terça-feira, 17 de janeiro de 2012

A Revolta, Suzanne Collins


Opinião: O título em português diz tudo. A antecipação criada nos livros anteriores previa uma rebelião em larga escala, mas nada me podia ter preparado para a extensão dos horrores da guerra e para a sucessão de acontecimentos trágicos que se seguiria. Louvo a Suzanne Collins por ter desenvolvido a história assim; gostei mais da mesma por isso. Senti-a mais real. Curiosamente, levei algum tempo a ganhar coragem para ler o Em Chamas e este pelo desapontamento que o livro final suscitou em muitos fãs.

Não sei se o que a maioria das pessoas esperava era uma Katniss lutadora e no centro dos acontecimentos, uma guerra justa e sem carnificina, e um final perfeito a acompanhar, mas percebo que nesse caso o livro tenha desapontado. Temos em vez disso uma heroína quebrada, uma guerra em que o pior da natureza humana vem ao de cima, e o fim... no fim temos aqueles que sobreviveram a tentar colar os cacos do vaso que quebrou em milhares de pedacinhos. A análise mais acertada das coisas é feita pelo Plutarch (a ironia!, pois de todos deve ser aquele com mais falta de tacto):

"Agora estamos naquele período harmonioso em que toda a gente concorda que os recentes horrores nunca poderão repetir-se. (...) Mas a memória colectiva costuma ser curta. Somos seres volúveis e estúpidos com memórias fracas e um grande dom para a autodestruição. Mas, quem sabe? Talvez seja agora, Katniss. (...) O momento em que aprendemos. Talvez estejamos a testemunhar a evolução da raça humana."

Fiquei chocada com a perversão das razões da guerra; como é que os rebeldes podem reclamar da justiça da sua causa quando começam a usar os métodos do inimigo, é uma coisa que me ultrapassa. Será que os fins justificam os meios? Não posso concordar, vendo o tipo de horrores que as pessoas são capazes de cometer em nome de uma causa.

A Katniss, coitada, dá dó - aquele espírito rebelde e determinado que ela tem está lá, mas ela passa o livro a ser levada de um lado para o outro para ser o mimo-gaio, o símbolo da revolução; a Katniss que conhecemos deixou-se enterrar por uma depressão, algumas tentativas de resistir à maré e manter-se íntegra, todas as manipulações envolvendo os rebeldes, e uma incapacidade de ver para além do próximo passo. A certa altura as coisas deixaram de estar sob o seu controlo, e não consigo ver o que ela poderia ter feito para o recuperar. Partiu-me o coração ver o estado em que a guerra a deixou no fim do livro. Assim como o destino de vários personagens, mas senti a guerra mais real por causa disso.

Quanto ao desenrolar do "triângulo amoroso"... eu sou a primeira a resmungar quando não gosto, mas neste caso fiquei... satisfeita com a resolução. Nunca tivemos grande oportunidade de conhecer o Gale nos livros anteriores, e neste livro, que ele finalmente tem algum tempo de antena, causa uma péssima impressão. Mais ou menos por volta da altura em que ele está a conceber as armadilhas letais, desisti dele.

Não é que a Katniss não tenha escolhido entre um dos dois rapazes (se é que isso importa), acho que escolheu, ainda que não propriamente de maneira consciente, aquele que lhe permitisse curar-se e recuperar e não aquele que aprofundasse a dor sempre que ela lhe pusesse os olhos em cima. Gostei do epílogo porque precisava de saber que eles iam ficar bem (o que é um conceito difícil de definir, neste caso) a bem da minha sanidade mental, depois de todas aquelas desgraças.

Fiquei fascinada com esta trilogia. Tem mais profundidade do que esperava e deu-me muito em que pensar. Sei que me vou lembrar destes livros por bastante tempo. Desaponta-me que sejam reduzidos à violência (e à premissa macabra) dos Jogos (ainda hoje li uma crítica que sugeria isso), mas enfim, pessoas diferentes retiram coisas diferentes dos livros, e é isso que adoro na literatura.

Uma última nota: por vezes dei por mim a desejar ter lido os livros em inglês. Não sei, há cenas em que eu leio uma palavra e penso... "oh, que palavra é que a autora usou em inglês?", porque sinto que a palavra em português não me está a transmitir bem a intenção original. É algo estranho quando a minha própria língua me falha.

Título original: Mockingjay (2010)

Páginas: 280

Editora: Presença

Tradução: Jaime Araújo

9 comentários:

  1. Boa critica ao livro P7, tal como tu tambem gostei bastante dos livros seguintes, penso que os volumes II e III vieram dar mais consistência à história, explicar melhor determinados acontecimentos que ocorreram no primeiro volume.

    Foi sem duvidas uma das agradaveis surpresas do ano 2011, penso que tentei dar o dastaque que a trilogia mereçe :D, ou pelo menos tentei :P

    BJ

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    1. Obrigada. ;) Também acho que o 2º e o 3º livros enriquecem bastante a história. Não me ocorreu ao ler o 1º livro há quase 2 anos que as coisas acabassem assim, mas fui agradavelmente surpreendida. :D

      Oh, os teus comentários e os da Joana/static no Goodreads, mais um da Smirlah no fórum Bang, deram-me muita vontade (e coragem) de pegar no 2º/3º livros. Tenho a agradecer-vos por isso, estava algo desmotivada. :)

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  2. Sendo uma das pessoas que não gostou particularmente deste terceiro livro, posso dizer que não foi pelas razões que mencionas. Aliás, a veracidade e a crueza com que a autora apresentou a guerra foi (quase) a única coisa que gostei no livro. O que não gostei foi da progressão da Katniss que passou o livro quase todo a armar-se em 'coitadinha'. Pessoalmente também não gostei do final (amoroso) e teria-me parecido mais realista se ela ficasse sozinha.
    Mas são gostos e a tua opinião é tão ou mais válida que a minha e ainda bem que gostaste. :)

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    1. Compreendo porque é que a evolução da Katniss neste livro desagrada à maioria das pessoas (acho que se tivesse lido o livro de outra maneira pensaria o mesmo), mas acabei por sentir duas coisas algo contraditórias em relação a ela: por um lado tive uma certa atitude superior ao aperceber-me da ironia de a Katniss (no 1º livro) criticar a mãe pelo estado em que ficou depois do pai morrer, e depois aqui deixar-se cair num estado depressivo similar; por outro lado, senti compaixão e pena por ela não conseguir sair desse estado.

      Oh, concordo que o fim seria mais realista assim (cheguei a pensar que ela ia morrer ou algo do género), mas depois de tanta desgraça, prefiro este, que dá mostra de alguma regeneração. Gostava de pensar que as pessoas em Panem aprenderam alguma coisa, mas sabe-se lá.

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    1. Eu sei... é horrível quando um livro nos desaponta. :/

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  4. Ando a hesitar quanto a estes livros há algum tempo (estão no meu cesto da amazon, no departamento "save for later") e agora pronto, lá vou eu ter que comprá-los, antes que venha o filme. Não querem deixar de dar opiniões que me deixem curiosa?
    Já sabia que isto de passear pelos blogues quando estou cansada ia ser a minha desgraça...

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    1. Oh, boa compra! :D Acho que vale a pena lê-los antes do filme, foi por isso que me apressei a acabar a trilogia, para a imagem que tenho dos personagens não ser sobreposta pela dos actores.
      Lol, isto da blogosfera dá cabo da wishlist duma pessoa...

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  5. então mas ela fica com o Peeta? eu gostava tantoo..

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