Opinião: Acho que já ficou estabelecido que eu tenho uma curiosidade mórbida e uma pontinha de masoquismo no que toca a leituras, por isso quando uma coisa me chama mesmo a atenção, eu tenho mesmo que ler. Neste caso, suponho que estava morbidamente curiosa em relação à maneira como a autora ia abordar um tema relativamente tabu e conseguir fazer um romance New Adult resultar daí.
A tragédia da coisa é que este livro foi auto-publicado e foi, nas palavras da autora, uma última tentativa na publicação. Os livros dela eram enviados para os agentes ou editores, estes até gostavam dos mesmos, mas não encontravam mercado para o que escrevia, e por isso não conseguia publicar tradicionalmente. Ironicamente, a auto-publicação teve melhor resultado, conseguindo pôr a sua escrita nas mãos dos leitores, gerando bastante interesse por parte destes, ao ponto que finalmente atraiu o interesse de uma "editora tradicional".
Digo que seria uma tragédia, ela nunca vir a ser publicada e desistir de escrever, porque a) ao contrário de muitos livros auto-publicados, não me ocorre uma única coisa que pudesse ser melhorada no livro, por isso em termos técnicos é bom e b) a escrita dela é qualquer coisa de espantoso. Fantasticamente visual, algo lírica, vívida, conseguiu evocar imagens e cores e sons e ideias na minha cabeça como poucos conseguem, ao ponto de ser quase cinematográfica. Além disso, conseguiu evocar sentimentos e emoções intensamente, passando a leitura quase num transe hipnótico, de tal maneira que se tornou muito difícil resistir-lhe.
Consequentemente, gostei bastante de como ela abordou o tema. Se maneira haveria de fazer uma relação aluna-professor resultar (se é que posso usar o termo aqui), Leah Raeder encontrou-a. Quando se conhecem a Maise tem 18 anos (apesar de fingir ser até mais velha), por isso é maior de idade, e não faziam nem ideia que o Evan ia ser professor na escola dela.
Depois disso, quando percebem que são aluna-e-professor, não resistem... e mais tarde admitem que o factor tabu é parte da atracção, mas o mais importante é que nunca há um desequilíbrio de poder na relação. O facto de o Evan ser o professor pode ser atractivo, mas não é o motor da relação. Ainda digo mais, até acho que lidaram relativamente bem com a dinâmica na sala de aula, ou pelo menos não era notório favoritismo.
A questão aqui não é tanto uma potencial posição de autoridade, mais a diferença de idades, que os coloca em posições da vida e pontos de vista completamente diferentes, e é geralmente aí que chocam. Isso e a noção de proibido, que apesar de ser atraente, também traz o secretismo, e ter de manter segredo durante tanto tempo dá cabo de alguém.
A Maise é uma protagonista muito interessante. Sem papas na língua, sem problemas em dar nas vistas, ou em levar tudo à frente, a Maise teve essencialmente de se criar a si própria, sem pai e com uma mãe fisicamente presente mas ausente em tudo o resto. E por isso a Maise é bastante mais madura que alguém da sua idade deveria ser, céptica e pessimista, mas também desapegada. A única coisa que gosta, que quer com todas as forças, é estudar cinema.
E depois tropeça no Evan, e o primeiro encontro deles dá cabo das paredes que construiu em torno de si própria. Ambos partilham um percurso de vida complicado, e a sua postura perante isto liga-os. Tenho pena de não podermos ver algo do ponto de vista do Evan, ou perceber melhor a sua perspectiva perante certas coisas, porque gostava de esclarecer melhor a personalidade dele.
Foi fascinante seguir a relação deles, porque a situação é única. De certo modo estão bem um para o outro, mas as tensões presentes constrangem-nos, e é algo curioso de explorar. Toda a relação é muito intensa, e as circunstâncias ajudam a que assim seja, e por isso era importante chegarem a um módico de normalidade, porque nenhuma relação sobrevive assim, por muito deliciosa que a intensidade seja. É uma coisa que gostava de ter visto explorada, o depois, porque o livro deixa-os no final num momento que merecia ser abordado.
Gostava ainda de mencionar o detalhe de a Maise querer estudar Cinema, porque é notório na sua narração. Está sempre a usar termos cinéfilos para enquadrar a sua história, e é um pormenor engraçado que denota a sua paixão.
Além disso, tenho de dar um destaque à capa, tanto esta como a da auto-publicação, que são brilhantes para transmitir a história. Coloridas, hipnóticas, complicadas. Representativas da história de auto-descoberta da Maise.
Em suma, gostei de ver o cuidado que a autora teve ao criar a sua história. Aprecio que ela não tenha fugido do complicado, de escrever uma história difícil, porque creio que se saiu lindamente. Sei que assim me deu vontade de continuar a lê-la.
Páginas: 320
Editora: Atria Books
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