Gosto que seja difícil de gostar, alguém tão obviamente não-"boazinha". Gosto do outro lado que ela revela, a adolescente treinada pelo pai para todo o tipo de situações perigosas, a pessoa analítica e inteligente, lutadora com experiência e dotada de um tipo de lealdade que a impede de deixar quem quer que seja para trás.

A Maddie também tem o seu quê de interessante. Cedo na história atravessa-se-lhe um momento complicado, algo que eu achava que a autora não ia ter coragem de fazer... pontos bónus por tê-lo feito. Tem um desafio suplementar - é diabética e a bomba de insulina portátil precisa ainda assim de ser reposta. Sem grandes capacidades, vai longe e dá o seu contributo para avançar a narrativa e ajudar os seus. (E o Luke é amoroso, especialmente na sua dedicação canina e determinada.)

A meio da narrativa a acção começa a sério, e os motivos dos raptores são bem diferentes do óbvio, e é fascinante ver essas revelações mostrarem-se... nem sequer tem exactamente a ver com as nossas protagonistas, mas mais com os, digamos, pecados dos seus respectivos pais. Aquilo que descobrios é altamente sugestivo e intrigante.

A parte final, então, é de roer unhas. A reviravolta é muito boa, e fascina-me pensar nas suas implicações; além disso, as acções involuntárias da Genesis provocam uma tragédia muito maior do que ela esperava, e estou curiosa em ver como isso a afecta no segundo livro. Por fim, temos um cliffhanger do mal, o estado de toda a gente fica em suspenso, e lá volto eu a roer as unhas.

Dois destaques ainda: a maneira como a situação actual na Colômbia é apresentada. A autora tenta desmistifcar algumas das ideias preconcebidas sobre o país, creio eu. E como a narrativa mostra um grupo de emigrantes a ser bem sucedido nos EUA. Isso é muito interessante.

Por fim, tenho a dizer que não sendo particularmente extraordinária, esta é uma boa história, que me deu gozo acompanhar, com um tom que me agradou e um conjunto de personagens cativante de acompanhar, e cujo resultado espero com curiosidade no próximo ano.

Páginas: 368

Editora: Katherine Tegen Books (HarperCollins)

domingo, 16 de abril de 2017

The Struggle, Jennifer L. Armentrout


Opinião: Eh, este soou exactamente a um livro do meio duma série, e não é propriamente no bom sentido que o digo. Está demasiado focado em preparar os acontecimentos do próximo livro, e por isso parece que nada acontece neste, o ritmo do enredo é algo... aborrecido.

A piada da coisa é que, em teoria, montes de coisas interessantes e importantes acontecem. Mas a maneira como são expostas não é a minha favorita; e além disso, são afogadas pela forte presença do elemento romântico.

E falando no mesmo, pode-se dizer que me tornei fã do casal principal. A Josie e o Seth funcionam bem juntos, gostam mesmo um do outro, defendem-se e lutam um pelo outro. No entanto, sinto que a sua relação e respectiva evolução ocupou demasiado espaço de antena no livro, não dando espaço a que o enredo evolua.

Além disso, a Jennifer faz com eles uma coisa que me fez revirar os olhos. É o cliché dos clichés, e tenho receio de ver como isso vai condicionar a narrativa daqui para a frente. Achei as reacções dos dois a isso realistas, e por isso tenho esperança que corra tudo bem, mas veremos.

Fora isso, tenho gostado do que esta série vai revelando sobre a mitologia deste mundo, e este volume não é excepção. Há algumas coisas com muito potencial aqui, e quero continuar a ver o que dali sai. Estou curiosa para ver o que andam os deuses a tramar, têm andado muito discretos, e isso nunca parece ser bom sinal.

Falando individualmente dos personagens, gosto bastante da Josie. Acho que ela tem ido evoluindo, mas gosto de como se mantém terra-a-terra, e como alguém recém-introduzida a este mundo, não perdendo o seu lado "humano" e mundano. (Acho muito credível a sua reacção à "notícia".) No entanto, ela passa por uma situação complicada, e acho que a Jennifer não aproveitou o potencial da situação para explorar as reacções da Josie a esse momento. E teria sido mais realista vê-la com sequelas do mesmo.

O Seth continua aquele tipinho irritante, mas também tem tido uma evolução interessante ao longo dos livros, e gosto do que tenho visto dele. Os novos factos acerca dele são fascinantes, e mudam as coisas duma forma curiosa. Acho ainda engraçado que o Seth tem ido ganhando juízo, sem deixar de ser ele mesmo.

Foi bom rever outros personagens, como a Alex e o Aiden, que deixaram tantas saudades. São um casal adorável, muito forte e fantástico de acompanhar, ainda que já não sejam os protagonistas. E o Deacon e o Luke também são uma delícia de acompanhar. (Além disso, o Deacon é o grande responsável pelos momentos humorísticos do livro. Adoro o humor dele e do livro em si.)

E pronto, aqui estou eu, pronta para esperar mais um ano. Inicialmente isto era para ser uma trilogia, mas de momento estão planeados quatro livros, ao que sei. Apesar das falhas, tenho fé na autora e estou curiosa para ler como ela vai resolver certos problemas. Espero que o quarto livro seja mais animado e excitante, e que traga um bom fim para a história destes personagens.

Páginas: 368

Editora: Hodder & Stoughton (Hachette)

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Curtas BD: Graphic Novels da Marvel, vols. 32 a 34

Homem-Aranha: Azul, Jeph Loeb, Tim Sale
Hmmm. Esta acabou por ser revelar uma história e uma narração interessantes. Não tem exactamente princípio nem fim; é um recontar de histórias do Homem-Aranha de tempos antigos - o Peter cruza-se com alguns dos seus típicos inimigos, como o Duende Verde, o Lagarto ou o Rino. E nos entretantos, a narrativa mostra pedaços do dia-a-dia do Peter, com a tia May ou com o grupo de amigos que inclui o Harry Osborn, o Flash Thompson, ou as verdadeiras bombas que são a Gwen Stacy ou a Mary Jane Watson.

Acho que apreciei a narrativa pela sua simplicidade - a vida do Peter era definitivamente menos complexa e dramática; tudo o que o preocupava, para além dos vilões típicos, era estar dividido entre as atenções de duas moças giras. Apreciei a descrição dos momentos passados entre amigos, e gostei da caracterização da jovens; deu para vislumbrar uma personalidade forte e o porquê de se interessarem pelo Peter.

A arte é bastante boa; com um estilo clássico e simples, mas mesmo cativante. Gostei de como as meninas foram apresentadas, mas também gostei da expressividade do traço. O final é melancólico, mas gostei que relembrasse que não foi só o Peter a ser afectado pela tragédia da Gwen.

Thor: O Último Viking, Walter Simonson
Para uma colecção de histórias clássicas, acabei a divertir-me muito. Normalmente estas são muito soltas e não tendo um fio condutor, colectando narrativas curtas; mas esta compensa isto e muito. Creio que a "culpa" é do autor: pareceu-me fantástico como argumentista. Conseguiu cativar-me e interessar-me pelos personagens em foco no livro (Beta-Ray Bill e o titular Último Viking) e pelas suas histórias.

Em adição, consegue captar bem um certo tom que é perfeito para narrar as aventuras de um deus nórdico. Há muitos elementos conhecidos da mitologia do Thor da Marvel e muitos elementos da mitologia nórdica, e algumas pequenas surpresas e coisas giras.

A arte é mais cativante graças à recoloração, que é dinâmica e mais moderna, mas o próprio traço em si é complexo e dinâmico e capaz de captar o olhar do leitor. Em suma, uma boa surpresa.

Vingadores: Primordial, Brian Michael Bendis, Alan Davis
Ok, a história em si é um pouco básica, mas é divertida. A premissa é que decorre algum tempo depois da Guerra Civil e logo após o evento Cerco nos comics: o Tony Stark e o Steve Rogers ainda estão amuados um com o outro e continuam a discutir quando têm oportunidade; por sua vez, o Thor está mesmo, mesmo, mesmo farto de os ouvir. (Pobrezinho. Nós também, querido.)

Entra em cena um evento cataclísmico que altera a maneira como os reinos da mitologia nórdica se relacionam, e os três são arrastados para um cenário de fantasia épica que os obriga a procurar uma solução para o desalinhamento do universo como o conhecem.

Huh. É isto que os super-heróis fazem quando precisam de terapia de casal, então? Porque a história é escrita com algum sentido de humor; o Steve dentro de meia hora após aterrar num local estranho, já arranjou uma armadura e um escudo, e conseguiu encantar um elfa negra jeitosa; o Tony por sua vez acaba por se meter em apuros e tem de ser salvo pelo Steve.

Já o Thor está em apuros mas sai deles sozinho, e faz por descobrir quem está por trás de tudo, enquanto os outros dois estão a resolver os seus problemas. E pronto, as coisas terminam bem e os Vingadores voltarão ao seu estado natural. Pelo menos já ninguém tem de aturar mais discussões.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

A Culpa é Minha, Louise O'Neill


Opinião: Ah, este livro... é complicado, mas vale a pena. As primeiras 80 páginas são bastante mansas, até aborrecidas, mas são o pedaço de caracterização mais importante da narrativa. A Culpa é Minha começa por nos apresenta o dia-a-dia de Emma, uma adolescente irlandesa típica, bonita e popular.

A pescadinha de rabo-na-boca é esta: a Emma é uma pessoa extremamente difícil de gostar. Na vida real, sei que não seria amiga de alguém com o feitio dela. Manipuladora, sempre a colocar as amigas umas contra as outras, a rebaixá-las subtilmente, tudo para se sentir melhor, para se sentir como a mais bonita, a maior em tudo de todas elas.

E é exactamente por isso que Louise O'Neill a caracteriza assim. A Emma é representativa de uma boa fatia das adolescentes por aí - fomos todos egoístas e auto-centrados, a certo ponto -, mas o seu feitiozinho é o que força o leitor a confrontar-se com o preconceito. É mais difícil não pensar que "estava a pedi-las" quando a vítima é alguém difícil de gostar, não é?

Ah... a secção da festa e do que acontece à Emma é bastante dolorosa de ler. A primeira parte do que lhe acontece, bem, ela nem se consciencializa do que aconteceu, realmente, e depois numa espécie de competição consigo própria, entra numa espiral descendente que é aproveitada por jovens da idade dela, que ela conhece, para fazer algo que é tão extremo que é um desafio ler o resto do livro, ler sobre as consequências dos actos deles, sem ter vontade de uma pessoa se lançar numa fúria destruidora. Só que não podemos defrontar personagens ficcionais, não é? E na vida real, as coisas também não funcionam exactamente assim.

O Depois... é uma secção fragmentada. É sobre as consequências daquela noite, é narrada pela Emma. E é uma secção aterradora. É uma narração do ponto de vista da vítima e do que as acções de outros lhe fazem, e continuam a fazer. O caso da Emma vai parar aos media porque envolve fotografias colocadas no Facebook. E ainda é mais enfurecedor: porque as consequências são bastante públicas, e no entanto a opinião pública vira-se maioritariamente contra a vítima.

O que causa mais horror nisto tudo... é que é um retrato muito fiel do que vemos acontecer na vida real. Quantos casos vemos nas notícias, intensamente mediatizados, mas em que o agressor se safa com uma pena leve "porque ai coitadinho não lhe vamos estragar a vida".

E de caminho ele (e nós, sociedade) estragámos a vida à vitima, que não só perdeu controlo da sua vida e autodeterminação às mãos de outra pessoa, que tem sequelas graves, físicas e mentais, de lidar com tal situação, que tem de enfrentar o constante bullying da sociedade porque há sempre quem não acreditará nela, quem lhe chame todos os nomes e a culpabilize e diga que "estava a pedi-las".

Dos crimes julgados em sociedade, nenhum é tão estúpido como a violação. É o único em que a pessoa julgada como culpada em tribunal é a vítima.

E por isso o relato da Emma no Depois é triste. Torna-nos pequeninos perante o sofrimento, a sensação de nunca escapar às acções dos outros, perante as consequências grandes e pequenas que tal momento tem na vida da vítima e dos que a rodeiam. A vida familiar da Emma fica um cenário completamente irreconhecível, e isso também é entristecedor.

Compadeço-me do que os pais dela passaram, mas o que fica é uma falta de entendimento da parte deles, uma falta de apoio. A sensação de alívio que emana deles quando a Emma toma a decisão no final? Ahhhh, não lha posso perdoar-lhes. Soa a como se estivessem só a pensar no que passaram e a esquecer dos problemas da filha.

No final fica a impotência, a noção de que nada podemos mudar na situação dela. Podemos mudar como sociedade e no futuro tratar outras Emmas de forma diferente, mas é enfurecedor. O final não é feliz, e é muito em aberto, algo insatisfatório... mas é realista. Quantas vezes isto não acontece também na vida real? E no fim de contas é uma decisão da Emma.

Numa situação em que ela nunca teve uma palavra a dizer sobre o que lhe acontecia, aqui ela tomou as rédeas e escolheu fazer o que lhe parecia ser melhor para si e para os seus. Entristece-me, mas fico satisfeita por ela. Ninguém podia pedir a esta personagem ficcional, como ninguém pode pedir a uma vítima na vida real, para carregar a tocha da verdade e da justiça. É um fardo pesado de carregar.

Título original: Asking for It (2015)

Páginas: 256

Editora: IN Edições (Zero a Oito)

Tradução: Rui Azeredo

domingo, 9 de abril de 2017

Conta-me Três Coisas, Julie Buxbaum


Opinião: Ok, aqui vão três coisas:

1) Adorável, mas não memorável;

2) Não sendo nada de especial, não entendo porque teve tanto destaque no panorama literário YA o ano passado... quer dizer, não inventa a roda nem nada que se pareça no que toca aos temas que aborda;

3) É fácil esquecer isso, no entanto, com o charme do admirador/correspondente secreto e o mistério da sua identidade que é oh-tão-óbvia.

Conta-me Três Coisas é a história de Jessie. A mãe morreu há dois anos, o pai voltou a casar recentemente e mudou-os para Los Angeles, para viver com a madrasta e o filho dela. Uma situação que compreensivelmente perturba a Jessie, arrancada de tudo o que conhece, ainda a fazer o luto. No entanto, depois do seu primeiro dia, começa a receber e-mails de um anónimo que animam os seus dias...

Provavelmente este livro ter-me-ia cativado mais se a sua protagonista se tivesse revelado mais interessante aos meus olhos. Quer dizer, em muitos aspectos ela até faz a coisa certa na caracterização da protagonista. A Jessie é tão interessada, e awkward e resmungona, como o adolescente típico. Mas talvez fosse isso que lhe falta: aquele extra que torna um protagonista inesquecível.

As partes do luto pela mãe são interessantes, mas acho que tinha ganho mais em ler em inglês, curiosamente. Senti um desligamento do texto, algo que não me permitiu sentir as emoções no todo. Normalmente sinto isso só quando estou a ler em português; algo na tradução não me permite ligar ao texto inteiramente, e isso é uma pena, que eu acabe a estar mais confortável a ler em inglês do que na minha própria língua graças à barreira que a tradução me põe.

Achei irritantes um par de coisas na narração da Jessie: uma, os clichés em demasia. Todo aquele ódio às pessoas de Los Angeles, como são focadas na aparência e podres de ricos e nhénhénhé... ugh. Um pouco mais de imaginação, por favor. O mesmo se aplica à Gem e ao irritante que é ainda termos de recorrer ao estereótipo da mean girl para agitar as coisas.

Dois, aborreceu-me de morte a Jessie queixar-se tanto da mudança e fazer esforço zero para aproveitar a nova vida. Talvez porque já tenha estado na mesma situação (mudar de casa e cidade sem achar piada nenhuma à coisa), mas que nervos, tanta lamúria. (Está bem que não tive que lidar com luto, felizmente, mas por outro lado era três vezes mais atadinha que a Jessie, e não tive tanta dificuldade como ela a aceitar a nova realidade. E era mais jovem e provavelmente menos madura que ela. Ok, já chegar de partilhas pessoais.)

O elenco de personagens secundários é incrivelmente mais interessante. A Scarlett, a amiga que ficou para trás, e compreendi bem o seu lado. A Dri e a Agnes são uma fantástica adição ao seu grupo de amigos. O pai da Jessie tem uma posição curiosa, ainda a adaptar-se à nova vida, o que deixa-a algo desamparada. O Theo é o irmão-por-casamento, com uma personalidade fantástica e que até tenho pena de não ver mais explorada. A Rachel (a madrasta) também tem uma posição interessante na narrativa, e é pena que só tenha uma cena (no final) com nuance.

Uma das coisas mais interessantes de toda a narrativa, no entanto, é o mistério do correspondente anónimo. Oh, é bastante óbvio, pelo menos para o leitor, qual é a sua identidade desde o início. Para a Jessie não, e até que é divertido vê-la vacilar e tentar adivinhar e encher-se de esperanças quanto à identidade dele e vê-las morrer quando acha que é um rapaz que não é aquele pelo qual tem uma paixoneta na vida real.

A sério, as inseguranças e dúvidas dela quanto à coisa são amorosas (totós, mas amorosas), mesmo quando já é óbvio para ela também. E devo acrescentar que os momentos dela com a paixoneta da vida real e com a pessoa online são bastante fofos. São o que fizeram este livro valer a pena para mim.

O final é mesmo à filme, tipo comédia romântica, com uma série de trocas e enganos que se resolvem num ápice, libertando os foguetes metafóricos para a protagonista e terminando num tom feliz e com tudo encaminhado a seu contento. (E a meu também.) Gostei. Às vezes é preciso que a história termine exactamente como o esperado, como o habitual, o cliché. Aqui soa bem melhor assim.

Título original: Tell Me Three Things (2016)

Páginas: 304

Editora: Topseller

Tradução: Cláudia Ramos