domingo, 3 de agosto de 2014

Dreams of Gods and Monsters, Laini Taylor


Opinião: Este é o ponto em que sinto que tenho de fazer um pré-aviso: a Laini Taylor perfila-se para ser uma daquelas autoras que eu sei que nunca me vai desapontar, faça o que fizer. Se qualquer outro autor tivesse feito um par de coisas que ela fez neste livro, as lamúrias não teriam fim, acreditem (ainda me estou a queixar do Requiem, um ano depois, e apesar de até ter sido caridosa na minha opinião, quanto mais penso naquele fim, mais lixada fico). Mas a Laini Taylor tem uma maneira positivamente enfeitiçadora de escrever, e de me envolver nas suas histórias, e eu leio os seus livros completamente enlevada, e no fim até canto aos céus, ou uivo à lua, o quão fantásticos os seus livros são.

Tem sido uma longa e dura viagem, desde Daughter of Smoke and Bone, em que descobrimos um mundo paralelo, com duas raças em guerra, e dois sonhadores que se atreveram a desejar um mundo melhor. Um subterfúgio singular permite aos nossos personagens conseguir uma mudança, ou pelo menos umas tréguas temporárias, em face de um inimigo comum. Mas o medo e o ódio enraízados durante 1000 anos são difíceis de largar, o que dificulta o trabalho em comum de dois exércitos tão diferentes. E foram tão fascinantes de ler, estas cenas, em que se dava um passo à frente para recuar dois, e vice-versa. Não é fácil, juntar serafins e chimaeras, ainda mais quando a situação em questão é uma pálida reflexão daquela que a Karou e o Akiva tinham sonhado. Mas é um passo na direcção certa, e com muitas tentativas e uma boa dose de esperança, as coisas encaminham-se.

Tem sido tortuoso, seguir e torcer pela Karou e pelo Akiva, e nem aqui a autora nos torna as coisas fáceis. A difícil união entre exércitos só os recorda de tudo o que os separa, e também aqui cada passo na direcção certa é doce e delicioso, mas custoso de alcançar. A tensão entre os dois está ao rubro, mas como lembra a Zuzana, são como dois ímanes a tentar manter-se separados. Não resulta muito bem. E aprendem uma lição importante, que é a de não deixarem que as desilusões, os recuos no seu projecto os separem, porque juntos são capazes de levar o seu sonho mais longe.

Diverte-me ver como a minha percepção dos dois mudou. A Karou era literalmente esperança, mas é a mais pessimista, a mais cuidadosa com essa esperança, a mais pronta a ver os problemas à distância. Já o Akiva, que tinha tanta pinta de meditabundo no primeiro livro, revela-se estranhamente optimista. Mesmo quando tudo é incerto, ou quando não parece haver esperança para ele e para a Karou, ele continua a acreditar, a sonhar com isso. É mais uma das pequenas coisas que os torna um par perfeito, as diferenças que os separam bem como aquilo que têm em comum, e a autora conseguiu contar uma bela e épica história de amor, e conseguiu pôr esta leitora completamente investida nessa história.

O elenco de personagens secundários é brilhante, fantabulástico, qualquer coisa do outro mundo. Não há ninguém que eu não queira arrancar do livro para dar um abraço. A Zuzana e o Mik, meros humanos, conseguem o extraordinário feito de mesmo assim pertencer a este mundo de anjos e demónios, e as suas cenas estão recheadas de leveza e humor sem serem supérfluas. A Liraz, querida Liraz, a maior resmungona e durona de sempre, e é tão bom vê-la revelar-se perante os nossos olhos, mostrar que é mais do que isso. A pobre da rapariga é invadida por um caso sério de "emoções", e aprende a levar as coisas duma maneira mais ponderada, e a transformação operada é algo que merece ser visto. (Gostava que um certo personagem estivesse presente para ver tal transformação. Iria ficar orgulhoso.)

O Ziri, que valoroso sacrifício, tentando não se perder na natureza de outrém. Houve ali um par de momentos em que me fez ficar a roer as unhas, pois a sua história é uma de incerteza, e o seu papel no desenrolar das coisas vai ficar escondido, sob pena de emperigar a revolução que se opera em Eretz. Mas é dos personagens mais importantes da história, e fico contente por não se perder na dureza da guerra. E tantos outros, de um lado e de outro, marcam a história... sinto que devo fazer uma menção à Esther, retorcida aliada que leva a sua paga, e ao Razgut, que afinal tem uma importância maior no grande esquema das coisas do que seria aparente.

Duas adições à história são bem-vindas, mas pecam por só aparecerem neste livro. Os Stelians e a Eliza. Dos primeiros já ouvimos falar, mas a Eliza é completamente nova. As suas cenas são intrigantes, mostrando a perspectiva humana sobre a "invasão" do Jael e da sua hoste celestial... e esta parte do livro é interessantíssima, porque levanta questões importantes sobre religião e crença, e sobre discriminação e conflito religiosos, e não só.

Contudo, a Eliza também traz a apresentação de um aspecto completamente novo, ainda que não completamente inesperado. Sempre esteve implícito que há mais neste universo que as duas faces da moeda que a Terra e Eretz são... e a verdade é inspirada. Liga todas as pequenas coisas que nos podemos ter perguntado acerca de Eretz, explica implicitamente os conflitos, a origem dos serafins e dos Stelians, e o papel dos mesmos no seu mundo... e de certo modo, sugere uma possível origem para algumas crenças e religiões na Terra. É fascinante.

Esta verdade, que liga a Eliza, os Stelians, Eretz e a Terra e o resto do Universo é algo que, como disse atrás, só peca por ser apresentada agora, neste livro, e completamente revelada a menos de 100 páginas do fim. É uma ideia tão fabulosa, que muda completamente a perspectiva sobre o conflito em Eretz e o âmbito dos problemas que os protagonistas têm e terão de enfrentar, que merece bastantes mais livros para ser desenvolvida. (Algo que não será completamente inocente da parte da autora, imagino... apesar de este ser o final da trilogia, e não haver notícia de mais livros passados neste mundo.)

A única coisa de que me queixo nesta revelação é mesmo o ser mostrada no final. Estava eu a 30 páginas do fim e a soar as estopinhas, a pensar "mas quando é que ela vai resolver isto???" (ingénua), para depois me aperceber que não ia resolver aquilo. O que é aceitável. A história principal da trilogia foi resolvida. Mas esta é uma nova demanda apresentada aos personagens, e uma demanda exige ser levada a cabo, de preferência num meio em que eu possa saber o que acontece nela.

Enfim, a comparação ali no início com a Lauren Oliver e o seu Requiem não é completamente inocente. Enquanto que o Requiem teve um fim muito aberto, sem qualquer fecho, sem closure... a Laini Taylor consegue escrever um fim igualmente aberto (a demanda é apresentada, mas é uma história para outro dia), enquanto que dá fecho aos fios narrativos que dominaram a trilogia, e de modo totalmente satisfatório. As coisas não ficaram resolvidas, porque a devastação em Eretz é demasiado grande para ser resolvida num passe de magia, mas estão a encaminhar-se. É um bom sinal.

Este não é, como a própria autora o diz, um final feliz (happy ending), mas um meio feliz (happy middle). Porque a história destes personagens não acabou, continua, mesmo que não esteja ali presente num livro para a lermos; e numa narrativa com tanto sofrimento, a felicidade conseguida é mais doce por isso. Nada foi fácil, e nada o será, mas os pequenos momentos de felicidade roubados são por isso bem mais merecidos.

Páginas: 624

Editora: Hodder & Stoughton

11 comentários:

  1. Opá, opá, opá, não foi maravilhoso?? *fangirla*

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    1. Cada segundo! O raio do livro fez-me ficar acordada até tarde três noites consecutivas, porque eu precisava de saber o que ia acontecer. ^_^

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    2. Mesmo! acho que não há um parágrafozinho que não seja fantástico. Esta autora não pode ser humana!! *O*
      Acabei de ler e tive de ficar agarrada ao livro durante uns minutos porque OPÁ!!

      Agora que penso nisso acho que devo ter sido muito influenciada pelo optimismo do Akiva porque sempre que acontecia algo mau eu achava sempre que aquilo se ia resolver depressa. Claro que ainda assim o meu coraçao parou quando o Razgut atira a faca, e depois andei uma semana a gritar "INVISIBLE TO DEATH!!" em momentos aleatórios do dia xD

      Eliza <3

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    3. Claro que não é humana. A Laini é na verdade uma chimera feita à imagem humana, como a Karou, fugida de Eretz, e é por isso que ela sabe descrever tão bem este mundo. :P

      Eu passei metade do tempo que li o livro a dar-lhe abraços, também. Lia uma parte fixe, abraço. Lia uma parte triste, abraço. Lia uma parte excitante, abraço. A maneira como a Laini escrever deixa-me assim lamechas. xD

      Ahhh essa cena quase matou-me do coração! Tive que voltar atrás e ler outra vez, que achei que tinha lido mal. Raios do Razgut... e se ela escrever mais alguma coisa neste mundo, ainda não foi a última vez que vimos este desgraçado, tenho a certeza...

      Awww, a Liraz e o Ziti, tão fofos. Gostava que o Hazael (?) tivesse visto esta nova faceta dela, tenho a certeza que tinha morrido a rir. xD

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    4. Haha, mesmo! Ou uma Chimera ou então pertence aos Stelians e anda por aí a visitar mundos.

      Tão, tão bom. Fiquei tão aliviada por esta série não acabar em tragédia, quer dizer, estas personagens já passaram por tanto, a Karou até já morreu uma vez, ia ficar traumatizada para a vida se isto acabava mal. Nem me importei com o final aberto, porque acaba com esperança :3 o Brimstone ia ficar taaaaao feliz :D

      A Liraz foi a personagem revelação, adorei aquele coraçaõzinho mole dela. E juntá-la ao Ziri foi a cereja no topo do bolo porque ele é a personagem mais adorável, casais que são opostos são sempre do melhor. Ia gostar tanto de ler uma short story com eles xD

      E quem sabe um dia a Laini não volta a este mundo!

      Honestamente acho que esta série tem dos melhores finais que já li nos ultimos tempos, aliás, os 3 livros são fantásticos, o que é tão raro com as trilogias, há sempre aquele livro que desce de nível ou só serve para encher chouriços, mas não com esta série.

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    5. Oh, sim, já me congratulo por ter acabado tão bem, a autora escreve duma maneira que eu estava convencida que ia acabar mal, porque têm acontecido tantas desgraças à Karou e companhia que me deixaram muito pessimista. Até a 30 páginas do fim, quando ela estava a apresentar a coisa das godstars e do que aconteceu com os outros mundos, andava a pensar "ai, agora vai-lhes acontecer algo, e vai ser uma desgraça, e eu vou morrer do coração". xD

      Ohhh, boa ideia, uma história com a Liraz, sim, por favor!!! :D Aquela miúda resmungona merece tudo, até um livro só para ela. :D Por falar nisso, não me lembro de a coisa que aconteceu com a Haxaya ter sido revelada; ou foi num dos outros livros e eu não me lembro? Porque estou totalmente a ter uma branca.

      Pelo menos, manteve-se fiel a si própria com o final, que honra bastante bem a história que está para trás. Não se resolve tudo num passe de magia, há trabalho a fazer, mas também há esperança. :D

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    6. Pois, eu também não me lembro. Fiquei naquela de ter sido algo que se passou entre elas fora da história. Ou então é só mesmo por a Liraz ter aquela contagem mórbida nos braços.

      E aquele final? quase parecia um casamento :3

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    7. Pois, mas foi uma situação estranha, quando foi mencionada, da maneira como foi abordada parecia que o leitor devia conhecer a situação. :S

      Loool foi uma parte tão adorável, a antecipação! Passámos tanto tempo a sofrer, e este livro todo com ela a torturar-nos... xD

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    8. A segunda pergunta&resposta http://thefandomnews.net/2014/08/13/exclusive-interview-with-laini-taylor-author-of-the-daughter-of-smoke-and-bone-trilogy/
      Agora é só esperar X anos.

      Eu ainda tive medo que alguma coisa trágica lhes fosse acontecer durante aquela espécie de casamento e lua de mel. Somos leitoras tão torturadas. xD

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    9. Bem, pelo menos é uma possibilidade. A ver se não morro de curiosidade até lá. xD

      Eu também achava que algo tremendamente dramático ia acontecer - acho que ainda estava influenciada pelas revelações sobre as godstars e os Nithilim, que me fizeram momentaneamente pensar que o livro não ia acabar ali, e que ia ter direito a mais qualquer coisa. O que tornava perfeitamente plausível que acontecesse algo para impedir que a Karou e o Akiva se juntassem.

      Sim, somos tão torturadas por esta senhora. E pior é que adoramos cada passo do caminho. xD

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