Seconds, Bryan Lee O'Malley
Depois da série Scott Pilgrim, Bryan Lee O'Malley apresenta Seconds, uma história sobre uma jovem chef de 29 anos, Katie, que sonha em deixar o seu primeiro restaurante e abrir um segundo restaurante. Só que a vida e as circunstâncias não estão a ajudar, e depois de um dia particularmente difícil, cheio de más decisões, a Katie usa uns cogumelos mágicos (são mesmo mágicos, não são psicadélicos) para refazer o dia e corrigir os erros.
A premissa é bastante batida. Um personagem descobre um artifício qualquer para mudar o passado/refazer decisões/algo do género, e num instante dá por si a alterar coisas grandes, mesmo grandes, e a descobrir que mal conhece o mundo que lhe é apresentado quando altera essas coisas.
O que eu gosto mesmo é da caracterização da protagonista que o autor faz. A Katie é um pouco mais velha que o Scott Pilgrim, mas nem por isso deixa de ser algo infantil, egocêntrica, e irresponsável. Não é a idade que confere a maturidade a alguém, e com a idade não se perdem as dúvidas e não se deixam de ter encruzilhadas para enfrentar.
Gosto que a Katie cresça (finalmente) um bocadinho ao ver as consequências que as mudanças que provoca no passado têm, e que aceite a responsabilidade (também finalmente) pelas suas decisões, boas e más. O fim é um pouco mais fantasioso que o resto da história, e não tenho a certeza se resulta completamente, mas também me sinto satisfeita com o modo como as coisas terminaram.
Adoro poder ver alguma coisa do autor a cores (o Scott Pilgrim era a preto e branco), e acho que se pode ver alguma evolução. Há cenários mais elaborados, os personagens ainda são muito ao estilo desenho animado, mas o autor consegue trabalhar expressões e emoções... e as cores são fantásticas. Transmitem a atmosfera muito bem, e há páginas que são uma delícia de observar.
Batgirl vol. 1: The Darkest Reflection, Gail Simone, Ardian Syaf, Vicente Cifuentes
Não estou tão familiarizada com a DC como com a Marvel, por isso acho que a lógica dos The New 52 me passa um bocadinho ao lado. É um reboot, há histórias que continuam a fazer parte da continuidade, outras não... meh. Parece-me que isto é bastante conveniente, aquilo que dá jeito manter, mantém-se. Aquilo que não dá jeito, apaga-se e reescreve-se. Bem, assim são os comics: continuidade estranha e um perpétuo estado de interrogação quanto ao que está para trás, e ao que vem para a frente. Se não soubesse lidar com isso, e não gostasse de ir construindo o puzzle complicado que isto às vezes é, não lia.
No caso de Batgirl, a ideia é que vamos acompanhar a Barbara Gordon a retomar o papel, depois de há três anos o Joker lhe ter dado um tiro que a paralisou da cintura para baixo. Portanto, Piada Mortal/The Killing Joke aconteceu, mas depois uma série de coisas deixa de existir na continuidade. Acho que as meninas que ocuparam o papel de Batgirl nestes últimos 20 anos deixaram de existir, suponho? E o tempo da Barbara como Oracle? (Não faço ideia.) Não podemos fingir que isto aconteceu tudo nesses três anos? De qualquer modo, o tempo não passa propriamente nos comics, por isso parece-me que podemos perfeitamente meter 20 e tal anos de histórias no tempo real, em 3 anos de vida no mundo destes personagens.
Bem, de volta à Barbara. Ela foi atacada pelo Joker há três anos, e um ano antes dos eventos deste livro, o comissário Gordon, o pai dela, ouviu falar duma clinica na África do Sul que a podia ajudar, e tudo o que sabemos é que isso resultou na cura da Barbara e ela agora está no fim duma longa recuperação do uso das suas pernas. E no início da história, ela está de volta ao uniforme da Batgirl, a tentar readaptar-se à luta contra o crime.
O destaque neste volume vai mesmo para a maneira como a Gail Simone escreve a Barbara. Ela está a debater-se com alguma culpa por ter sobrevivido e ter tido direito a um milagre, e a lidar com stress pós-traumático derivado do ataque do Joker. E apreciei acompanhar o esforço que a Barbara está a fazer para ficar bem com os eventos dramáticos do passado, pareceu-me uma abordagem realista e interessante.
Os vilões que ela enfrenta reflectem (pun intended, um dos vilões chama-se Mirror) esta encruzilhada na vida dela. O Mirror tem como objectivo matar pessoas que sobreviveram milagrosamente, contra todas as expectativas, e isso faz a Barbara pensar no seu próprio milagre e se o merece verdadeiramente. A Gretel é uma jovem mulher que teve um evento traumático no passado e decidiu vingar-se dos que lhe fizeram mal; e faz a Barbara pensar na sorte que tem por ter um sistema de apoio tão bom, porque de outra maneira poderia ter ido pelo caminho da Gretel.
Portanto, as circunstâncias que criaram estes vilões podem não ser as mais credíveis, mas isto é Gotham, a loucura abunda, e consigo definitivamente acreditar em pessoas que perdem o juízo desta maneira. Para além de que o tema de o vilão reflectir as lutas e problemas pessoais do herói não é inédito na Batfamília - esse era um dos temas em Piada Mortal.
Este conjunto de seis números da Batgirl acaba por ter duas presenças da Batfamília, que acompanham a sua volta à luta contra o crime mascarada com alguma preocupação. O Nightwing aparece primeiro, e os dois discutem amigavelmente pelos telhados de Gotham se ela está preparada para voltar e lidar com o vilão que tem em mãos. É interessante ver a dinâmica destes dois. (E ver o Dick Grayson ser chamado de Richard. Que é o nome dele, eu sei, mas estou mais habituada à alcunha de Dick. Se bem que se fosse eu, não gostaria de ser conhecida por Dick, dado o duplo sentido da palavra.)
O Batman aparece mais para o fim. Primeiro como Bruce Wayne, e é uma cena giríssima em que a Barbara tenta perceber se ele está sob controlo mental ou não, que decamba em adorável quando o Bruce lhe dá um abraço. Depois como Batman, e é bom ver que ele aceita as suas decisões quanto à vilã, e confia na capacidade da Barbara para lidar com o assunto. Era a injecção de confiança que a Barbara não sabia que precisava, ver o Batman a torcer por ela. Muito giro.
Em termos de arte, acho que não tenho muito a dizer, excepto que gosto do dinamismo que dá às cenas. É um estilo realista, detalhado mas não exagerado. E gosto das escolhas no que toca à cor, complementa bem o desenho; e aprecio ver um estilo homogéneo ao longo do livro. (Os artistas são os mesmos ao longo dos seis números.)
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