segunda-feira, 14 de julho de 2014

Quando Éramos Mentirosos, E. Lockhart


Opinião: Ok, vou fazer o contrário do que a sinopse me diz para fazer, e dizer a verdade: este livro é melhor experienciado sem se saber praticamente nada sobre ele, sem ter expectativas nenhumas. Porque é uma caixinha de surpresas melhor saboreada se for isso mesmo, uma surpresa. E é neste ponto em que eu devia terminar a opinião e dizer, "pronto, vão lá ler, que vale a pena".

Só que também não consigo ficar calada. Sinto que é serviço público e que devia mesmo falar um bocadinho dele, sem dizer nada que o estrague, o que me parece ser uma armadilha, uma água infestada de tubarões que terei de navegar cuidadosamente. Vamos lá ver se me safo disto.

A primeira coisa de que vou falar, e que pode potencialmente afastar (ou interessar) leitores é o estilo de narração. A narradora conta-nos as coisas dum modo meio floreado e quebrado. É um estilo a tender para o stream of conciousness que imagino que não cativar toda a gente; mas suspeito que quem já tenha lido (e sobrevivido!) a Tahereh Mafi, em particular ao Shatter Me, vai comer este livro ao pequeno almoço. Quem não o leu, não há que preocupar, creio que é acessível.

Quanto a mim, gostei bastante, porque fez um bom trabalho a mostrar o estado de espírito da protagonista, e porque as metáforas dela são simplesmente deliciosas, umas vezes floreadas mas muito literais, outras vezes prestam-se a ser tomadas como literais e afinal são apenas uma metáfora para os sentimentos dela. E a verdade é que o estilo de narração acaba por se prestar bem ao tipo de história e ao mesmo tempo fazer um bom trabalho a manter-nos despistados quanto a... bem, tudo.

A segunda coisa, e que não acho que seja um spoiler, porque o título já o indica, é que não podemos confiar propriamente na nossa narradora. É um artifício que gosto muito, e que acho que é bem usado a favor da história, mas também vejo como possa afastar ou desagradar leitores. Novamente, no meu caso, gostei bastante deste artifício, porque sabia que havia algo que estava a ser escondido de mim, leitora, e passei o livro a construir cenários cada vez mais horripilantes na minha cabeça, enquanto tentava perceber o que era.

Posso dizer que uma das minhas suspeitas estava em parte certa... mas o melhor é que quando descobri finalmente a "coisa", tudo o que estava para trás fez sentido. A autora foi mesmo certinha nesse aspecto, e os acontecimentos e o comportamento de toda a gente fazem tanto sentido à luz do que descobri.

Que mais posso dizer? Acho que é um livro bastante inteligente na maneira como constrói a história. Gostei bastante da escrita da autora, e do trabalho que ela teve em construir a narrativa deste modo. Gostei que ela levasse a sério o seu leitor e que não o tomasse por parvo, obrigando-a pensar e a trabalhar para desconstruir a história; demasiadas vezes propaga-se a ideia errónea de que YA=vapidez e simplicidade, que fico contente quando um livro se esforça para dar porrada nesse tipo de expectativas.

Fiquei fascinada com uma coisa que a autora consegue fazer, e que é impressionante: este é um livro curto. Mas é tão vívido, tão condensado, que passadas meia-dúzia de páginas parece que já vivi imenso com os personagens. E, ao mesmo tempo, é um livro tão devorável que passado um bocadinho já passaram mais 50 páginas, e mais um bocadinho ainda e dei por mim no fim.

Acho que a única outra coisa que posso dizer é que achei muito interessante a dinâmica na família Sinclair e em como Verão após Verão se juntavam na ilha para passar férias. Em certa medida, até compreendo as acções tomadas por alguns dos personagens; talvez o meu eu de 15 anos, nas mesmas circunstâncias, se sentisse tentado a fazer o mesmo. Mas gosto de pensar que o meu eu de 15 anos, se chegasse a esse ponto, teria sido muito mais esperto a executar essas "acções".

Em suma, recomendaria a toda a gente, nem que seja ir espreitar um excerto para ver se é o vosso tipo de coisa. Sei que o tipo de narrador e a maneira como conta as coisas pode afastar leitores. Mas lá que é extremamente recompensador chegar ao fim e perceber tudo e aquilo fazer sentido, é. Também é um pouco perturbador e triste, mas já a sinopse nos promete segredos, tragédias e mentiras. Creio que vale a pena, por ser uma história contada de maneira invulgar, apesar de acabar por ser uma história vulgar, de certo modo. Mas a autora cativou-me duma maneira que não pude parar até chegar ao fim, e gostava que o livro tivesse a oportunidade de encantar mais leitores.

Título original: We Were Liars (2014)

Paginas: 312

Editora: Asa

Tradução: Elsa T.S. Vieira

4 comentários:

  1. Oh bolas, vou adorar não vou?

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    1. Espero que sim. É um livro um pouco estranho, mas delicioso de desvendar. ;)

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  2. Tenho tanta curiosidade no que toca a este livro! Toda a gente anda a falar dele e as opiniões ou são muito boas ou muito más, o que é ótimo porque eu adoro livros controversos eheheh

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