quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

A Revelação, Lissa Price

Sinopse

Opinião: Em retrospectiva, relendo a minha opinião do primeiro livro desta duologia, foi uma história que gostei (não amei), mas que tinha alguns problemas fundamentais que me deixaram na dúvida. Aliás, foi por isso que levei tanto tempo a ganhar coragem para adquirir o livro e lê-lo. Tinha curiosidade em saber o que vinha a seguir, mas não confiava na capacidade da autora para o executar em condições. Pois bem, os meus instintos revelaram-se correctos, para grande pena minha.

Primeiro, temos a Callie. Uma miúda que me agradou no primeiro livro, porque tomava opções ousadas, e era corajosa e determinada e desenvolta. Não sei para onde é que ela foi neste livro. Eu andava há tempos a queixar-me que a Layla do Stone Cold Touch era a heroína mais too stupid to live que eu jamais tinha encontrado, mas não te preocupes, Layla, já tens companhia. O que é mais grave quando a Callie parecia ter pelo menos dois dedos de testa no livro anterior.

É que se torna ridículo. A Callie atira-se para as situações de cabeça, sem pensar no perigo que advirá delas; a Callie confia num tipo que acabou de conhecer só porque ele lhe diz "não te preocupes, eu odeio o mauzão tanto como tu"; a Callie descobre algumas verdades difíceis sobre alguém, que a fazem questionar os seus motivos, e em que a reacção normal seria mandá-lo dar uma volta, mas não, a Callie acha boa ideia voltar a confiar nessa pessoa. Não há uma única decisão razoável tomada pela Callie neste livro.

Quando é ela a tomar decisões, porque que grande parte das vezes parece que é a acção a arrastá-la a ela, em vez de ser ela a determinar o curso de acção. Demasiadas coisas acontecem na história que não têm explicação ou sentido, que não determinam a evolução da narrativa, que nada fazem para a alterar.

O enredo, simplesmente, parece que não tem pulso, que a autora não lhe tomou as rédeas e o levou para onde fazia sentido, para criar uma história coerente. Parece que se limitou a adicionar cenas que lhe pareciam giras, sem pensar se fariam realmente sentido no grande esquema da história. As fraquezas de Lissa Price no primeiro livro, na criação do enredo, pioraram, em vez de melhorarem. Seria de esperar que quanto mais se escreve, mais se aprende a escrever; Lissa parece que desaprendeu com este segundo livro.

E sobre o Hyden, um novo personagem... que hei eu de dizer, e que não seja spoiler ou me dê vontade de atirar o livro pela janela? Ugh. É um personagem ridículo na sua concepção. Há a coisa de a Callie confiar imediatamente nele, apesar de admitidamente ter ligações ao vilão. Há a questão de insta-love, em que de repente eles estão aos beijinhos e abraços sem termos direito a ver sequer uma relação ser desenvolvida entre eles.

Há o problema de ele estar relacionado com os acontecimentos do primeiro livro, com motivos e ética questionáveis. Mas não, a Callie volta a confiar nele, afinal ele tinha boas intenções, não importa que os métodos que usou sejam eticamente errados, e que se tenha aproveitado de um monte de pessoas, pois estava só a tentar ajudá-las, coitadinho do rapaz. *facepalm* E questiono muito a ciência da "condição" dele, e da sua evolução.

Falta-me falar do Michael, sobre o qual foi sugerido no primeiro livro, e até neste, que gostava da Callie, e que tinham alguma química. Não esperava que ficassem juntos, porque não tivemos suficientes cenas que o sugerissem, mas esperava que a situação fosse ao menos abordada directamente entre os dois. Nem que fosse para concordarem em manterem-se amigos.

Porque assim, não faz sentido ele ter sido desenvolvido como potencial interesse amoroso. Mais valia que fosse apresentado como um bom amigo desde o início, e ser assim como que a prova que um rapaz e uma rapariga também podem ser amigos, sem romance pelo meio. E também preferia que o Michael não fosse afastado da narrativa cada vez que não dá jeito ele ali estar, ou quando a Callie precisa de um babysitter para o irmão Tyler.

Quando ao final, credo, tanta parvoíce. Os protagonistas descobrem onde está o vilão, e vão-se meter na toca do lobo, sem planos, sem apoio, sem nada. Andam a correr pelo quartel-general do vilão como galinhas, sem rumo, sempre a tropeçar nos malfeitores, a serem apanhados, e a safarem-se de maneiras estupidamente fáceis.

Se os vilões fossem realmente competentes, metade daquela gente estava morta. (E se não o fossem, já deviam ter sido derrotados há muito.) E para cúmulo, num verdadeiro deus ex machina, a Callie consegue meter-se a fazer uma coisa extremamente difícil, com sucesso, sem qualquer treino, que nunca tinha conseguido, e que só tinha experimentado fazer duas ou três vezes.

Para terminar, li o livro porque queria mesmo saber como acabava. A autora apresentou bons pontos suficientes no primeiro livro para manter o meu interesse, e achei que valia a pena continuar a série. Não estava com grande fé que fosse melhor que o primeiro, mas não esperava que fosse pior, e muito mais frustrante.

O que é verdadeiramente trágico, porque a premissa da série tem potencial para discutir questões éticas e morais muito interesssantes, tanto no que toca à guerra química, e à utilização das vacinas dos esporos, como no que toca à tecnologia dos chips de ocupação de outros corpos. No entanto, esse potencial nunca é completamente explorado, e diria que aqui é totalmente abandonado, infelizmente. Não é uma série que vá deixar saudades, e não é de todo uma autora a que queira regressar.
P.S.: Oh meu Deus, mas que capa é esta??? A primeira capa era gira, mas esta é um horror. Minha gente, modelos com raccoon eyes e cabelo esvoaçante não fazem boas capas.

Título original: Enders (2013)

Páginas: 280

Editora: Planeta

Tradução: Catarina F. Almeida

2 comentários:

  1. Estou com tanto medo de ler isto! Tu sabes que falei com a Lissa e sabes a minha opinião relativamente à sua... "bagagem" literária para escrever esta história. Também me apercebi, e aqui não quero estar a enganar-te porque não tenho como verificar, que a autora escreveu uma 4 short stories entre o primeiro livro e este que talvez "ajudem" a perceber" o fraco enredo. Enfim, eu vou lê-las antes de pegar nisto para tentar sobreviver.

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    1. É assim, eu acho um bocadinho perigoso estares a confiar nos contos para te salvarem o livro... primeiro porque os problemas com a história estão na forma como ela a escreveu, não no conteúdo; e depois, é ridículo um autor escrever uma série com uns contos pelo meio a esperar que os contos esclareçam a história principal. O livro tem que valer por si próprio. No nosso caso, só temos um dos contos traduzidos em português, achas que faria sentido o leitor português ficar pendurado por tal coisa?

      De qualquer modo, vale a pena dares-lhe uma oportunidade, pode ser que tenhas uma leitura diferente. ;)

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