O meu e-reader faz um ano!...

... ou já fez. Para dizer a verdade, recebi-o o ano passado algures a meio/fim de Fevereiro, e não sei exactamente quando é que o comecei a usar a sério. Mas já passou um ano de certeza, e achei que valia a pena fazer um balanço desse ano de uso do e-reader, e falar um pouco da minha experiência. (Preparem-se que isto é longo.)

Pergunta número 1, o e-book substitui o livro físico?

No minha opinião, não. Li livros em formato digital e em formato físico, e continuo a ler muito em formato físico. Diria que os formatos se complementam. Costumo usar muito o e-reader para adquirir e ler novelas e contos que complementam séries que estou a ler, por exemplo. E também é uma boa maneira de conhecer novos autores, ou autores indie/auto-publicados, que vendem os seus livros a um preço muito jeitoso.

Pergunta número 2, dei-me bem com o aparelho?

Muito bem. Fácil de usar, intuitivo, permite organizar os livros por título ou autor, e permite organizar por colecções, de modo a classificar os livros por género, por exemplo (se bem que não é uma opção que tenho usado muito). É relativamente fácil de navegar, e mesmo quando o Kindle tem muitos livros carregados podemos sempre procurar por uma palavra-chave.

Gosto bastante do teclado, prefiro-o a ter de usar um ecrã touch. O aparelho é muito leve, e para mudar de página basta um toque nas teclas laterais. O ecrã é fantástico, nunca tive problemas em ler um e-book seja onde for, e se o problema é a falta de luz, a minha capa para o Kindle resolve. Comprei uma que "acopla" o Kindle e permite usar a sua bateria para uma luz de leitura inserida na capa. E mesmo assim, a bateria dura-me imenso tempo, especialmente se a função wireless estiver desligada.

Este modelo permite tocar mp3 enquanto estamos a ler, se bem que não uso esta função, já que tenho um leitor de mp3 para alguma coisa. Também é possível navegar na internet, se tivermos acesso a uma rede wireless.

Pergunta número 3, e quanto a formatos e disponibilidade?

É um bocadinho redutor o Kindle ser compatível apenas com o formato dos Kindle books e com pdf. Mas graças à hegemonia da Amazon neste mercado, é difícil encontrar um livro que não esteja no formato para Kindle. E mesmo assim, há uma série de maneiras de desbloquear e converter entre formatos, por isso isto não é exactamente um problema.

A visualização dos Kindle books é fluída, e permite adaptar tamanho e tipo de letra, espaçamento, quantidade de texto na página, e até a orientação do ecrã. A visualização do pdf é menos fluída, mas se usarmos o ecrã na orientação horizontal, lê-se muito bem o texto. Dá para ler até artigos científicos para a faculdade.

Disponibilidade de livros em português?

Bem, com esses não tenho grande experiência. Há poucas editoras a disponibilizar livros digitais, e quando o fazem, os preços são de bradar aos céus. A facilidade de acesso também não é a melhor:

• na Kobo o formato não é compatível com o Kindle, mas isso não é culpa deles e pode ser contornado;
• na Wook eu nem sequer posso sacar o raio do livro, fica no "biblioteca" ou lá o que é, e nem posso acedê-lo sem ser através do site - posso acedê-lo offline, aparentemente, mas sempre no site, até mesmo no telemóvel, porque não há uma aplicação - o que é a coisa mais ridícula que eu jamais ouvi: nem tenho acesso a um ficheiro, nem a leitura e acesso são facilitados... mas esta gente quer mesmo vender livros, ou gozar com a minha cara?;
• na Leya, não explorei, porque me parece ser uma combinação das duas, em termos de acesso.

Minha gente, a ideia do livro digital é facilitar o acesso do leitor ao livro, não dificultá-lo. As editoras portuguesas ainda têm que comer muita papa para fazer alguma coisa de jeito nesta área. (Se alguém tiver uma experiência diferente, faça favor de comentar, porque até agora a experiência que tenho não é lá muito positiva.)

Pergunta número 4, e preços?

Muitos dos livros que adquiri foram a preço zero, através de promoções, que as há sempre. Fora isso, há sempre imensas promoções e preços baixos, especialmente por parte dos autores indie, preços como 0,99$ (+- 0,80€); 1,99$ (+- 1,50€-1,60€); 2,99$, e por aí fora. Já tenho visto as grandes editoras americanas a fazerem promoções e a porem alguns dos seus livros a estes preços também, por isso é fácil encontrar grandes livros a baixos preços. E clássicos (ou melhor, livros cujos direitos tenham expirado), é possível encontrá-los a preço zero, graças a sítios como o Project Gutenberg. Na própria loja Kindle é possível encontrar muito livros destes grátis, e um dia destes andei a adquirir um monte deles.

No entanto, tenho uma ressalva a fazer:

O mundo dos livros electrónicos ainda está pouco regulado, e permite algumas bizarrias que não deviam acontecer, simplesmente porque os revendedores não sabem como agir. Estamos num mundo cada vez mais globalizado, e por isso eu posso comprar um livro físico em qualquer loja online que envie para Portugal. No entanto, como no mundo digital não há regulação e informação sobre os direitos de venda em inglês e em que territórios (ou pelo menos foi assim que percebi ao ler um dos artigos que tenho andado a ler para esclarecer este ponto e o ponto que vou abordar a seguir), a Amazon prefere ser ultra-conservadora e, por exemplo, só deixar-me comprar e-books na Amazon.com, tudo porque a minha morada é em Portugal. Não posso comprar livros Kindle na Amazon UK, nem na espanhola ou francesa, mesmo que me desse um capricho para ler em espanhol ou francês. A Amazon não deixa. No entanto, posso encomendar os livros físicos dessas lojas. É hilariante que numa qualquer loja Amazon que não a americana, o livro físico esteja mais disponível para mim, e mais fácil de adquirir, que o digital.

A outra ressalva/bizarria relaciona-se com preços na loja Kindle.

Aconselharia a desconfiarem muito de preços que não terminem em X,99$, e a darem-se ao trabalho de cruzar o preço com o preço do e-book na Barnes & Noble, que ao que sei não tem destas brincadeiras. Quantas vezes não vejo no Facebook ou Twitter alguém a divulgar um livro que "está a 0,99$/1,99$", e depois carrego e aparece-me outro preço (mais caro). Até já aconteceu com algumas newsletters da Amazon, ou na própria página principal da Amazon, naqueles destaques que fazem. Vejo um preço, e depois abro a página do livro e aparece-me outro. Geralmente, aparecem estes valores:

• livro que custa 0,99$ - aparece a 3,74$; 4,59$; ou 3,68$
• livro que custa 1,99$ - aparece a 4,51$
• livro que custa 2,99$ - aparece a 5,74; ou 6,14$
• livro que custa 3,99$ - aparece a 6,89$; ou a 7,37$

E por aí fora, mas livros mais caros não tenho prestado atenção a estes valores. É um assunto pouco claro, e já tenho pesquisado por aí para ver se alguém chega a alguma conclusão. Tudo o que sei é que aparecem preços diferentes para territórios diferentes. Já têm havido pessoas a queixar-se à própria Amazon, e a desculpa deles é que os preços são determinados pelas editoras. Também há quem alvitre que tem a ver com VAT (IVA) ou com o custo de fazer o download automático para o aparelho. Se assim fosse, então nenhum livro era realmente grátis, porque há sempre esse custo associado.

Não creio que a culpa seja realmente das editoras, porque os preços são quase que tabelados, aparecendo sempre o mesmo valor correspondente a outro valor (ver lista em cima), e aparecendo sempre esse valor para um determinado território. Pior, a situação é completamente aleatória. Já me apareceram livros de editoras conceituadas com o preço aumentado, e já me apareceram livros de editoras conceituadas logo com o preço a X,99$. Já me apareceram livros indie/auto-publicados com o preço aumentado, e já me apareceram livros indie/auto-publicados logo com o preço a X,99$. E já me aconteceu um determinado livro estar com o preço aumentado, e mais tarde aparecer com o preço a X,99$. Portanto, acho que isto é mais culpa da Amazon e da falta de regulação do sector do que outra coisa.

O que é que eu faço para contornar isto? Muito simples, não compro. A minha irmã possui um Kobo, por isso se for um livro que eu quero mesmo muito posso sempre comprar na loja Kobo e usar o leitor dela. E qualquer smartphone tem hoje em dia acesso a uma aplicação para ler e-books duma determinada loja ou software, por isso também me posso safar por aí.

Em suma, posso considerar a minha experiência positiva?

Posso, gosto muito do meu Kindle e não o trocaria por nada. Não substitui o livro físico, mas é um bom complemento ao mesmo e traz uma série de vantagens sobre o dito. A variedade de formatos é reduzida, mas a variedade de livros a que temos acesso é muito grande. Os preços são decentes, até certo ponto. O meu grande problema tem a ver com a política de preços da loja em si (a Amazon), e não com o aparelho. Também me preocupa a questão do estarmos a comprar o livro vs. a comprar o acesso ao livro, que ainda é  pouco clara para mim.

Poderá isto ter condicionado a minha adesão ao livro digital? Um bocadinho, mas na verdade a grande razão pela qual não leio mais no formato digital é que adoro ter o livro nas minhas mãos, folheá-lo e juntá-lo à minha estante. Sou uma bibliófila cá dentro, e enquanto acho o livro digital muito útil e facilmente acessível, ainda prefiro o livro físico. Não vejo como é que um pode substituir o outro, vejo-os como duas formas muito diferentes (mas complementares) de fazer uma coisa que adoro: ler.