Opinião: Antes de escrever esta opinião, e consciente de que este livro está constantemente a ser excluído de escolas e bibliotecas por todos os Estados Unidos (e nem falo no muito, muito errado que é censurar livros) fui pesquisar um pouco sobre o porquê de ser censurado, e bastou-me o primeiro link para ficar enojada e absolutamente raivosa. Em 2010, o livro foi criticado por um ignorante qualquer que achava que o livro era "pornografia leve" e "glorificava beber, dizer asneiras e sexo antes do casamento".
Será que este homem leu o mesmo livro? Ou leu-o, de todo? É um livro sobre uma miúda que vai a uma festa, bebe um bocado e depois é arrastada para o meio do mato e violada, e o modo como ela lida com isso. Será que é isto "a glorificação de beber, dizer asneiras e sexo antes do casamento"? Este homem acha que uma violação é pornografia, ou seja, sexualmente excitante? O QUE É QUE SE PASSA COM ESTE MUNDO???
Ironicamente, o livro comenta aquilo que acontece na vida real à volta dele. A incapacidade das pessoas de falarem de temas difíceis. A cegueira da sociedade aos problemas dos outros, preferindo concentrar-se nas minudências que não interessam a ninguém. A Melinda passa o ano a tentar lidar com o que aconteceu fechando-se sobre si própria e ao mesmo tempo lançando silenciosos pedidos de ajuda com o seu comportamento, mas ninguém repara. Só conseguem ver notas a baixar ou faltas às aulas. Ninguém repara numa miúda a chorar numa festa agarrada ao telefone, mas toda a gente faz o salto de lógica de que ela telefonou à polícia para estragar a festa e ostracizam-na durante o resto do ano. Isto deixa-me tão irritada e frustrada, porque sei que é o que acontece na vida real, e não está certo.
O modo como a autora escreve o livro é bem interessante, porque através da fragmentação de ideias e momentos que a Melinda relata, podemos criar uma imagem da psique dela e de como se debate como tudo o que aconteceu. A sua evolução ao longo do ano foi bastante emocional e apertou-se-me o coração ao reconhecer no comportamento dela um trauma, quando ainda ela nem conseguia falar disso. Por outro lado, ela tem um certo humor negro e maneira de ver as coisas que gostei. *suspiro* É um livro que acaba por pôr muita coisa em perspectiva, quando as minudências do dia-dia nos assoberbam.
Título original: Speak (1999)
Páginas: 176
Editora: Asa
Tradução: Susana Serrão