Opinião: Sei que isto vai soar muito estranho, mas ler este livro foi doloroso. Porque doeu como o raio arrastar-me por uma história que eu achava que tinha potencial cinematográfico e cuja narrativa seria, achava eu, devorável de tão intrigante. Quando o que aconteceu foi eu ficar frustradíssima com a maneira incipiente como o autor escreve e desenvolve o enredo, e como é incapaz de dar respostas suficientes e satisfatórias às perguntas que lança na direcção do leitor.
Quero dizer, num tipo de enredo como este, em que o protagonista é lançado num mistério desconhecido para ele e para o leitor, o mais razoável é construir a história de modo a fazer algumas questões, dar algumas respostas ao leitor (e ao protagonista), fazer mais questões, dar mais respostas, questões, respostas, etc. num crescendo que cative o leitor e o faça virar as páginas para descobrir o que acontece a seguir.
O que acontece na verdade com o livro é que passamos as primeiras duzentas páginas com o Thomas, o protagonista, a andar dum lado para o outro completamente perdido, porque ninguém se digna a explicar-lhe em condições como é que a clareira e o labirinto funcionam, apesar de ele se fartar de fazer perguntas e acabar a fazer uma coisa mesmo, mesmo estúpida. Depois temos mais 100 páginas em que acontecem umas coisinhas, mas respostas sobre este mundo e o raio do labirinto nicles...
E finalmente nas últimas 100 páginas parece que o autor se lembrou que tinha de acabar o livro, e tumba! acontece tudo de repente, ele tira um deus ex machina e um info dump da cartola que a acontecer, bem que podia ter acontecido 150 páginas mais cedo para avançar em condições com a história, e respostas às minhas perguntas, não vou dizer nicles, mas foram muito poucas. Digam-me lá se isto não é frustrante.
Resumindo, o desenvolvimento do enredo foi o equivalente literário a um caracol, e creio que havia uma série de coisas sobre o labirinto e sobre o mundo em que o labirinto se insere que podiam ter sido reveladas, mantendo ainda o mistério suficiente para o próximo livro. Mas o fim é tão abrupto que a oportunidade que apresentava nesse aspecto foi perdida. E nem sequer posso pôr as culpas neste ser o primeiro livro do autor, que não era. Quando The Maze Runner saiu, ele já tinha publicado uma mão-cheia de livros, portanto não há justificação para me apresentar esta confusão pegada.
E depois tenho um grandessíssimo problema com a linguagem. É que o autor, creio eu, queria pôr rapazes adolescentes a praguejar. Porque, pronto, é realista. Mostrem-me lá um que não o faça, especialmente nestas condições. O problema é que se acobardou, e em vez de usar as palavras a sério que queria usar, inventa novas para as substituir, apesar de ser relativamente óbvio as palavras que os miúdos estão realmente a dizer. Só que a artificialidade destas palavras novas fez com que cada vez que eu tropeçasse numa, "saísse" da história, em vez de contribuir para que ficasse imersa nela.
E o resultado foi arrastar-me ainda mais pela narrativa. Quero dizer, se era uma questão editorial, é uma questão estúpida. Qualquer miúdo do público-alvo sabe estas asneiras ou pior, portanto fingir que não sabem é pateta. Preferia que o autor tivesse evitado o praguejar, se a alternativa era encontrar coisas tão ridículas como "chanco", "traca", "fu", "cara de fu", e "klunk".
Pondo de parte os grandes problemas que tive com a narrativa... nem tudo é mau, apesar de até agora eu só me ter queixado. A premissa é muito boa, mesmo intrigante, só peca por não ser mais e melhor revelada ao longo do livro. A ideia do labirinto, e do porquê de estarem ali, parece uma coisa tremendamente interessante, e é capaz de ser o que me vai fazer ler o segundo livro, possivelmente o resto da trilogia. Para além disso, o labirinto exuda mesmo aquela sensação de perigosidade e de mistério, e queria mesmo revelar esses mistérios, daí que tinha ficado tão frustrada quando tão pouco acontece nessa área.
O Thomas é um protagonista que consegue levar a narrativa a bom porto, apesar de ela resistir muito, conseguindo fazer mudar as coisas na clareira e no labirinto. Fez-me revirar os olhos uma ou outra vez, quando o autor decide que tem de o pôr com pressentimentos, ou a fazer uma coisa para finalmente descobrir o que se passa, e despejar o que se passa em cima dos outros e do leitor. Mas é inquisitivo, parece ter um bom fundo e um bom senso de certo ou errado, e luta para resolver as coisas.
O grupo de personagens conseguiu manter o meu interesse, cada um tendo o seu perfil distinto, e conseguiram fazer-me preocupar com eles e com o seu destino. Tenho pena de ter perdido alguns pelo caminho. A Teresa é uma personagem que não se destaca muito, e que podia não existir que a história continuava a ser a mesma, mas pode ser que o autor se lembre de a desenvolver e à sua ligação com o Thomas nos próximos livros. A sugestão do que haverá já é intrigante.
E já fico feliz por o autor ter decidido não a tornar numa vítima. Outros autores palermas na mesma posição não teriam resistido, com uma rapariga sozinha no meio de um bando de rapazes, a inventar um ataque a ela só por acharem que tinham de tornar as coisas interessantes. Demasiadas vezes os autores funcionam na base de que as mulheres numa narrativa estão ali para decorar e servir de vítimas. A Teresa mantém-se a sua própria pessoa, apesar do pouco destaque, e bastante capaz, por sinal.
Em suma... tenho um grande, grande problema com a narrativa e com o modo como foi desenvolvida... mas como tenho uma costela masoquista, isso não vai ser impedimento para eu ler o segundo livro, pelo menos. Apesar da inépcia do autor, o meu interesse foi atiçado e mantido o suficiente para eu estar curiosa, e querer saber e ler mais. Suspeito que o filme vai trabalhar melhor o ritmo do enredo, por isso vou esperar que me faça esquecer um pouco esta trapalhada. E, ei, estou mesmo com vontade de ver como é que eles vão apresentar os Magoadores/Grievers. São umas coisas meio difíceis de imaginar.
Título original: The Maze Runner (2009)
Páginas: 400
Editora: Presença
Tradução: Marta Mendonça
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